A luta contra a Censura dá um
passo importante na queda de um suposto direito de autorização às biografias,
fundado em estranha base – o Código
Civil. O longo silêncio – ora terminado – do Supremo Tribunal Federal permitira
que biografáveis e parentes de escritores mortos impedissem a publicação das
respectivas biografias, sob a ameaça de pontuais impugnações.
Esta
barreira – cuja inconstitucionalidade
era óbvia, dada a clareza dos artigos da Constituição – só persistiu
pela tardança na sentença do Supremo Tribunal Federal.
O próprio
cantor Roberto Carlos constituíu advogado – o famoso Antonio Carlos de Almeida
Castro, o Kakay – que, diante da manifesta fraqueza jurídica da tese dos que
travavam a publicação das biografias, partiu para a defesa de um direito à
intimidade – no vão esforço de impedir biografias não-autorizadas.
A relatora Carmen Lúcia considerou, nesse
contexto, que o direito à liberdade de
expressão suplanta o das pessoas públicas à privacidade. Resumindo, disse a
Ministra: “Censura é forma de cala-boca. Pior, de calar a Constituição.”
Com unânime
aprovação (os nove ministros !) cabe perguntar por que se esperou tanto por direito
tão óbvio.
Emperradas pelo capricho dos próprios, ou
de familiares (no caso dos escritores mortos), várias biografias de grandes (ou
pequenos) vultos da literatura, das artes e dos espetáculos tiveram de
submeter-se à longa hibernação das gavetas, seja de temerosas editoras, seja de
pávidos escritores.
Assim,
rejubila-se afinal o mercado editorial. Além de Totônio Rodrigues, dormiram profundamente impublicados, grandes e pequenos escritores,
e poetas mortos, cantores e até bandidos.
No contexto,
entre os muitos comentários, me parece o mais relevante o de Fernando Morais:
“É a vitória da luz contra as trevas, da civilização contra a barbárie. O mais
surpreendente é que, na segunda década do século 21, a gente ainda tenha de
levar pro Supremo esse tipo de coisa”.
Por falar em sentenças inconstitucionais que
dormem indisturbadas por anos a fio, que tal revogar por fim – e se possível
com súmula vinculante – a censura contra o Estado de S. Paulo, na sua
reportagem sobre a operação Boi Barrica? Essa censura inconstitucional
perdura desde 2009, e hoje ressona em alguma gaveta judiciária, constitui espécimen que prefiro não definir. Por desgraça, a sua
incidência não se limita aos grotões da República. Em verdade, não é rara, vale
dizer a chamada censura judicial aos órgãos de imprensa, como é a sentença do
desembargador (TJ-DF) Dácio Vieira, que não tão estranhamente persiste na terra
de Pindorama.
Grita aos
céus que é mais do que tempo de pôr também um término à inconstitucional
censura judicial à imprensa. Ela só perdura até hoje – diante dos artigos
claríssimos da Constituição que a proibem – pela inação do Supremo Tribunal Federal
que, por inexplicáveis motivos, tarda em decepar essa última cabeça do
arbítrio.
( Fontes: Manuel Bandeira, Estado de S.
Paulo, Folha de S. Paulo, O Globo )
Nenhum comentário:
Postar um comentário