No passado, o Líbano foi chamado de Suiça do Oriente Próximo. Na aparência, ao contrário da instabilidade de seus vizinhos árabes, presidia naquele país, em que a etnia cristã era majoritária, espírito de concórdia, que favorecia o comércio e as finanças.
Com a longa guerra civil, Beirute se tornou palco de sequestros, assassinatos e atentados. O frágil equilíbrio do antigo Líbano, colocado à prova por perturbações internas e externas, só pode ressurgir, em uma construção decerto precária, há cerca de duas décadas.
Depois de intervenções de Israel – que manteve por muito tempo ao sul uma faixa fronteiriça de ‘segurança’ – com invasões militares que chegaram a Beirute, expedições americanas, inclusive, com larga presença de fuzileiros; uma paz superficial pôde ser negociada entre as conflitantes etnias – os católicos maronitas ao norte, os sunitas, os xiitas antes esquecidos e os drusos -, cuja amarga condição foi a continuação da suserania da Síria, que por muitos anos, além da ocupação do vale da Bekaa, exerceu uma espécie de protetorado branco sobre o governo libanês (ainda com um presidente cristão-maronita e um primeiro ministro sunita).
Esta tapeçaria foi pelos ares – literalmente – com o atentado que vitimou, em fevereiro de 2005, a Rafik Hariri, ex-primeiro ministro, e que assumira a liderança da coalizão anti-Síria. Pelas características do magnicídio, uma investigação séria e internacional – sob a égide das Nações Unidas – foi empreendida. Dadas as pesadas suspeitas de envolvimento da Síria – chegando mesmo a implicar eventual responsabilidade do presidente Bashar al-Assad. Uma das consequências da morte de Hariri foi a retirada militar do exército sírio do território libanês.
Por outro lado, a aliança política anti-Síria logrou formar um gabinete sob a chefia de Fouad Siniora.
O partido Hezbollah, chefiado por Hassan Nasrallah, se tornou o grande antagonista. Congrega a comunidade xiita que, graças ao fator demográfico e ao apoio de Teerã, dispõe de substancial poder político e militar, face a um estado fraco como o libanês.
Até o presente, o Hezbollah se transformou na grande oposição à situação no Líbano. Tem forte presença, tanto em Beirute, quanto no sul. Aí, o seu poder militar cresceu em aguerrimento, em decorrência de frequentes choques com as forças israelenses. O último conflito, em 2006 (de doze de julho a catorze de agosto), se assinalou pela impossibilidade de Tel-Aviv quebrar a resistência do chamado ‘partido de Alah’ – o que foi interpretado como virtual vitória de Nasrallah. Foi a maior operação militar israelense desde a invasão de 1982, e findou de forma inconclusiva, com a retirada dos israelenses determinada pelo cessar-fogo estabelecido pelas Nações Unidas.
Nesse contexto de um país em que se contrapõem de um lado o estamento político até hoje preponderante – formado, sobretudo, pela aliança entre cristãos maronitas e árabes sunitas - e de outro, a comunidade xiita, chefiada pelo xeique Hassan Nasrallah, que constitui uma oposição bem armada e a quem o ineficaz exército libanês não semelha em condições de desarmar – é que transcorreu a visita do Presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.
A visita oficial de Ahmadinejad ao conturbado país do Levante não há de contribuir para o reforço do estado libanês. Sendo o Irã xiita o tradicional patrono do Hezbollah – e tais laços não são apenas de concerto religioso, mas também de provisão de armamentos -, a vinda do presidente iraniano tenderá a ser encarada como dirigida precipuamente àquela comunidade, e não ao Líbano, em seu todo.
Assim, após as visitas protocolares ao Presidente Michel Suleiman, e ao Primeiro Ministro Said Hariri (filho de Rafik), Ahmadinejad cuidou de reunir-se com o seu pro-cônsul, o xeique Nasrallah.
No dia seguinte, catorze de outubro, a autoridade iraniana deslocou-se ao sul do Líbano, no bastião do Hesbollah. Na cidade de Bint Jbail, a poucos quilômetros da fronteira, praticamente destruída no conflito de 2006, e parcialmente reedificada com fundos iranianos, Ahmadinejad produziu peça oratória que não difere das injúrias e impropérios habituais. Ao contrário de o que antecipara, Ahmadinejad preferiu ser cauteloso na sua provocação à ‘entidade sionista’. Não foi até à fronteira jogar pedras contra aquela organização que o presidente do Irã deseja varrer do mapa. Seu discurso, com os traços já conhecidos, a conclamar a ‘eliminação dos Sionistas’ e a invocação do messias e ‘o levante dos oprimidos’foi pronunciado em distância prudente, sem proximidades imediatas com o braço armado de Israel.
De qualquer forma, a mensagem de apoio ao Hezbollah é bastante evidente. Tal postura será também assumida com vistas a Washington, dentro dessa mescla de truculência e de fanfarronice que caracterizam o personagem.
Por fim, no quadro da investigação do assassínio do ex-Primeiro Ministro Rafik Hariri pelo Tribunal Internacional, existe a expectativa de que serão indiciados, dentre os acusados por aquele magnicídio, membros do Hezbollah. A esse propósito, o grupo fez saber que tal indiciamento acarretaria ‘perigosas consequências’.
( Fonte: International Herald Tribune )
domingo, 17 de outubro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário