quinta-feira, 15 de abril de 2010

O Escândalo de Usina em Belo Monte

A despeito de todas as dúvidas suscitadas pelo projetada construção de hidrelétrica em Belo Monte – e não são poucas – o Presidente Luiz Inacio Lula da Silva está decidido a levar avante a obra de qualquer maneira.
Como as cortinas de seu segundo mandato se cerrarão em menos de nove meses, Lula sente a pressão do minguante poder e acelera os tempos de tudo aquilo que na sua mente aproveite ao próprio governo.
Em outras palavras, como se fora um ditador, teme a alternância no poder e, mais do que isso, a relativa irrelevância da planície. O seu partido, cevado por tantos anos no governo, vê como séria ameaça o afastamento das instâncias do poder.
O caso da usina de Belo Monte é exemplo significativo. O que, na década dos setenta, nem o regime militar dos generais-presidentes se atreveu a realizar, agora Lula se encasquetou de enfiar-nos goela abaixo esse escândalo ecológico.
Não se perca mais tempo para entoar loas ao zeligueano ambientalismo de Lula, o emocionado orador da conferência de Copenhague. Suas confissões ambientalistas têm tanta credibilidade como as promessas feitas, não segundo o próprio mérito, mas de conformidade com o público que as presencia.
A viabilidade ambiental da empresa não está garantida pelos técnicos do Ibama. Segundo declararam, não tiveram tempo de considerar as questões levantadas nas audiências públicas, e por isso não tinham como garantir-lhe a segurança ambiental.
Ainda sob a gestão do flexível Ministro Carlos Minc, Lula arrancara a licença prévia ao empreendimento. Agora, o juiz federal Antonio Carlos Almeida Campelo, de Altamira, suspendeu, no início da noite de catorze de abril corrente tanto o leilão, marcado para a próxima terça-feira, vinte de abril, quanto a referida licença prévia. Há outras ações em curso, de iniciativa do Ministério Público.
A par da rejeição dos povos indígenas – a empresa prevê o deslocamento de cinquenta mil pessoas – o que não falta nessa questão, como assinala Míriam Leitão, são as dúvidas
.
Dessarte, sob o aspecto da viabilidade econômica-financeira, duas das maiores empreiteiras do país desistiram de participar do leilão, por a julgarem demasiado arriscada economicamente.
Dada a exuberância da biodiversidade do rio Xingu – lá haveria mais espécies de peixe do que em toda Europa – é difícil compreender o porquê dos que tencionam aí construir a terceira hidrelétrica do mundo.
Diante das sobejas indicações de que o BNDES não fez o dever da casa quanto a determinar seja a viabilidade econômica-financeira, sejam os custos incorridos pela invasão sócio-ambiental, entende-se o motivo pelo qual os Fundos de Pensão – que estão sendo constrangidos a associar-se a empresa – também relutem em fazê-lo, pelas dificuldades que teimam em repontar.
Com efeito, as dúvidas igualmente se estendem à potência da usina. Ao contrário dos 11 MW aventados, na verdade a produção média não deverá exceder os 4 mil MW, com a possibilidade que em um quarto do ano se restrinja, pelo regime de águas, a 1 MW.
Se a guerra das liminares mal começa, e se os precedentes ensinam que, em geral, o poder costuma levar de arrastão as resistências do Ministério Público, da Sociedade Civil e do Ambientalismo, o mero fato de prevalecer não acrescenta um iota ao eventual acerto dessa mega-obra. Talvez fosse interessante atentar para o desastroso impacto no meio ambiente das grandes obras chinesas, para que tenhamos ideia dos riscos que o governo Lula deseja impor à região do Xingu.
Especula-se que as tergiversações das empreiteiras possam ser contornadas, com ainda melhores condições de financiamento. Não se exclui a isenção de impostos. Procuram obter mais vantagens, com vistas ao aumento do retorno no empreendimento.
Assinale-se, por fim, que se acha pendente de juízo pelo magistrado federal Campelo de ação que trata das supostas irregularidades apuradas na elaboração do projeto em tela.
O juiz Antonio Carlos Almeida Campelo argumenta a falta de regulamentação do artigo 176 da Constituição, o que torna inválidos o edital do leilão e o contrato de concessão da licença ambiental. Será necessário, por conseguinte, “aguardar-se a expedição de lei regulamentadora do dispositivo constitucional”.
Por sua vez, ‘Nosso Guia’, falando em São Paulo, nos mimoseou com a seguinte crítica aos ambientalistas estrangeiros. Consoante Sua Excelência, eles, os representantes de ONGs, “não precisam ficar dando palpite” nesta questão uma vez que pertencem a países onde áreas verdes estão sendo desmatadas.
Não é o desconforto de ter de ouvir tais contrassensos o que mais incomoda, mas sobretudo o peso de aguentar as consequências materiais da húbris lulesca nos meses que lhe restam no Planalto.

( Fonte: O Globo )

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