Para os que acompanham os comentários econômicos deste blog, ficou patente que desde muito o governo Luiz Inácio Lula da Silva abandonou a correção nas contas. No primeiro mandato, a administração petista seguia a ortodoxia fiscal. Enquanto Antonio Palocci esteve à frente do Ministério da Fazenda, a seriedade presidiu à gestão dos negócios.
Esta atuação rendeu muitos – e merecidos – dividendos ao governo do Presidente Lula. Com o respeito às regras econômico-financeiras, nossa situação se reforçou consideravelmente. A impressão dada pela apresentação dos principais indicadores econômicos – e a provada constância nos períodos sucessivos – contribuíu para refletir imagem de solidez e confiabilidade, que se traduziria na atenção dispensada à economia, à nossa moeda e às vantagens comparativas em relação a outros países ditos emergentes.
Tal estado de coisas – que colaborou para o crescente prestígio internacional da administração Lula – iria, no entanto, ser substituído no segundo mandato por outra filosofia. Com a saída de Palocci da Fazenda, este ministério mudaria não só de titular, mas também de orientação.
Como a involução das contas públicas iria demonstrá-lo, a conversão de Lula à austeridade econômico-financeira foi passageira. Surpreendera a princípio que o principal líder petista tivesse renunciado às antigas posturas pouco ortodoxas nesse domínio. Afinal, o PT se opusera ao Plano Real e à Lei de Responsabilidade Fiscal, tudo fazendo para derrubar tais fundamentos de nossa recuperação econômico-financeira.
Forçado a largar o timão das contas – em que se pautara pela assumida coerência com a política seguida pelo governo anterior - Palocci não mais poderia impedir os ímpetos presidenciais de maiores despesas, e da gastança resultante, sem a contrapartida dos fundos indispensáveis na arrecadação do Estado.
O seu sucessor, Guido Mantega, não logrou conter os impulsos de Lula com vistas ao incremento desmedido das despesas sem lastro fiscal. Ao inteirar-se do instituto da capitalização, Lula pensou ter encontrado o instrumento mágico de gastar sem preocupar-se com os severos preceitos da exação fiscal.
Diante dos excessivos gastos derivados da inchação da administração pública – a multiplicação dos ministérios como meio de negociação política, com o dinheiro das contas públicas desperdiçado na sobrecarga dos gastos correntes, a falta de investimentos em setores produtivos e na infraestrutura, em benefício de política assistencialista e clientelista – não será causa de assombro que o Presidente Lula se haja enamorado da capitalização como se fora autêntica panaceia, a varinha de condão que lhe dispensava cuidados com as regras da ortodoxia.
A descrição, a respeito da colunista Miriam Leitão, semelha de clareza meridiana: “como é possível a emissão de título que é dívida, vira capitalização do BNDES, em seguida aumento de capital da Petrobrás e, no fim, entra no caixa do Tesouro como receita ?”
Com uma sucessão de truques fiscais, o Ministério da Fazenda torna artificialmente superavitárias as contas públicas.
Será crível imaginar que os responsáveis pelo Ministério da Fazenda, pensando agradar ao Presidente, acaso julgam que tal canhestro recurso possa enganar a alguém, além talvez de si próprios ? Pelo ralo já se foi a antiga transparência nas contas públicas. Arrastado pela aparente facilidade desses malabarismos, Lula ressuscita a velha heterodoxia. Se muitas são as vias abertas para tais malabarismos – a manipulação do superavit fiscal, dívidas que viram receitas, a dívida liquida que é apenas um artifício para esconder o aumento da dívida bruta – não é difícil antever aonde vá dar todo o pueril exercício de irresponsabilidade fiscal.
O caminho do inferno não está só pavimentado de boas intenções. Entre as mais perniciosas estão aquelas dos espertos burros, e de seus solícitos ajudantes.
( Fonte: O Globo )
terça-feira, 5 de outubro de 2010
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