As temidas chuvas do verão carioca desta feita vieram no outono. Por um lado, esta suposta alteração na verdade reflete novo estado de coisas, que é a aparente descaracterização das estações. Vai longe o tempo em que no Rio de Janeiro se distinguiam primavera, verão, outono e inverno.
Com a crise climática, o espaço invernal se transformou em quase ficção, à maneira daquela piada inglesa de antanho. “ - O que achou do verão passado ? - Gostei ! Foi numa quinta-feira...”.
Assim, quando se diz que no Rio há duas estações, o verão e a do calor, não seria simples graçola, mas caricatura da realidade contemporânea. Essa progressão das temperaturas médias volta a tornar a fugida sazonal para as alturas da serra ainda mais atraente, sobretudo nos extremos da calentura estival, em comportamento evocativo do século XIX e princípios do XX. Então, no Império e na República (até mais ou menos os anos cinquenta), a vilegiatura em Petrópolis ou Teresópolis semelhava inelutável, pela inexistência do ar condicionado.
Essa transumância[1] não se cingia apenas às elites, estendendo-se mesmo às parcelas mais bem providas da classe média. Uma casinha na cidade imperial ou em outros cantos da serra não era vista como um luxo. As famílias lá se refugiavam dos excessos da canícula – a par das endemias exacerbadas pelas altas temperaturas ambientes – e os pais enfrentavam o ruço[2], nas sextas-feiras, ao cair da noite nas montanhas.
Mas voltemos ao dia de hoje. Desde ontem, cinco de abril, os alagamentos em diversos pontos da cidade – Praça da Bandeira, Tijuca (rio Maracanã), Estação da Leopoldina, entre outros – inviabilizaram a circulação. Tampouco o metrô do Rio de Janeiro pôde constituir uma crível alternativa. Dada a sua precariedade já em dias normais, compreende-se que nele a situação tenda a agravar-se em momentos de crise nos transportes.
Hoje o Prefeito Eduardo Paes pede à população que fique em casa. O caos nas comunicações viárias, sete mortes em função de deslizamentos de terra, inundações no entorno da baixada, tudo colabora para tornar aceitável a sugestão do prefeito, diante da enxurrada e consequentes transtornos, nos subúrbios, Zonas do Centro e Oeste, Tijuca, Grajaú, etc.
É lamentável que o Estado – a quem compete o metrô – tenha atribuído prioridade tão baixa à expansão deste meio de transporte (V. a gritante e desfavorável comparação com São Paulo). A presença do Presidente da República na inauguração da nova estação (General Osório) e suposta abertura de linha direta para a Baixada veio a posteriori mostrar o engodo da população (e dos usuários), com o incrível descalabro das condições efetivas dos vagões (velhos e com ar condicionado deficiente) e da alegada nova linha, dada a precariedade da ligação.
Enquanto São Paulo se apresta a ganhar dez estações e 16 km de via, cabem ao Rio olímpico ridículos oitocentos metros e uma estação que, ao invés de melhorar a situação, determina deterioração evidente, criada pelo desengano com as expectativas, e a estrutura inadequada.
Não há decerto de espantar que em situações como a presente, o metrô não há de constituir solução – como o seria em outras metrópoles – mas apenas um dado adicional lamentável a patentear a gravidade na crise estrutural do sistema de transporte de massa na antes mui leal e heróica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.
[1] migração sazonal.
[2] cerrada bruma nas montanhas
terça-feira, 6 de abril de 2010
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