Que
me perdoe o leitor se coloco o título deste blog
em inglês. O motivo é simples: um break-down nervoso não é coisa de
somenos, e é difícil que ocorra em
alguém tão clinicamente protegido quanto um presidente americano. Mas pelo seu
temperamento, a manifesta dificuldade que tem em controlá-lo, e, máxime, pelo
vezo que tem de inventar problemas, mesmo quando eles não existem ou se acham
em situação em que outros políticos teriam
condições de dominá-los, mais passe o
tempo, mais contemple a front-page
dos jornais americanos, a sensação que tenho é que Trump, ou não está em
condições de lidar com os problemas do cargo, eis que, de uma maneira ou de outra, logrou na sua costumeira
forma impetuosa de arrebatá-los para si,
ou o 45º presidente procura essa chusma de magnos problemas, numa forma de
vedetismo - como se a cena presidencial já não fosse um espaço prenhe de
questões anosos e conflituosas, assim como de problemas que exigem um espaço
prudencial para resolvê-los.
A
par disso, se o chefe da Nação bem faria em não exacerbá-los, buscando sempre
que possível mante-los em espécie de banho-maria, o que fazer se a sua atitude
é justamente a contrária?
Senão, vejamos à guisa de tomada
cinematográfica - como se fosse
panorâmica em que o diretor tentasse transmitir a ideia de que, através de variegados
malabarismos, Sua Excelência
desenvolvera a agressiva técnica de conviver e controlar à distância essa
chusma de desafios de diferentes potências, sejam elas externas ou internas,
passadas ou presentes.
No começo, está o muro, como símbolo de uma visão tão pretextuosa quanto
instrumental das relações com o México e, por conseguinte, com um país que já
tanto sofreu com o colosso americano e as suas invasões de conquista
territorial. É preciso mais do que arrogância para transformar a imagem do
invasor mexicano na deformada visão de um estuprador de mulheres americanas,
que a plus fort raison[2]
se impõe controlar, barrando-lhe o caminho de América del Norte. A razão
apresentada é decerto absurda, prepóstera mesmo, mas com todo o alarido da
imprensa, em que o original, mesmo se aético muita vez comanda, quer queiram
quer não,captou boa porção de ouvintes republicanos, e tornou a caminhada
política das primárias do GOP um
passeio para Trump.
Na tentativa de entender melhor o personagem Trump, não se pode perder
nunca de vista essa estranha figura de manipulador da mídia, que se delicia em
afrontá-la, sem talvez o desejo de restabelecer a verdade, mas com escopo
quiçá ainda mais ambicioso, transformá-la, quem sabe domesticá-la, de forma a
apresentá-la não pelo que é no suposto
catecismo trumpiano. Não é uma
assertiva despropositada dizer que Trump é a essência do anti-intelectual, do
político multifacético que quer parecer muitas coisas ao mesmo tempo. Nesse
sentido, como já o demonstrara antes da pré-eleição, Trump é um personagem de
faz-de-conta, mas sem nenhuma tendência romântica. Faz de conta - não é o que disse, mas o desejava
fazer, ao buscar destruir um herói americano como John Mc Cain, enquanto intentou retirar-lhe a base do respeito
popular, ao buscar diminuir este herói
americano justamente por sua condição de herói-prisioneiro na guerra do
Vietnam. Esta tendência de atacar o inatacável já se vê na sua exposição de uma alegada teoria do birtherism, uma ideia de projetar-se à custa de Barack Obama - que não teria nascido nos
Estados Unidos e sim no Quênia...
Daí a periculosidade de Donald Trump, que
os seus adversários e mesmo Hillary tentaram ignorar, mas com substancial risco
pessoal. Ele cunhou ou se serviu da expressão Crooked Hillary, na verdade uma
calúnia mal disfarçada, inspirada talvez na frase de Beaumarchais, calomniez,
il en reste toujours quelque chose![3]
Talvez
o histrionismo de Trump lhe tenha valido para amealhar votos. Sendo a disputa
eleitoral com Hillary bastante renhida, infelizmente seria determinante o
estranhíssimo comunicado de um James
Comey desgarrado, em uma Secretaria de Justiça na prática sem Secretário, o que lhe abriu o
caminho para a capciosa mensagem para o período da chamada votação antecipada:
de que se descobrira um outro computador na entourage
de Hillary - o do marido afastado de Huma
Abedin, a secretária da candidata - "aviso" que veio junto de que
poderia levantar novas lebres em uma campanha, em que a democrata tinha curta
vantagem.
Mas deixemos essa página pouco feliz da história política americana, e
voltemos para o tema que nos interessa precipuamente. Nas últimas semanas,
quem sabe, exacerbado pelas tensões de que sofrem os presidentes, Trump tem
recorrido a uma estranha, estranhíssima mesmo, estratégia. O 45º presidente afronta aos problemas
políticos de sua presidência, ao invés de intentar resolvê-los. Assim, como se
fosse um novo Houdini, ele prefere
manipular os problemas que tentar resolvê-los. Talvez se possa dizer que o
cerne da questão esteja aí, mas como se verá adiante, Trump exagera...
Na verdade, Trump vem adotando uma estratégia perigosa. Se se pode
individuar algo na mente conturbada desse ocupante da Casa Branca, ele adota
uma teoria do caos um pouco arrevesada. De problemas, quanto presentes e
intrusivos melhor.
É bom não esquecer que continua muito atuante para sua inquietação o Conselheiro
Especial Robert Mueller III, que, ao que consta, continua levantando questões
delicadas para o presidente. O que ele fará das declarações do advogado
particular de Trump, Michael Cohen, nas quais mentira para o Congresso
americano?
O problema com Trump vai muito além do perjúrio de Cohen,mas também na
circunstância de que o causídico tratara de escamotear encontros de Trump com
duas call-girls. O que é grave aí não
seria o fato em si - a ocultação não do fato em si, mas sim a mentira para o
Congresso.
Pelo seu comportamento, de certa forma, Trump desvaloriza o escândalo,
embora o acúmulo deles configure já um belo caso para inquietar qualquer
mortal.
Sem embargo, o voluntarismo desse presidente não é avaro em criar ulteriores
problemas. Entre esses, estão as questões
do muro, e a derivada do fechamento de funções estatais.
A construção do muro é uma
exigência perene para Trump, o que lhe
provoca desgaste crescente, pela série de consequências derivadas deste sine qua non para o presidente. O dito fechamento do Estado implica na
clausura de atividades que são úteis para o coletivo de pessoas. Como a
clausura implica em não-utilização, e as consequentes dificuldades que dela
decorrem para os habitantes de Washington, atendido ainda o caráter impopular
da injunção com as dificuldades que acarreta, não é de estranhar que a
exasperação aumente.
Outro erro pesado do
presidente foi a determinação do fim da participação americana em dois
conflitos: o da Síria (que é largada à
própria sorte e a Putin), assim como a
guerra contra o E.I. (exército
islâmico), sob o frágil pretexto de que a ameaça desse movimento terrorista já
esteja controlada. O consenso no Pentágono é que esta desastrada medida de Trump
dará nova vida ao movimento do califa al-Bagdaadi, que, de resto, não se
acharia longe da própria extirpação. Daí, as desculpas de Trump irritaram
sobremaneira o general Mattis, que, pelo bom senso e equilíbrio, vinha
assegurando um papel muito eficaz aos Estados Unidos, com ajuda dos bravos
guerreiros curdos, cujo abandono
poderia causar mais uma derrota para um futuro Curdistão, o que constituiria válida
posição de segurança para uma comunidade que é apoio do Ocidente, contra as
perenes incursões do turco Erdogan.
A maneira abrupta adotada
por Trump sem qualquer consulta com o Secretário Mattis,com experiência e
grande prestígio no estamento militar - e que estava sendo fator de estabilidade
diante do errático presidente - afastou a influência do Secretário - e dele
qualquer veleidade que poderia manter com esse presidente qualquer sistemazione apropriada, no esquema
militar. O próprio Trump abriria - igualmente sem preparação - as suas supostas
"reformas" nos compromissos militares da Superpotência, com um
desastroso ensaio de mudança tanto no Afeganistão, quanto na Síria e no
Mediterrâneo.
(Fontes: The New York Times, Pierre-Augustin Caron de Beaumarchais)
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