Como seria de esperar, a tentativa
de Lula de reinserir-se no debate, como se ainda pudesse controlá-lo, provocou
em comentaristas da mídia interpretações as mais díspares na aparência, embora
na essência não estejam tão longe assim.
A avaliação mais crítica de Lula está em Elio Gaspari. O torneiro mecânico que virou dirigente
político não estaria falando sério. Se
acha que o defeito pode ser do governo e não ‘nosso’, acreditará acaso que
alguém seja capaz de separar um do outro? Depois, mais uma, ainda mais difícil
de engolir: ‘acho que o PT perdeu um pouco de sua utopia’. Casos como o do
assassinato de Celso Daniel, o Mensalão, e as petroroubalheiras dificultariam a
percepção de que o PT tenha perdido só “um pouco de sua utopia”.
Para Gaspari,
o segundo motivo pelo qual Lula pode estar perdendo o seu tempo foi exposto no
último congresso do PT em Salvador, quando o nome do tesoureiro João Vaccari
Neto recebeu uma ovação no plenário.
Pelo visto, a gente nova que
um dia foi para o PT hoje grita nas ruas para que ele se vá.
Talvez seja
enfeitar demais a banca de Lula comparar-lhe a esperta guinada política com o
lance de Mikhail Gorbachev, quando pensou salvar o reumático sistema
soviético. Havia alguma grandeza nos princípios da perestroika (reestruturação) e glasnost
(transparência), que a renegação tardia da responsabilidade não tem.
Tampouco vejo
muita parecença com a Revolução Cultural de Mao Zedong. O líder chinês, que uma
vez tomado nunca apeou do poder, e usava e reusava da capacidade de engodar os
camaradas a fazerem críticas, como nas Cem
Flores, em que ceifou os críticos que acreditaram na sua palavra, e na
chamada Revolução Cultural, quando
apelou para a ala dos jovens para varrer a suposta oposição dentro do PC,
depois do malogro de uma de suas campanhas.
Lula tem
cândidos temores. Segundo Gaspari, a guinada e o rejuvenescimento petista são
utopias que Lula vende mas não compra.
Será, no
entanto, que a demofobia dos
adversários continuará a explicar as incríveis reviravoltas, como no caso do Mensalão em que o então presidente,
choroso, pediu desculpas à Nação, e D. Marisa mandou tirar passaporte com a
cidadania italiana?
Ou devemos
imputar à incompetência e falta de grandeza dos seus contendores?
Hoje, o
passado parece repetir-se. O governo de
D. Dilma, de repente, desapareceu. As mentiras da campanha, a fraqueza do
esquema de apoio varreram tanto a remanescente confiança que dera para
reelegê-la, quanto a mirífica base de apoio, que o bicho comeu. O Joaquim Levy é
uma andorinha que pensa poder trazer o verão. Jovem, competente, a sua vitória
seria o anti-Dilma, mas até com isso ela já se conformou.
Enquanto nas laterais, Lula da Silva reclama de não mais
ter foro privilegiado, e se pergunta das intenções do juiz Sergio Moro. Estará
acaso pensando, como refere Zuenir Ventura, na ameaça do pai de Marcelo
Odebrecht, o criador da maior construtora da América Latina, Emílio Odebrecht: “se
o filho fosse para a cadeia, seriam necessárias outras três acomodações: 'Uma
para mim, outra para o Lula e outra ainda para a Dilma.’
A
perspectiva de prisão tira o sono dos poderosos. Como sublinha o imortal Zuenir, “isso é uma novidade
num país em que, como se dizia, tal só acontecia com preto, pobre e prostituta.”
( Fonte: O Globo )
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