Em nossa instabilidade institucional, a República Velha, como veio a ser denominada,
durou cerca de quarenta e um anos. A de 1946 termina em 1964, com a chamada ‘Redentora’. Já o período de domínio
militar teve os vinte e dois anos do
Fascismo na Itália.
A
Constituição de 1988, alcunhada por Ulysses Guimarães Cidadã, continua vivinha da silva, embora tenha sido a princípio
feita para regime parlamentarista que virou presidencialista. A reeleição
foi introduzida por iniciativa de FHC.
Não me parece que haja sido boa ideia. Com geral abertura – de prefeito a
presidente –teria que dar no que deu, em país que não tinha a tradição da
reeleição, se deixarmos de lado a experiência do Estado Novo.
Por isso,
o Ministro Dias Toffoli,
atual presidente do Tribunal Superior
Eleitoral, perdeu, data vênia, boa oportunidade de ficar calado.
A reeleição
pode ter sido útil para o Partido dos Trabalhadores e para Lula da Silva em
especial, mas o Povo brasileiro guarda má lembrança da virtual
institucionalização da prorrogação de mandato. A reeleição foi zelosa
assistente da corrupção, e isso nos três níveis constitucionais. Ela deturpa o
processo democrático, pois a autoridade em exercício (para o qual não há
vocábulo em português, ao contrário do incumbent
para o inglês) frui de enormes vantagens em permanecer à frente dos negócios
(que para alguns toma até um sentido mais lato), além de gozar de outros
favores que tendem a colocá-los em melhor situação do que o(s) eventual (is)
opositores.
Só mesmo com
desastrosa gestão – ou com pletora de fatores contrários – o candidato (ou
candidata) à reeleição enfrenta cenários que venham a decretar-lhe o malogro no
intento continuísta.
Depois de ser reprovado em dois exames
para juiz e ter sido secretário de José Dirceu, Dias Toffoli foi aprovado pelo
Senado. Como verificamos, de resto, pela última indicação de Dilma Rousseff
essa característica do Senado – que por uma série de circunstâncias nos tempos
modernos não consegue mais dizer NÃO ao Poder Executivo, mesmo que quem exerça
a presidência esteja em situação de grande fraqueza – parece ser irremediável.
Com
conhecimento histórico, Sua Excelência se teria abstido provavelmente de
referir o temor da instabilidade por quadriênio. Porque na República Velha – malgrado os
doestos de que foi objeto – tinha mandatos presidenciais de quatro anos. Quando
o Primeiro Mandatário assumia, o poder era exercido com autoridade e em
plenitude (por vezes, até demais).
Quanto à extensão
do mandato, para seis anos, isso me pareceria uma reedição do México.
O sexênio, por ser um período prolongado, servia bem à corrupção que
predominava abaixo do Rio Grande. Nada de democrático existia na prática
mexicana, eis que o candidato ungido era destapado
pelo Presidente em exercício, que o escolhia em geral dos Secretários do
Interior (Gobernación), que nos
países ibero-hispânicos quer dizer Ministério da Justiça e das Prisões.
Está de bom tamanho para a
democracia quatro anos, sem reeleição. Se for muito bom, voltará, após
transcorrido o seguinte quadriênio.
Como já
dito, são os períodos mais longos que favorecem a corrupção. A intimidade com o poder faz a autoridade
confundir a fazenda pública com a privada. Com a série de vantagens asseguradas
aos partidos maiores, a propaganda eleitoral chamada gratuita pode dar uma
posição de extremo desfavor para eventuais adversários. Para tanto, um longo
predomínio – que chega a lembrar o mexicano – dá posição muito pouco
republicana para o partido no poder, com todas as confusões que isso pode
provocar.
Não
creio que sejam necessários exemplos mais incisivos pessoais. Aguentamos há
muito o façanhudo aparelhamento do Estado, que é feito, como se sabe, às nossas
custas, eis que é a conhecida Viúva quem banca as contas.
Acho que
chega. O Brasil está cansado. É tempo de
mudança. Pode ser que assim as coisas melhorem.
Os
tchecos, depois da revolução de veludo ([1]),
inventaram
um instituto penal chamado
lustração (lustratzia). A norma implicava
em período de afastamento de autoridade do exercício do poder, com vistas a
voltar à vida comum. Na Inglaterra, existe uma punição para os maus alunos, que
é o de ficar afastado do currículo, para melhor se conscientizar da necessidade
de aprimorar seus estudos. Há também um precedente na Grécia e na Roma antiga,
em que o afastamento das funções correspondia a um castigo, para que a pessoa
voltasse à vida corrente, como quem retorna às boas fontes.
Assim, a lustração era uma punição a quem
fossem creditados atos antidemocráticos. Esse retorno às origens (à planície da
vida corrente) seria modo de reaprendizado para autoridades responsáveis por
ato antidemocráticos ou contrários aos interesses do Estado.
Que
tal se a dita lustração fosse aplicada a alguns próceres que se julgam
proprietários do Estado e de suas benesses? Não seria para o Brasil uma boa
ideia?
( Fonte: O Globo)
[1] A Lustração, surgida com a
revolução de veludo, era um instituto de reeducação de políticos formados na
escola soviética. Equivalia a uma volta às origens, assim como as universidades
inglesas impunham afastamentos de alunos com más notas, e que equivaliam a uma
suspensão para repor em ordem os respectivos estudos.
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