terça-feira, 25 de dezembro de 2018

A Hora de Paulo Hartung


                                  
        Desde muito, acompanho com atenção a carreira pública como político e notadamente enquanto Governador do Espírito Santo, de Paulo Hartung, que se encontra no fim de seu terceiro mandato como chefe do Executivo daquele pequeno Estado.

           Em uma terra que vem primando nos últimos tempos pelo desrespeito da Lei de Responsabilidade Fiscal - talvez o principal dom do governo de Fernando Henrique Cardoso à República - Hartung tem primado pelo respeito inflexível à LRF. Para que se contextualize - na pobreza circunstante - o valor singular da atuação de Hartung como Governador, bastaria ter presente o último e lamentável desrespeito da atual cultura política, que o recente gesto do presidente da Câmara,  Rodrigo Maia, desfigurando sem qualquer veto a publicação de lei para as finanças municipais, acolhendo um lamentável facilitômetro para a legislação de que o presidente Temer, ausente em compromisso externo, anunciara a intenção do respectivo veto.

             Tenho acompanhado a trajetória como Governador do Espírito Santo de Paulo Hartung por motivos sobejos, que o texto a seguir torna manifestos. Pois no fim de seu terceiro mandato como governador, Hartung lançou recentemente livro sobre sua experiência na gestão da crise no governo capixaba - o único Estado a ser avaliado com a nota máxima no equilíbrio fiscal pela Secretaria do Tesouro Nacional em 2018.
             A seguir, ocupo-me da entrevista do Governador Hartung. Quero crer,  no entanto, que o mais importante é cingir-se a certos aspectos fundamentais, e, dessarte, acentuar o que realmente me parece básico no pensamento de Hartung e que deveria, por consequência, ser enfatizado e aprofundado.

             Hartung se refere à lei de responsabilidade fiscal e a conversas com novos governadores.  Ele tem estimulado  que eles abram um diálogo com o STF, no sentido de julgar uma ação no Supremo que trata de um dispositivo da LRF. O primeiro aspecto é muito importante: o orçamento público é uma estimativa de receita e uma fixação de despesa. Se você estima uma receita e depois  tem um frustração de receita, essa frustração só vale para o Executivo, mas não vale para o Judiciário, para a Assembléia, e tampouco para o Ministério Público, para o Tribunal de Contas, e também não vale para a Defensoria Pública. Nós precisamos resolver esse dispositivo que está judicializado. A Lei de Responsabilidade Fiscal permite que você diminua a jornada de trabalho e salário no momento em que você estoura o limite da LRF. Isso está judicializado. Era importante e pedagógico, no momento em que um dispositivo desses funcionar, eu tenho certeza de que até os sindicatos que representam os grupos funcionais vão se preocupar com o limite de gasto público.

                É preciso mudar a LRF?  Com esse clima bagunçado que está no Brasil, toda vez que se mexe na LRF é para piorar, como o Congresso fez em relação aos gastos dos municípios. Então, o melhor é não mexer na LRF. Esse instrumento é bom, porque o único jeito de você devolver para a sociedade uma parte dos impostos que são pagos. Precisamos cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. A única coisa em que eu trabalharia é em relação a essa ação que está no Supremo.

                 O que esperar do governo Bolsonaro ?   Acho que o nosso primeiro dever é soltar esse cabo de guerra e o País voltar a ter capacidade de discutir os seus problemas. Quero ressaltar que o governo Bolsonaro toma posse com muito capital político da eleição, que não é pequeno. Não foi baixa a votação do PT, mas a margem de diferença de votos foi significativa, deu uma legitimidade. Trazer o Moro para o Ministério da Justiça agregou mais capital político.  Então, o governo toma posse com muito capital político na sociedade, no Parlamento. Evidente que é uma lua de mel que tem prazo. O problema é não perder tempo e a impressão que eu tenho, eu sinto que o governo tem dois governos dentro dele. Um que está pensando de maneira mais reformista e um pensa de maneira mais corporativa.

                   Tivemos recentemente a Cúpula Conservadora das Américas. É um assunto primordial no Brasil? O Foro de São Paulo precisa de um contraponto?                          
              Não. O Presidente Fernando Henrique, em uma entrevista que concedeu recentemente, coloca alguma coisa  de que isso é uma falsa questão. Nós não estamos na discussão de comunistas versus anticomunistas, não é isso que está sendo debatido no País. Isso beira uma certa fantasia. O que nós temos de fortalecer são as instituições democráticas do País.

                   Como é que o centro político do País deve se organizar, após uma eleição na qual se fragmentou e sofreu uma derrota significativa? 
                   Primeiro fazer uma autocrítica bem-feita. Se nós perdemos relevância na política nacional - e eu estou me colocando junto - seguramente, isso não vem por acertos, vem por erros. Segundo, eu acho que o nosso papel nesse momento é debater, apresentar boas propostas para o país. A terceira coisa é a gente ter paciência e não ser precipitado. Tem um quadro que vai decantar agora naturalmente. Qualquer movimento agora é um movimento fora de hora. Todo movimento que a gente puder  ajudar, seja o Renova, o Agora!, o Livres, para produzir novas lideranças, que tenham capacidade de pensar o País. É visível o vazio de lideranças que se formou no País nesses últimos tempos.  Tem muito tempo que não se injeta sangue no Congresso e agora tem.  Quando chegar eleições municipais precisamos ter mais gente nova e qualificada disputando prefeituras, disputando Câmaras municipais e perder esse preconceito.

                  O empresário Luciano Huck já é um desses líderes?  
                   Fizemos uma mesa aqui recente, eu, ele (Luciano Huck) e o Edu (Eduardo Mufarej, empresário) discutindo formação de lideranças, foi um belo debate. Eu acho que o Luciano quando ele decidiu não ser candidato ele simultaneamente decidiu continuar ajudando na formação de lideranças, foi uma atitude bacana. Acabou a eleição ele deu uma entrevista dizendo: 'Olha, estou dentro, vou continuar participando'. Ele está mantendo a vida profissional dele com sucesso e ao mesmo tempo dando uma contribuição nesse campo de formação de lideranças.

                   E o PSDB?  Qual vai ser o papel do PSDB? O ex-presidente Fernando Henrique admitiu até deixar o partido se a legenda tomar uma posição de apoio irrestrito ao governo Bolsonaro. Como será a participação do PSDB na formação desse novo centro?
                    Eu sou um social-democrata que aprendeu com a vida as limitações de meios. Acho que você operar na política brasileira sem olhar a desigualdade social, esquece, né? Estou fazendo isso para chegar dentro do PSDB. Por que eu acho que tem que ter calma e não ter precipitação? As coisas precisam decantar. Fui fundador do PSDB.  Eu tenho muitos amigos dentro do PSDB e tenho que ser  cauteloso em relação a isso. Seguramente, quando eu falo no campo reformista do País - da centro-esquerda até os liberais reformistas da economia - essa turma está dentro disso. Não adianta precipitar. É passo a passo, vamos ver o que mais à frente a gente faz em termos de diálogo nesse campo.

                    Mas esse movimento não terá de convergir em um partido ?
                     Bem provável. Mas não está na hora de mexer com o partido. Eu estou muito cauteloso com as palavras até aqui, me perdoe. Mexer com o partido agora é gastar energia boa com uma ação que não é uma ação construtiva no momento. Também não quero fugir de nenhuma resposta. Acho que esse momento vai chegar e na hora que chegar a gente discute essa questão de uma maneira muito aberta e transparente. Mas não é hora para isso. A hora nossa é de formar novas lideranças, é de apresentar boas políticas públicas, boas propostas para esse momento que o País está vivendo, de ajudar para distensionar o País, para diminuir a intolerância, a intransigência, essa coisa raivosa e às vezes até odienta que a gente tem percebido nas redes e infelizmente também nas ruas. Acho que temos uma agenda boa para trabalhar nesses primeiros tempos de 2019. Vou cumprir uma missão profissional na vida privada, mas vou estar também dedicado em ajudar numa ação de boa política, de política de qualidade.

( Fonte: O Estado de S. Paulo )

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