Não é de hoje que a crise grega se
arrasta e - o que é pior – se vai tornando na aparência cada vez mais
intratável.
Os últimos
desenvolvimentos não induzem decerto ao otimismo. Assim, os países da Zona do
Euro rejeitaram a proposta do governo helênico de prorrogar a dívida que vence
nesta terça-feira, com vistas à realização de referendo na República Helênica
no vindouro dia cinco de julho, que é um domingo.
O presidente
do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem, afirmou que o governo de Atenas “fechou
as portas” ao propor o referendo.
O raciocínio
de Dijsselbloem se funda em que o gabinete Tsipras, ao inserir a variante da
consulta popular, trazia para a questão um elemento imponderável, dada a
complexidade da matéria, e a impossibilidade de uma opção objetiva, que
realmente atentasse para todos os interesses em jogo.
Talvez o
grande problema nesse confronto esteja na postura radical do governo Tsipras,
que julga possível valer-se de mecanismos financeiros, sem no entanto
considerar a possibilidade de um esforço de composição, como foi realizado por
outros países como a Irlanda, em similar situação precária aplicou os remédios
sugeridos e conseguiu vencer a crise.
A proposta de votação popular – que introduziu
o imponderável na negociação – que o Primeiro Ministro anunciou na noite desta
sexta-feira, 26 de junho, e foi aprovada pelo Parlamento helênico, em sessão
extraordinária – e põe extraordinária nisso – na madrugada do domingo corrente,
28 de junho.
Qual é o
principal desafio hodierno à Grécia ? Ela precisa evitar o calote de Euros 1,6
bilhão ao Fundo Monetário Internacional. Como não dispõe do caixa
indispensável, quer desbloquear o acesso a Euros 7,2 bilhões, que é a última
parcela do socorro de Euros 240 bilhões que vem recebendo do FMI e do Banco
Central Europeu (BCE) a partir de 2010.
Os credores
exigem compromissos fiscais, cortes de gastos e reforma profunda na
Previdência. Nesse contexto, o gabinete Tsipras fez proposta de ajuste de Euros
sete bilhões e novecentos milhões. No entanto, os credores não aceitaram a
proposta helênica.
Em
discurso no Parlamento, Alexis Tsipras, do Syriza (partido de esquerda,
derivado do antigo Synapismo) resolveu esquecer os números, a dívida grega, e
as medidas – enfrentadas e vencidas por outros países-membros em dificuldade
financeira – de adequação à realidade (cortes nos gastos e reforma para valer
na Previdência).
Confrontado com a frieza dos números, resolveu partir para o emocional: “querem
forçar a Grécia a aceitar um acordo ‘humilhante’”. E mais: “A Grécia não vai
render-se. Não é uma decisão de romper com a Europa, mas querem que assinemos
um acordo de recessão e morte lenta.”
O
ex-Primeiro Ministro Antonis Samaras, do Nova Democracia (centro-direita)
declarou que o referendo (proposto pelo Gabinete Tsipras) é um “
suicídio”: os eleitores vão votar sem saber o que vai ocorrer se o resultado
for contra um acordo com os credores.
Entrementes, os ministros responsáveis pelas dezenove economias da Zona
do Euro se reuniram em Bruxelas, no sábado 27 de junho, para avaliar o pedido para prorrogar por um
mês a dívida grega. Como não foi atendido, o Ministro grego Yanis Varoufakis
abandonou a reunião.
Nessa
oportunidade, o holandês Dijsselbloem, declarou: “O referendo proposto foi um
avanço negativo, e a Grécia rompeu as negociações com tal postura.” Segundo o
chefe do Eurogrupo, não há garantias de que o governo vá implementar o acordo,
mesmo na hipótese de que a população vote em favor desse acordo.
Dando
continuidade ao seu pessimismo, Dijsselbloem asseverou: “Acho que nós temos de
nos dar conta de que a situação da Grécia vai piorar muito rapidamente.” E
aditou: “ Não sei como o governo grego acha que vai sobreviver e lidar com tais
problemas”.
Se não
adiar a dívida de alguma forma, a República Helênica parte para o calote e pode
ficar sem ajuda externa, aumentando as possibilidades de ser forçada a
abandonar a Zona do Euro.
O primeiro
e imediato problema a ser enfrentado será conter a insolvência dos bancos
locais. A corrida bancária já é uma
realidade de parte do povo grego, que deseja retirar do caixa bancário os
próprios depósitos em euro. As previsíveis e intermináveis filas diante dos
caixas eletrônicos no sábado 27 de junho é uma realidade que se depara ante todas as agência, e que torna a insolvência
não mais uma probabilidade, mas uma certeza. Os saques, tangidos pela crise e
pela inflexibilidade das Partes, superaram cinco bilhões de euros nas últimas
duas semanas. Por isso, alguns bancos já impõem limites às retiradas.
Eleito
em janeiro sob a bandeira de oposição às medidas impostas pela Comissão
Europeia, e portanto sob o vínculo de ser contra as medidas de austeridade, o
grego Alexis Tsipras chega à hora da verdade: ou assente a um acordo que
contradiz as suas propostas e o seu discurso da campanha, ou então, ao repisar
o Não, leva o país para uma direção que o distancia cada vez mais da zona do euro.
Tudo indica que o Primeiro
Ministro acalente uma aposta de considerável risco político: se a população optar, por meio do referendo, pela negociação,Tsipras teria em tese de
aceitar algo, segundo suas palavras, “humilhante” para a Grécia.
Assinale-se, ainda, que o gabinete helênico rejeitou na sexta-feira, uma
última oferta dos países da Zona do Euro, no sentido de prorrogar por mais
cinco meses a dívida em troca de uma ajuda de Euros 16,3 bilhões. Essa injeção in
extremis dos países da Zona do Euro, dependeria, no entanto, de a República
Helênica concordar com as reformas...
Até a
votação do referendo a situação interna no sistema bancário e financeiro continua
a evoluir. Dada a dimensão da corrida aos bancos, o governo grego determinou o
fechamento dos bancos já no fim de semana. Por outro lado, o mercado de ações
não funcionará na segunda. Além disso, imporá restrições nas retiradas de
fundos e na transferência de numerário.
O
motivo principal da decisão da área financeira do Governo grego de fechar temporariamente os bancos e impor os
chamados controles de capital se deveu à iniciativa do Banco Central Europeu
motivada pela corrente crise financeira helênica: o BCE fez saber que não estendeu
programa de empréstimos de emergência que vinha dando suporte financeiro a
bancos gregos nas últimas semanas, enquanto o Governo Tsipras se esforçava em
chegar a acordo acerca da dívida com os credores internacionais.
Como se verifica, o sistema
financeiro europeu age em sincronia com a instância política de Bruxelas, como
seria de esperar. Sobrevinda a ruptura
nas negociações da dívida – a causa do dissídio foi a declaração, considerada
dissonante, do Primeiro Ministro Alexis Tsipras, de que deixava para o Povo
grego decidir se devia ou não aceitar a última oferta dos credores.
Ao
expirar o prazo do programa de salvação, se realizará no próximo domingo cinco
de julho o referendo que decidirá se o Povo grego aceita ou não as condições
dos credores.
Como
outros países integrantes da União Europeia e da Zona do Euro, a República
Helênica tem que tomar providências para superar as condições deficitárias de
sua economia. As causas são conhecidas, e o principal erro está na falta de
vontade política de sanar as causas do déficit estrutural para permitir a
recuperação da economia helênica.
O
Governo Tsipras chegou ao poder sob uma bandeira de contestação irrealista à
situação em Bruxelas. Ainda que gradualmente, Atenas precisa criar condições na
própria economia e na sua previdência que atendam à necessidade de eliminar
gastos abusivos ou desproporcionais, e procurar viver em uma economia que tenha
perspectiva de equilíbrio e de contas sustentáveis.
Talvez inebriado por uma importância que não corresponde à realidade, o
gabinete de esquerda radical de Alexis Tsipras não se afigura infelizmente como
êmulo de outros governos comunitários que souberam apertar o cinto e vencer
o desafio. Demagogia nunca resolveu crise alguma.
É
necessário, no entanto, afirmar que não foi por acaso que povo helênico votou
pelo governo do Syriza. Tal se deve ao fracasso do governo de direita da Nova
Democracia que dispondo de condições relativamente mais favoráveis, tampouco
teve a coragem de cortar os déficits na economia grega e corrigir o seu sistema
previdenciário.
O
povo helênico, dentre as suas inúmeras qualidades, é gente
trabalhadora. Sabe que para a economia doméstica não lhe venha a causar
dívidas, os seus encargos devem sempre corresponder aos respectivos proventos.
Não há milagres tanto nas finanças domésticas, quanto nas públicas. A diferença
entre elas é apenas de dimensão. Por isso, a responsabilidade e a boa gestão das
respectivas finanças caseiras é uma boa sinalização para ser aplicada também na economia política nacional.
Se
a gente grega, que tanto admirei quando de minha presença em Atenas em missão
diplomática, aprecia e valoriza a oportunidade de pertencer à zona do euro, e
dos benefícios consequentes, quero crer que é hora de enfrentar o problema com
firmeza e boa disposição. Decisões apressadas e que possam parecer demagógicas
devem ser evitadas, porque se tantos países, grandes, médios e pequenos, logram
equilibrar as próprias contas, ou, recuperar o equilíbrio perdido, não por
passes de mágica, mas pelo trabalho, o esforço conjunto e a busca de
solução que garanta para a boa gente helênica uma situação estável, em que os
direitos sejam respeitados, mas que não se procure viver acima dos respectivos
meios.
A
minha permanência aí, transcorrida nas comuns relações de respeito e amizade
dos povos helênico e brasileiro, me dá confiança para acreditar que essa boa
gente, que tanto valoriza o euro e as oportunidades que oferece, encontrará o
caminho para continuar na Comunidade Europeia e na Zona do Euro.
( Fontes:
The New York Times, Folha de S. Paulo )
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