Bill Clinton – de novo popular
Bill Clinton, o 42º presidente do Estados Unidos, a despeito dos escândalos amorosos (sobretudo, o da estagiária Monica Lewinsky), nunca deixou, enquanto primeiro mandatário, de gozar de bons níveis de aprovação. Apesar de haver perdido a maioria no Congresso para os republicanos, e de sofrer a impiedosa perseguição do promotor especial Ken Starr – tendo sido inclusive forçado a submeter-se à arguição de um juiz e o impeachment votado pela maioria republicana da Câmara de Representantes – o G.O.P. não logrou que o Senado confirmasse o parecer da Câmara. Se Bill Clinton sobreviveu ao ataque político, tal resultado não pouco se deveu à sua popularidade junto ao povo americano.
Clinton não só conseguiu desmoralizar a tentativa de Newt Gingrich de impedi-lo de governar, como obteve êxito em muitas iniciativas. Uma de suas maiores realizações no plano interno foi alcançar o equilíbrio das contas públicas. Com efeito, depois de muitos anos, Clinton tornou superavitário o orçamento do governo federal (Bush júnior tratou de rapidamente colocar as contas no vermelho, com as suas reduções de impostos para os contribuintes mais ricos. Mais tarde, o estrago seria ainda maior com a explosão dos gastos causada pela guerra contra o Iraque).
Prosperou a fundação criada por Clinton, sendo vetor importante de ajuda humanitária, dirigida para os países mais pobres. Posto que se volte precipuamente para a África, o recente terremoto no Haiti o mostrou também aí presente.
Na política interna, na última campanha presidencial empenhou-se a fundo pela candidatura da esposa, a Senadora Hillary Clinton. É conhecida a história dessa tentativa malograda. Partindo como favorita, Hillary foi surpreendida pelo Senador júnior por Illinois, que com grande habilidade soube motivar o público jovem, além de receber o maciço apoio dos afro-americanos.
Bill Clinton, confiando no seu trânsito com esta faixa, indispôs-se amiúde com eleitores democratas. O acirramento dos ânimos chegou a um ponto em que as principais redes televisivas passaram a delegar jornalistas para cobrirem as intervenções de Clinton. Conhecidos como ‘chacais’, a sua função básica era colher os destampatórios do antigo presidente, que atraía a mídia através de reações que resvalavam para muito além do pitoresco.
Não surpreende, por conseguinte, que a popularidade do ex-presidente haja então baixado de forma acentuada.
Sem embargo, a simpatia de Bill Clinton e o seu ‘don de gentes’[1] iriam possibilitar a atual incrível ressurreição de sua popularidade junto ao povo americano. Para que se tenha ideia desta peripeteia, sem exercer cargo público (como é, de resto praxe com os ex-presidentes), o cônjuge da Secretária de Estado Hillary Clinton é o político americano mais requestado pelos seus colegas democratas, para visitar-lhes os respectivos distritos ou estados, para aí discursar aos seus eleitores. Visto surpreendentemente com favor até por congressistas republicanos (no caso, as recordações nostálgicas dos eleitos do GOP privilegiam certos aspectos de sua personalidade, como a capacidade de construir acordos bipartidários), talvez nada mais expressivo – se bem que um tanto cruel – de seu trânsito junto ao povo americano está na circunstância de que Clinton é bem recebido em áreas onde o Presidente Barack Obama sequer ousaria pôr os pés.
A popularidade clintoniana não se restringe, aliás, aos Estados Unidos. Como o 42º presidente dos Estados Unidos é um visitante internacional – as suas viagens, como as de Ulisses, alcançam locais exóticos, mas ao invés do herói homérico não são deixadas ao acaso – os restaurantes mais diversos e inclusive lanchonetes, em função da respectiva passagem, vêem o número de fregueses aumentar de forma pronunciada. Se depois da operação cardíaca a que teve de submeter-se, Clinton se tornou vegetariano, o apetite do ex-presidente permanece em niveis que são muito bem acolhidos pelos seus múltiplos anfitriões.
Tarik Aziz condenado à morte
Como colaborador direto de Saddam Hussein, Tarik Aziz se tornou personalidade bastante conhecida no circuito diplomático. A despeito de ser cristão da seita caldeia, Aziz fruiu por muitos anos da confiança do ditador iraquiano. Tal se deveu, em grande parte, à sua habilidade e capacidade intelectual em apresentar os atos de Saddam de forma articulada, logrando vesti-los com aparência de racionalidade.
Em inúmeras crises, originadas ou não da ação do presidente iraquiano, a defesa e a promoção dos objetivos perseguidos por Saddam esteve a cargo, no âmbito diplomático, de Tarik Aziz. Assim, antes e durante a Guerra do Golfo de 1991, Tarik Aziz, de início nas funções de Ministro de Relações Exteriores, e mais tarde como vice-Primeiro Ministro[2], representou o governo de Bagdá em reuniões internacionais. Às vésperas da eclosão do conflito, reuniu-se em Genebra com o então Secretário de Estado americano, James A. Baker III.
Se Tarik Aziz seria a face diplomática do ditador sunita Saddam Hussein, até recentemente não se estabelecera qualquer conexão sua com os aspectos mais brutais e violentos do regime, como as diversas execuções e expurgos promovidos pelo regime baathista de Saddam.
Não despertará estranheza que, não obstante o seu não-envolvimento nas ações repressoras do regime, Tarik Aziz estivesse entre os altos-funcionários mais procurados pelas forças de ocupação, uma vez concluída a primeira parte do conflito, a da chamada guerra convencional, de que George Bush Jr., com uniforme de aviador militar, epitomizou o farcesco fim na sua aterrissagem no porta-aviões Abraham Lincoln, a primeiro de maio de 2003, sob a faixa “Missão cumprida”.
Ainda em 2003 Tarik Aziz preferiu entregar-se ao exército americano. Infelizmente para ele, no entanto, se tornaria réu de diversos processos, impetrados na justiça iraquiana, ora dominada pelos xiitas. Embora os seus advogados enfatizassem que Aziz só era responsável pelas relações políticas e diplomáticas, ele passou a ser objeto de uma bateria de processos que, a despeito das afirmações em contrário, recendiam mais a revanchismo xiita contra uma das principais autoridades do regime de Saddam.
Desse modo, em março de 2009, Aziz foi condenado a quinze anos de prisão, “por crimes contra a humanidade”. Anteriormente, fora absolvido de acusação de que ordenara repressão contra manifestantes xiitas, após o assassínio de um clérigo xiita.
Contudo, a perseguição judicial contra o ex-Ministro do Exterior não ficaria nisso.
Além de condenado a sete anos de prisão por envolvimento em forçada deslocação de curdos no Iraque do norte, Tarik Aziz acaba de receber a sentença capital, alegadamente por crimes contra partidos políticos rivais, de credo xiita.
Dado o caráter obscuro das incriminações do tribunal, subsiste a válida suspeita de que o ex-auxiliar direto de Saddam Hussein está sendo objeto de uma vindita dos partidos xiitas, que ora dominam o poder no Iraque. Ele, que contava terminar os seus dias na prisão, e cuja saúde é bastante precária (acabou de ser internado por um aneurisma no cérebro), quiçá por motivos mais políticos do que judiciais pode ser enforcado, como seu patrão o foi, em 2006.
Polêmica Reunião da Unesco
A cada ano, na terceira quinta-feira de Novembro, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Ciência, a Educação e a Cultura) tem programada reunião para que filósofos se dediquem a um livre debate filosófico.
Estando na Unesco representados os respectivos governos nacionais, nem sempre tem precedência sobre o político a vocação racional da discussão. Ao marcar para Teerã o local do encontro deste ano, surgiu o temor de que, ao invés da ênfase cultural, a assembleia se transforme em exercício de propaganda para regime famigerado pela própria brutalidade.
O filósofo iraniano Ramin Jahanbegloo – que atualmente leciona na Universidade de Toronto – havia sido detido pelos esbirros do governo do Irã sob a incriminação de “manter contatos com estrangeiros”. Acusado, em seguida, pela imprensa persa de ligações com a CIA e o Mossad (serviço secreto israelense), Jahanbegloo foi também indiciado por trazer filósofos ocidentais ao Irã – entre outros Jürgen Habermas e Richard Rorty (posteriormente falecido), supostamente para criar condições de uma ‘revolução de veludo’ no Irã dos ayatollahs.
O filósofo Jahanbegloo deve a uma campanha internacional a sua libertação do cárcere. Vivendo hoje no Canadá, ele se considera afortunado por haver escapado com vida da ditadura iraniana.
Ao ser informado da realização neste ano da reunião filosófica em Teerã, decidiu escrever para a diretora-geral da Unesco, Irina Bokova: “É certo que nas atuais condições o Dia Mundial da Filosofia não poderia ser realizado normalmente, e que muitos filósofos não poderiam participar livremente.”
Como a burocracia internacional da Unesco se mostrou impérvia ao cancelamento, o Dr. Jahanbegloo e mais dois colegas italianos começaram a organizar o boicote.
Logo verificaram que, mesmo em casos limite, como o do Irã, não é fácil implementar tal decisão política. Há diversos filósofos que entendem a realização do encontro em uma ditadura tão brutal, como oportunidade de manifestar aos oprimidos através da respectiva presença uma janela de liberdade.
Jahanbegloo pede licença para discordar : “É um governo que prendeu inúmeros estudiosos e escritores nos últimos cinco anos, e onde perdura total proibição ao pensamento independente e crítico.”
Em função da discussão, o filósofo alemão Otfried Höffe, que concordara em pronunciar a conferência principal (keynote speech) da reunião já mandou dizer que não irá. A esse respeito, Höffe declarou ao “Frankfurter Allgemeine Zeitung”, o mais conceituado jornal alemão, existir “o risco de o Dia Mundial da Filosofia possa ser usado pelo senhor Ahmadinejad como plataforma de propaganda. Não tenho a menor intenção de ajudá-lo”.
Jürgen Habermas, talvez o maior intelectual alemão, apoiou a resolução de Höffe. Por outro lado, em 27 de setembro os oponentes do evento em Teerã participaram de reunião na Nova Escola para a Pesquisa Social, com vistas a planejar conferência alternativa do Dia Mundial da Filosofia, a realizar-se on-line.
Essa movimentação provocou mudança de atitude na Unesco. Ainda que oficialmente a Sra. Williams, porta-voz da Unesco, desminta qualquer intenção de diminuir a importância da reunião em Teerã, anuncia-se que a organização realizará igualmente na sua sede parisiense um Dia Mundial de Filosofia, na quinta, dezoito de novembro. Haverá também outros encontros similares na Cidade do México, em Túnis e em Dacar.
Formalmente denegado, mas na prática confirmado, o downgrading[3] da reunião de Teerã é saudado, com satisfação, por Giancarlo Bosetti, outro dos organizadores do boicote. Para ele, foi o encontro de New York que constrangeu a Unesco a agir.
(Fonte: International Herald Tribune )
[1] alta capacidade de relacionamento humano.
[2] Como ao copta Boutros-Boutros Ghali no Egito, o que impedia a Tarik Aziz de ser comissionado com o cargo de primeiro ministro não foi a sua notória capacidade, mas o fato de ser cristão caldeu em terra islâmica.
[3] rebaixamento.
domingo, 31 de outubro de 2010
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