A campanha do segundo turno difere radicalmente da do primeiro turno. Nesse, alicerçada pelos chorrilho de prévias, a campanha de Dilma Rousseff se norteou pelo lema do ‘Lulinha, paz e amor’, que tão bem funcionara na eleição de 2002. Nos debates, Dilma mostrou a face inabitual de quase mansuetude, contornando as eventuais provocações em geral lançadas pelo representante dos nanicos, o ex-petista Plinio de Arruda Sampaio (PSol).
Para quem assistiu ao encontro promovido pela Bandeirantes, no domingo, dez de outubro, estava ali outra candidata. Sob o golpe do para ela inesperado tropeço de não liquidar a fatura no primeiro turno, Dilma, sempre por instruções do padrinho, o Presidente Lula, reapareceu sem máscara, com a rispidez e a agressividade que lhe são desde muito atribuidas.
Não hesitou em agir segundo a cartilha dos postulantes que se acham em inferioridade. Não importa que tal situação fosse mais temida do que real. Convencida por criador e marqueteiro, ela se embarafustou pelas vias tortuosas do ataque e da campanha negativa, ímêmore de o que ocorrera com o candidato Alckmin (PSDB), quando este se dispôs a investir pesado contra Lula, na abertura da disputa pelo segundo turno em 2006.
A crônica do primeiro turno já nos proporcionou uma lição de certo ainda oportuna. As prévias se sucedem, e mesmo as do instituto mais respeitado, o Datafolha, não nos encheram as medidas, eis que, provadas pela aferição implacável das urnas, apresentaram muitas deficiências. As que dizem respeito ao aspecto técnico – e são aquelas que concernem ao Datafolha – as falhas de três de outubro apontam para a necessidade futura de aperfeiçoar os respectivos parâmetros, inclusive aumentando significativamente o respectivo público consultado que, se pode corresponder a demografias como a venezuelana, para a brasileira se afigura gritantemente inadequado.
Por todos esses deslizes, não é sem preocupação que se depara a desenvoltura dos diversos institutos em multiplicar pesquisas, através das quais se pode ter uma influência de todo inapropriada sobre a imagem dos candidatos e de suas possibilidades.
Sem prejuízo das considerações acima, talvez as derrapagens nas previsões do primeiro turno (inclusive, o que é inédito, na pesquisa de boca de urna) hajam escarmentado um tanto aqueles institutos suscetíveis de tais influências corretivas.
Na pesquisa do Ibope, a diferença entre Dilma e Serra continua a lentamente encolher. A petista teria 49% dos votos, contra 43% dados ao desafiante.
No lado tucano, cresce a confiança na possibilidade de vitória. Aécio Neves e o PSDB mineiro – a grande derrota até agora da motoniveladora de Lula – se dispõem a reverter a vantagem de Dilma no primeiro turno. Com as bancadas asseguradas e os novos ventos, não há mais fantasmas a conter a arremetida dos tucanos naquele estado, em que Aécio fez o governador e o segundo Senador, o ex-presidente Itamar Franco.
Diante da consciência desta força inercial, o candidato José Serra segue o figurino do primeiro debate. Deixa o vezo dos ataques e da antipatia que daí deflui, a cargo da candidata Dilma, que se aferra na luta de preservar vantagem que começa a ser comida pelas bordas. De forma medida, como convém a um cavalheiro, não pode decerto permitir que tudo passe em branca nuvem. As intervenções desse gênero, todavia, serão sempre pontuais, e de molde a serem compreendidas pelos mais exigentes telespectadores.
Tudo indica que há nervosismo no campo petista. O criador, sobretudo, se movimenta, e muito. Como alhures assinalado, os deveres de chefe de governo não semelham ter a devida prioridade, com muitas questões importantes deixadas em suspenso como refere a imprensa.
Em recente encontro entre Dilma Rousseff e líderes evangélicos, o padrinho da candidata entrou e saíu pela porta dos fundos. Esse comportamento não há de iludir a ninguém quanto ao tardio empenho do Presidente e de sua pupila em desfazer ou minorar os estragos de declarações pregressas, quando a perspectiva do pleito não pairava tão próxima no horizonte da então Chefe da Casa Civil.
Agora, no afã de tapar buracos que fazem água, Dilma promete que assinará carta-compromisso contra o aborto e o casamento gay. A justificativa ad hoc é a condição laica do Estado, e por isso, consoante afirma, se compromete a não enviar ao Congresso projetos de impacto na religião. O recuo seria total se não perdurassem os espectros de assertivas feitas anteriormente, e sem qualquer constrangimento.
Em face de tudo isso, semelha demasiado cedo para indicar favoritos na contenda final. Não sei se a atual campanha continuará a ser a mais acirrada e disputada, desde os idos de 1989.
Mas que, pelo andor da carruagem, ganha ares de tornar-se a mais interessante, poucos tenderão a contraditá-lo.
(Fonte: O Globo )
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
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