A diferença entre a potencialidade econômica do Rio e de São Paulo é uma componente da realidade nacional. Basta ver a disparidade entre trinta segundos do preço da publicidade no horário nobre da televisão se dirigida a São Paulo ou ao Rio de Janeiro. O peso econômico-financeiro de São Paulo não surgiu da noite para o dia, e já antecedia a mudança da capital federal para o planalto central. Se a grande realização de Juscelino Kubitschek transformou o país e desbravou espaços que antes padeciam de seculares atrasos, o Rio de Janeiro, centro nacional desde 1763, pagou e muito com a perda de sua privilegiada posição.
A transferência da capital – reporto-me à efetiva partida dos ministérios – seria processo gradual. Contudo, começou a acelerar-se deveras na década de setenta, primeiro pela ‘mudança’ do Itamaraty para Brasília – até então as relações exteriores continuavam na Velhacap, enquanto na nova capital, havia apenas um escritório de representação, sem qualquer importância. No momento em que o Itamaraty se instala em Brasília, as embaixadas tiveram seis meses de prazo para acompanhá-lo.
Largos lotes foram doados pelo Brasil para as missões estrangeiras. Se no princípio, havia muita poeira e pouco comércio e diversões, não escapou aos chers collègues[1] que o processo era irreversível. As idas em fins de semana à Belacap dependiam da Varig e da Vasp. Com o passar dos anos essas travessias se tornariam menos indispensáveis.
Por sua vez, o Rio sofreu um outro baque, que lhe foi imposto pelos generais. A fusão entre o Estado do Rio, capital Niterói, e o antigo Distrito Federal foi realizada sob pretexto de integração, mas na verdade para tirar um governo estadual do MDB, naqueles tempos de chumbo de eleições indiretas.
Dessarte, além do esvaziamento inevitável de uma cidade que sediava desde a colônia o poder, primeiro dos Vice-Reis, mais tarde, acolhendo o principe-regente D. João, e em seguida o do Império, a união entre a província fluminense e o antigo D.F. criaria novas realidades políticas. A sucessão de governadores não se assinalou para especial contribuição para o progresso do novo Estado do Rio. Talvez Lionel Brizola constitua exceção, mas a questão é controversa, pois se na educação e nos transportes a sua administração se distingue, em outros setores acelerou processos que teriam efeitos deletérios sobre o Rio de Janeiro.
Perfilam-se para o pleito de outubro três candidatos: de um lado, buscando a reeleição, Sérgio Cabral, do PMDB, que teria o apoio de Lula (de que serve isso, depois da ‘ajuda’ prestada pelo Presidente, ao ensejo da famigerada emenda Ibsen Pinheiro, é pergunta que há de assombrar as noites do governador); do outro, o ex-Governador Garotinho, hoje no P.R., seria a volta dos programas de almoços a um real (tais são os projetos sociais que segundo o neopopulista o povo guarda no coração). No meio da liça, deparamos Fernando Gabeira, em que o P.V. julga possível reeditar a epopeia da campanha pela prefeitura do Rio.
Em torno do deputado, voejam as mesmas figuras de antes: Alfredo Sirkis e Aspásia Camargo, mais a sempre discreta Marina Silva. Mas, por enquanto, persiste atmosfera de coisas já passadas, em torno da grande promessa que não foi.
E não é que para completar o quadro o jornal O Globo estampa uma página com os números das realizações dos governos Serra e Cabral nos respectivos estados ?
Os contrastes são tantos, e apequenam a tal ponto não só o Rio, mas também o governo de Sérgio Cabral, que me cingirei a citar apenas alguns deles. Dessa maneira, o Rio ganhou a candidatura olímpica, mas quem está cuidando do metrô é São Paulo e seu governador: dez estações serão lá inauguradas até o fim do ano, em dezesseis km de linhas; aqui, pífios oitocentos metros, que levaram quatro anos para serem completados,e uma única estação, enquanto, ao invés da ansiada melhora, o serviço degringola em piada de mau gosto.
Sérgio Cabral investe na retomada pelo poder estadual das favelas, com o ciclo iniciado em Dona Marta. Por sua vez, Serra construíu seis novas prisões, com 3.300 vagas para detidos; em contraposição, Cabral não construíu nenhuma. Em saneamento, a Cedae – que se ‘esqueceu’ de assinalar a ajuda de Eike Batista – investiu R$l,5 bilhão e São Paulo empregou R$ 6,8 bilhões em total de 684 mil ligações de esgoto até o final do ano.
Não sabemos como terminará a questão dos royalties. Com eles, o estado do Rio se vê em dificuldades, como o quadro sinótico de O Globo mostra à saciedade. Tampouco nos atrevemos em prever como há de acabar : em tragédia, farsa ou uma composição de última hora? Depois que os espíritos saíram da garrafa, semelha dificil o retorno ao statu quo ante. Sem royalties, caro eleitor, será preciso pensar muito no voto para o governo do Estado do Rio.
Porque dentre todas as dúvidas que pairam nos ares, uma coisa continua a ser certa. Não adianta chorar, depois do leite derramado.
( Fonte: O Globo )
[1] Caros Colegas, maneira faceciosa de se referir aos diplomatas.
sábado, 3 de abril de 2010
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