O dia 20 de abril marca o aniversário de nascimento do patrono da diplomacia brasileira, José Maria da Silva Paranhos Júnior, o futuro Barão do Rio Branco. Semelha apropriado, portanto, que esta efeméride seja dedicada ao Dia do Diplomata. Nessa data, é tradição organizar-se cerimônia no Palácio do Itamaraty em Brasília, com distribuição de condecorações da Ordem de Rio Branco, formatura dos novos diplomatas, banquete e discurso presidencial sobre a política externa.
Não terá sido por acaso que o Financial Times, de Londres, escolheu o dia de ontem para estampar artigo sobre a política exterior brasileira. Desde muito, como se sabe, o Itamaraty persegue assento permanente no Conselho de Segurança. Nesse sentido, houve um aumento exponencial no número de nossas missões diplomáticas, que, por óbvios motivos, se dirigiram para áreas antes não abrangidas pelas embaixadas brasileiras.
Tal esforço corresponde ao propósito de incrementar a nossa eventual votação na Assembleia Geral, junto a qual estão representados todos esses países, em geral micro-estados na Oceânia, a par de estados menores em África, Caribe e Ásia. Se bem que muitos desses países-membros das Nações Unidas deleguem aos respectivos representantes em New York (sede das Nações Unidas) o poder de decidir sobre os eventuais votos na Assembleia Geral, não se negará que tal presença nas capitais poderá trazer maior simpatia à postulação do Brasil.
Acresce notar, igualmente, que essa empresa implica em considerável dispêndio pelo Itamaraty, não obstante a lotação desses postos se cinja a um chefe de missão, sem qualquer outro diplomata, e um outro funcionário administrativo de carreira. Os demais serão pessoal contratado localmente.
Para a eventual aprovação do assento permanente intervém igualmente o Conselho de Segurança, onde a influência principal é exercido pelos chamados membros permanentes – Estados Unidos, Reino Unido, França, Federação Russa e República Popular da China. A chamada reforma do Conselho de Segurança, com a expansão dos membros permanentes, tem sido um processo longo, dada a ambivalência dos atuais titulares, as diversas candidaturas com maiores possibilidades (Brasil, Alemanha, Japão e Índia) e a oposição ferrenha daqueles países que sabem não terem condições de aspirar à cadeira permanente, mas tampouco desejam que seus rivais geográficos as ocupem (Argentina, México, Itália e Paquistão). Há também resistências de membros permanentes contra a entrada de novos, como, v.g., a atitude da China em relação a Japão e Índia.
Por outro lado, não é segredo que países como França e Reino Unido, considerados grandes potências quando da criação das Nações Unidas em 1945, hoje dificilmente teriam a mesma posição. Nesse contexto, pareceria mais lógico que o assento permanente coubesse a representante da União Europeia.
Por isso, a campanha do Brasil, que não data da administração Lula, enfrenta muitos óbices, dadas as dificuldades de reforma ampla das Nações Unidas – com o complicador do direito de veto aos permanentes – e as interrogações políticas dos atuais favorecidos quanto a uma nova situação e sua respectiva manejabilidade político-diplomática.
Pensando facilitar-lhe a postulação, o Brasil na atual administração se mostrou disposto a renunciar de forma qualificada ao privilégio do exercício do veto. Surgiria, assim, no Conselho de Segurança ampliado, os cinco permanentes com direito de veto, os outros permanentes sem esse direito, e os temporários, que se revezam em mandatos bienais.
Por isso, soa um tanta requentada a advertência do Financial Times no que tange ao efeito negativo de certas alegadas gafes da diplomacia presidencial brasileira sobre a já provecta candidatura nacional a uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
A diplomacia do Brasil até o governo Lula se identificava com o Itamaraty, ou seja, a sede de nosso ministério das Relações Exteriores. Não é que o Presidente – como, v.g., Fernando Henrique Cardoso – não tivesse interesses e conhecimento nessa área, mas se atribuía a quem estivesse, de turno, na cadeira do Barão, e às instâncias profissionais do Itamaraty a direção e a formulação de nossa política externa.
Com o homo novus à frente do Governo brasileiro, a gestão diplomática, para empregar um termo hoje corriqueiro, se tornou mais complicada, com a alocação de áreas determinadas à decisão de instâncias não-itamaratianas. Outros critérios, além da diplomacia de Estado, passaram a ter importância para o governo petista, e os novos ingredientes nem sempre produzem os resultados colimados pelos gestores suplementares, com o seu eventual menosprezo pela experiência e coerência da política anterior.
O colunista do Financial Times pinçou para o seu comentário alusivo atitudes digamos ‘pouco felizes’ do Presidente Lula da Silva, na crítica a um corajoso dissidente da ditadura cubana, como Orlando Zapata (que não trepidou em pagar com a vida o respectivo protesto), e ao apoio tão inoportuno quão despropositado à tirania dos ayatollahs, não se pejando de utilizar uma de suas rasteiras metáforas futebolísticas para denominar as manifestações da juventude em Teerã – de resto, cruelmente reprimidas – como se fossem “choro de perdedores”.
Da minha longa experiência diplomática, colhi a certeza de que política externa não é a questão simples que pode parecer a pessoas menos versadas. É tema complexo que não deveria ser confiado àqueles que dele não têm maior conhecimento. Ser festejado em recepções não é um equivalente aceitável para ser catapultado, como se por um deus ex machina, em abalizado conhecedor da cultura político-diplomática.
( Fonte: O Globo )
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário