O último debate antes do primeiro turno transcorreu sem grandes momentos. Daí a qualificação de morno.
Pode-se objetar que as assessorias político-partidárias desde muito cuidaram de engessar tais disputas oratórias. Assim, amiúde acusações são lançadas, mas, por força das regras, não há espaço para a resposta, nem sequer para elaborações que tragam a questão mais para perto do dia-a-dia do eleitor.
Mais do que canalizando, na verdade cerceando as aberturas polêmicas, muitos temas podem ser encetados, mas poucos tenderão a ensejar discussão autêntica e aprofundada. Na realidade, este escopo é uma quimera, no entender dos estados-maiores dos principais candidatos.
A estrutura do debate ora imperante semelha, portanto, o conduto ideal para aquele linguajar que o francês denomina ‘langue de bois’[1]. Recheado de slogans, de propostas partidárias, de exposições que não ousam sair da terra firme das plataformas e dos discursos preparados de antemão, serão a verdade e a franqueza as maiores vítimas do exercício.
Dessarte, os partidos se serviram da passada experiência não para tornar este encontro uma ocasião em que o eleitor possa avaliar e discernir entre propostas e personalidades. Fica, assim, cada vez mais árduo que saia qualquer coisa de significativo e de surpreendentemente novo das inúmeras moitas que circundam os candidatos.
Ao requintar-se nas regras, ao torná-las sempre mais bizantinas e contrárias ao fluxo normal de argumentação, não há correntes que logrem encaminhar o suposto debate para instantes de luminoso esclarecimento. A excessiva prudência das assessorias acaba descambando para o medo de abrir flancos. Por isso os golpes são tímidos e nem de longe rasgam trilhas em meio ao cipoal das assertivas oficiais, ou das peças repetidas à exaustão.
Ontem, na pessoa de Plínio de Arruda Sampaio, o candidato do PSOL, se situou o arremedo de verdade ou de perigo para os demais candidatos. Da sua extrema fraqueza em termos de pesquisa (1% dos sufrágios), ele se avantajou, levado pela certeza de suas convicções e a força de quem sabe que nada tem a perder.
Não importa se muitas das suas colocações são impensáveis no mundo globalizado de hoje. A sua proposta alternativa, pela própria radicalização, semelha eco de mensagens pregressas, muita vez bradadas na juventude pelos respectivos adversários no debate. Por isso, malgrado impraticáveis hoje, guardam aura inconveniente, se proferidas diante dos candidatos agora aceitos pelo establishment.
Plínio continua a ser o mesmo. Se não é fórmula eleitoral de sucesso, constitui decerto um memento desconfortável para antigos companheiros.
Fundadas na indigência do respectivo apoio popular, suas observações e juízos críticos têm por vezes a fugídia ressonância das verdades de antanho. O riso dos circunstantes revela o desconforto com os esqueletos de súbito expostos.
No entanto, o silêncio dos poderosos e da mídia voltará e a palavra do candidato, dito nanico, estará destinada ao progressivo desaparecimento dos gritos que ecoam nas pedras do deserto. A princípio, fortes, em seguida,confusos no tumulto dos sons acavalados, para enfim sumirem na muda apatia dos elementos.
Quanto aos demais debatedores, Dilma se agarrou na sua persona de sucessora de um protetor popular; Serra, na repetição que começa a parecer patética, do seu perfil através do próprio êxito na ascensão política; e Marina, a discreta candidata do movimento verde, que persegue, arrimada no magro progresso das prévias, a visão mirífica do segundo turno.
Se este segundo turno virá ou não, será coisa da deusa Fortuna. Não me animaria a responsabilizar nenhum dos litigantes pelo seu eventual surgimento.
Pensando bem, talvez se possa responsabilizar a opinião pública por convocá-lo uma vez mais, dado o seu não convencimento quanto a excessivas qualidades nos três principais candidatos. Nesse caso, nenhum deles mereceria o galardão do triunfo antecipado...
[1] Língua de madeira.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
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