domingo, 3 de abril de 2016

O Impostismo

                                   

        No Brasil, a elite dominante não se hesita um instante em não só aumentar os tributos, mas também em multiplicá-los. Os agentes dos impostos não são muito populares, e temos disso notícia desde a Antiguidade. Mateus, um dos apóstolos de Cristo foi coletor de tributos, o que não o fazia muito popular. Jesus, no entanto, como a todos recebia, fez questão de acolhê-lo.

       Grita ao céus que se cobram demasiados impostos de nossos cidadãos, e de todas as formas, muitas delas embutidas nos preços das mercadorias - até remédios pagam impostos.

       Fala-se muito ,nos círculos dos conhecedores, que pesam demasiados impostos sobre a nossa gente. Isto sem falar que apesar da inchação mostrada pelo impostômetro, não vemos o resultado dessa carga sobre os cidadãos, refletir-se em melhores condições de vida.

       Tivemos há pouco a cobrança de um novo imposto sobre a população, relativo às domésticas. O tributo já existia, mas resolveu-se  carregá-lo de inúmeros outros fins, o que fez inchá-lo a ponto de que só contadores fossem capazes de dar-lhe possibilidade para declaração (inclui até código de barras, para absorver todos os fins embutidos em mais este imposto).

        Não sei se a risonha promotora do novel tributo, que a princípio aparecia em todas as fotos de reportagens a ele proporcionadas, e agora não mais se vê. Será  que a complexidade (inevitável no Brasil em tudo que se reporte às receitas do Estado) da elaboração da papelada necessária, tem tido um efeito negativo sobre as empregadas?  Muitas estão perdendo o emprego, por causa da complexidade da preparação da documentação indispensável para estar conforme as complicadas exigências da Receita Federal.

         Em outras palavras, o tal tributo exige que se recorra à figura do contador a cada mês que se tem de pagar o novo imposto. O que antes se fazia em máquina ATM bancária, sem ajuda de ninguém, agora implica visitas mensais a contador. Como a feitura não é simples, o preço já subiu e bastante. Com isso se onera o custo do chamado eSocial, e não poucos patrões ou preferem que a empregada fique na clandestinidade fiscal, ou até mesmo a despedem.

           Como se houvesse encontrado nova galinha dos ovos de ouro, não é que a Receita agora vai exigir que o tal eSocial - que reúne dados cadastrais  e emite guia única para as contribuições fiscais, trabalhistas e previdenciárias devidas pelos empregadores domésticos (que ainda enfrentam problemas e que, na prática, só é acessível a contadores - o que inevitavelmente onera o peso do imposto para o empregador) - agora, acesa a cobiça da Receita Federal vai passar por mais outra e enorme expansão. Antes se visava apenas às empregadas domésticas e seus patrões. Não mais nos dias que correm. A Receita acordou para o que extrair a mais de recursos com o novo programa: assim, todas as empresas, a partir do microempreendedor individual (MEI), que tenha só um empregado, às multinacionais, todos serão obrigados a utilizá-lo de forma escalonada.

            Em vista da bagunça que foi a implantação do eSocial - conforme se teve conhecimento pela imprensa e os interessados, como eu, pela contadora responsável pela viabilização do sistema para o patrão em tela - que, segundo a imprensa, ainda enfrenta problemas - o que será quando esse sistema - que infernizou a vida dos patrões domésticos - passará a ser obrigatório para todos?

             Dar rédea livre à Receita Federal é contrassenso porque  trata-se de órgão subordinado ao Ministro da Fazenda.  No entanto, o mais é o  critério dominante para a criação de impostos no Brasil. Na prática, reedita o velho sistema das antigas colônias ibéricas - tanto a hispânica, quanto a lusa - baseado no chamado patrimonialismo, que não passa de nome alternativo para a real cobiça. Ao invés de promover-se a reforma tributária no Brasil, de forma a adequar o direito fiscal às realidades do presente, o Governo recorre a um antissistema, que é o de engendrar o monstro que municia o Impostômetro. Num piscar d'olhos, o "sistema" não passa de um incremento sem fim, a ponto de se criarem esses Frankensteins modernos, que só servem para dois escopos: dificultar a vida do cidadão e inchar, em progressão algébrica, o peso fiscal, enquanto continuamos sem entrever as benesses da modernidade: saúde, segurança, transporte e educação.

              Como mostrei na minha série Brasil: Corrupção & Burocracia, que, infelizmente, acompanha a história pátria, os tributos, se indiscriminados e opressivos, podem ter função negativa na evolução da economia.    O Brasil é triste prova dessa verdade, herdada de Portugal e álacre e descuidadamente implantada em Pindorama.

 

( Fonte:  O  Globo )

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