sexta-feira, 2 de abril de 2010

O Real Visto pelo Mercado de Capitais

O artigo está em página interna da seção econômica, em única coluna espremida do lado esquerdo da folha. Tampouco seja no cabeçalho, seja no subtítulo o leitor pode ter ideia do principal tema da matéria versada.
E, no entanto, o destaque dado pela articulista se reporta precipuamente ao real. Quem leia o comentário, poderá ficar com a impressão de um viés negativo do autor. A começar pelo título “Moedas cujo brilho diminuíu” e, logo a seguir, pelo parágrafo inicial: “moedas dos mercados emergentes foram o furor por todo o ano passado, por causa de suas robustas economias, mas os seus fundamentos se tornam menos atraentes para alguns investidores, pelo menos no curto prazo.”
Contudo, o restante do comentário parece ter saído da pena de outra pessoa. Como se a jornalista tivesse optado por diminuir o realce atribuído à moeda brasileira, ao reler a coluna e preferir matizar-lhe o sentido, como se expressão dubitativa desse uma feição mais jornalística à avaliação.
Assim, se se aponta de início os inusitados ganhos registrados em 2009 pelo real, o peso chileno e algumas divisas asiáticas, se aduz que essas moedas perderam algum valor em relação ao dólar em 2010.
A despeito das menções acima, no restante da longa coluna somente se discutem as perspectivas do real. A ênfase é marcadamente especulativa, como se verifica que se está tornando mais difícil lucrar muito no curto termo, ainda que se reconheça que a médio e longo prazo as possibilidades são muito boas.
O mapa da mina desses inversores é conhecido, mas para a reporter vale a pena especificar: tomar emprestado em dólares, com seus atuais juros baixíssimos, e, por sua vez, emprestar em reais, com os seus altos juros, e, rapidamente, embolsar o lucro resultante da diferença nos juros.
Sempre a partir do prisma do especulador estrangeiro, o artigo refere as intervenções ocasionais do Banco Central do Brasil, com vistas a controlar a apreciação do real (o que, como bem sabemos, tende a dificultar as nossas exportações). Foi dentro da mesma linha – retardar a valorização do real com respeito ao dólar - que se introduziram alguns controles na entrada dos capitais no Brasil.
As próprias observações são elaboradas dentro de uma ótica quase predatória dos fluxos de capital. Assim, o escopo é simplesmente especulativo, sem qualquer intenção de permanências mais longas (e mais produtivas) do capital. Por vezes, o enfoque chega a ser quase caricatural, ao afirmar no mesmo parágrafo que o real está em luta com o dólar em 2010, quando caíu quase três por cento em relação ao dolar, ao invés do ocorrido em 2009, quando se apreciou 33% ! Não surpreende, todavia, que logo reconheça permanecer o real como o preferido (darling) no mercado cambial.
A estabilidade de uma moeda, a sua fácil convertibilidade, e o respectivo coeficiente de confiança – que é tão difícil aferrar – estão nas entrelinhas desse artigo. A sua releitura mostra o caminho que este importante símbolo nacional já percorreu.
Não é coisa de somenos o que foi conseguido pelo Brasil – e nisso participaram e colaboraram os dos principais partidos de governo.
De tudo, o mais importante é não esquecer de onde saímos. Para nunca mais permitirmos que volte a irresponsável cultura da inflação.

( Fonte: International Herald Tribune )

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