Transcrevo,
por oportuna, a totalidade da entrevista concedida pelo Ministro Edson Fachin, de
certo uma das grandes presenças no atual STF.
O
sr.acha que será lembrado como o relator da Lava-Jato?
O tribunal é, seguramente, muito maior do que a
Operação Lava Jato.No meu gabinete, ela responde por 20%, 25% dos casos. A Lava Jato deve ter
início, meio e fim. O tribunal vai realizar sua função. E eu, sem nenhuma
falsa modéstia, acho que estamos cumprindo a função de fazer aquilo que deve
ser feito. O que espero, do ponto de vista de legado para quando eu sair, é
que tenha contribuído para o Supremo se tornar uma corte constitucional.
O
sr.defende menos processos criminais e mais constitucionais no Supremo?
É preciso discutir se um ministro do Supremo deve
dedicar-se a debater prioritariamente as questões de índole constitucional ou
se somos e continuaremos a ser a quarta instância revisora de quase todos os
procedimentos criminais que se iniciam no Brasil. Os demais tribunais - os
regionais, os de Justiça e o STJ - são cortes ou tribunais de passagem para
chegar ao Supremo? Ou há que se fixar um limite dizendo que nessas matérias a
última palavra, por exemplo, é do Superior Tribunal de Justiça?
Há
críticas de lentidão na análise de processos no STF, O que o senhor propõe para
dar agilidade?
É preciso abrir espaço para o regime interno prever
possibilidades de ajustes e adaptações tecnológicas. Alguns aspectos precisam
ser discutidos nessa seara, como a publicação dos acórdãos, uma sistematização dos pedidos de vista.
E também alterações de médio prazo na legislação infraconstitucional. Um
exemplo controvertido - já que alguns ministros têm posição no sentido
contrário - é a denúncia no Supremo, dependendo do investigado ou do
denunciado, ser apreciada pela Turma ou pelo pleno (com os 11 ministros).
Isso significa que o relator não tem poderes para deliberar pelo recebimento da
denúncia.
O senhor propõe que o relator de um caso julgue
o recebimento da denúncia sozinho?
Esse é um debate de alteração legislativa, porque a
legislação federal prevê esse recebi- mento do colegiado. Mas qualquer juiz
federal no Brasil em qualquer comarca pode, monocraticamente, receber uma
denúncia. Ministro do Supremo não pode. Na ideia segundo a qual não há
autoridade com maior ou menor privilégio, todos se submetem ao mesmo patamar. É
natural que algumas autoridades continuem tendo julgamento cole- giado, como o
Presidente da República.
Qual
seria o efeito dessa modificação na legislação federal?
Entendo que hoje há uma solenização excessiva. E
isso não atende nem ao interesse da defesa, nem a dos investigados ou acusados.
Nós quase apreciamos três vezes a conduta: ao abrir o inquérito, ao apreciar a
denúncia e, se for recebida, ao julgar a ação penal. A rigor, quando há uma imputação
tem de se proceder, se for o caso, e o Ministério Público pediu, a
investigação no inquérito, na verdade a coleta de informações no inquérito.
Se houver indício de materialidade e autoria, o MP oferece a denúncia, o juiz
dirá se esses indícios estão presentes ou não, faz a instrução penal para que
com a maior brevidade possível não fique assim uma espécie de espada de
Dâmocles no pescoço, inclusive do réu.
É direito de todos. Então, não estou dizendo apenas que isso é
importante para o juízo de acusação. É importante para a defesa, afinal, os
condenados serão condena- dos porque a culpa restou provada, e os que não
restarem a culpa num prazo razoável, célere, terão a sua absolvição. É disso
que se trata, "dessolenizar" esses três momentos para que tenhamos
mais julgamentos definitivos.
O
sr. propõe mais alterações ?
Cheguei a redigir um anteprojeto mudando o regime
jurídico da prescrição criminal. Apesar de ser um dever constitucional, a ampla
defesa e o devido processo legal, a forma como está no Código Penal e no Código
de Processo Penal o regime jurídico da
prescrição é uma porta aberta à impunidade. (meu o grifo)
O
futuro ministro da Justiça e ex-juiz, Sérgio Moro, também quer propor mudanças
em leis. Como ele, o sr. pretende apresentar um pacote?
São essas duas ideias, uma já feita e outras a fazer, que eu vou trabalhar pontualmente. Não há
pacote, não tenho pretensão de fazer algo nesse sentido, até porque isso não
compete a mim como magistrado. Compete a mim, como juiz de uma corte
constitucional, dar sugestões a partir dos problemas concretos que temos aqui.
A
chegada de Jair Bolsonaro à Presidência e de Moro à Justiça, ambos com discurso
contra o crime e de combate à corrupção, favorece alterações legislativas?
Proponho alterações de natureza estrutural. Está na Constituição o prazo
razoável da duração de processo. Governos têm projetos conjunturais. Se houver
evidentemente um ambiente que acolha essa ordem de ideias, tanto melhor, mas eu
não me refiro a este ou aquele momento. Essas são mudanças de médio prazo.
O
pedido de rescisão do acordo de executivos da J&F põe em risco o futuro das
delações no País ?
São 110 colaborações que já passaram por mim. Só
quatro estão sendo questionadas.
Mas
nas quatro houve pedido de anulação de provas pelas defesas do presidente
Michel Temer e do senador Aécio Neves.
O questionamento que estou observando diz respeito à
rescisão total ou parcial da colaboração. Em nenhum momento que pediu a
rescisão o Ministério Público tocou na questão das provas. Pelo contrário, o MP
diz que, independentemente do resultado, con- sidera que as provas são válidas.
Em
julgamento no ano passado sobre a delação, alguns ministros do STF falaram so-bre
a possível anulação de provas.
Existe uma coisa que os julgadores dizem nos
colegiados, que é o obiter dictum, ou
seja, opiniões manifestadas no curso do
julgamento, mas que não há sobre isso nenhum juízo de valor. Nas rescisões que
estão comigo, não há menção do autor, MP, qualquer alegação de ilegalidade das
provas. Vamos discutir o que foi pedido.
O
que o julgamento significa para o futuro das delações?
Esse será um momento importante para estabelecer os
limites e possibilidades das cola- borações. Não vejo nenhuma possibilidade de
ser colocado em risco o instituto da cola- boração premiada. É uma das inovações legislativas mais
importantes que o Brasil teve nos últimos tempos.[1]
Se há algum tipo de excesso, alguma circunstância, a jurisprudên-cia
certamente colocará limite nisso. (fim da citação do Estado de S. Paulo)
(Fonte
que transcrevo, grato e penhorado, bacharel que sou pela antiga Faculdade
Nacional de Direito do Rio de Janeiro.)
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