Tem sido muito alentador e gratificante o apoio que o juiz Baltasar Garzón, da Audiência Nacional, submetido a processo por suspeita de ‘prevaricação’, vem recebendo em diferentes sedes e lugares, de largas correntes da sociedade espanhola.
Neste fim de semana, dando continuidade à série de manifestações de protesto contra o acosso judicial ao juiz Garzón, realizaram-se em 25 cidades espanholas passeatas não só de apoio ao juiz, mas também de homenagem às vítimas do franquismo.
A esse respeito, a Secretária-Geral do Partido Popular (direita), Maria Dolores de Cospedal chegou a afirmar que as atitudes de apoio e participação em tais manifestações de membros destacados do governo põem em perigo a democracia na Espanha.
Nessa linha do PP, que semelha auxiliar da Falange (extrema direita) Cospedal disse que o Primeiro Ministro José Luiz Rodriguez Zapatero “ao invés de calar-se e estimular essas manifestações, deveria atuar em defesa da divisão dos poderes”.
Em resposta, José Blanco, Ministro do Fomento e Vice-Secretário do PSOE (socialista) afirmou que “nem o PP coloca em perigo a democracia”. Assinalou a respeito os seguidos apoios que o PP tem dado à Falange espanhola.
Por um lado, causaria espécie essa defesa da separação de poderes por parte do PP. Poderia ser interpretada como implicando em abandono pela sociedade civil espanhola de um juiz corajoso, que abriu ações pelos crimes contra a humanidade – e portanto imprescritíveis – do franquismo.
Não obstante, pelo que transpirou de reunião da cúpula socialista no Palácio de Moncloa, o Primeiro Ministro Zapatero se teria expresso em favor da orientação de que a defesa de Baltasar Garzón fique a cargo do PSOE, enquanto o gabinete socialista se abstém, sob o argumento de que não deveria imiscuir-se com questões afetas ao Tribunal Supremo e à Corte Constitucional.
O PSOE teme o que se prefigura como linha de ataque do PP – a exemplo de o que depois se configuraria nas declarações da Secretaria-Geral Maria Dolores de Cospedal – de que se estaria envolvendo o governo em tentativa de pressionar os tribunais.
Por um lado, causaria espécie essa defesa da separação strictu sensu de poderes por parte do Primeiro Ministro Zapatero. O respeito ao poder judiciário não pode ser confundido com orientação de abstenção de qualquer manifestação de apoio à defesa de um juiz que está sendo vítima de acosso por sua investida contra os crimes do franquismo. Poderia ser interpretada como implicando em lavar as mãos diante do abandono pela sociedade civil espanhola de um juiz corajoso, que abriu ações pelos crimes contra a humanidade – e portanto imprescritíveis – do franquismo.
Contribui, outrossim, para a divisão do eleitorado espanhol, ao patrocinar causa defendida por organizações ligadas ao franquismo. Pactuar com a Falange é admitir a presença no arco democrático de organizações que defendem regimes liberticidas, como o franquismo. É oportunismo eleitoreiro que só tende a confundir o povo espanhol. A defesa de Baltasar Garzón – e o repúdio do acosso judicial que se empreende contra ele – deveria ser causa comum da democracia espanhola, perfilhada tanto pela esquerda do PSOE, quanto pela direita do PP. Ambas se fundam no poder do voto e não do arbítrio. Parafraseando um dito famoso, a tentativa de criminalização do juiz Garzón, de parte do PP, mais do que falta grave, é um erro histórico.
Nesse sentido, tem limites o silêncio da maior autoridade civil do governo espanhol para evitar uma potencial suspeição de intromissão em questões afetas a outros poderes estatais. Se as intervenções dos membros do Governo não deveriam ser interpretadas com tal propósito, tampouco seria de esperar-se o mutismo da mais alta hierarquia política. Entregar a questão tão só à esfera do partido, dissocia o governo da defesa desta causa que é também da sociedade democrática espanhola. Configuraria, na verdade, uma timorata sujeição à linha do Partido Popular, que não tem pejo em instrumentalizar a questão tão do gosto da Falange e da extrema direita.
( Fonte: El País )
segunda-feira, 26 de abril de 2010
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