A
minha última embaixada foi em Atenas, com que pude satisfazer um velho desejo
meu de terminar a carreira na Grécia, que sempre apreciamos, tanto para
conhecer melhor os monumentos da civilização helênica, quanto pela simpatia que
dedicávamos a esse país.
E a nossa estada nessa magnífica
cidade, tanto pelas oportunidades que tivemos de conhecê-la melhor, assim como
pelos sítios célebres do mundo grego que tanta influência produz sobre a
Humanidade, terá sido uma dádiva da Providência para que aí encerrasse a
carreira.
Mas
o escopo dessa dissertação pode ser visto como a benesse suplementar que pude colher na minha derradeira
destinação diplomática.
Chegamos a uma Grécia que, por série de circunstâncias, vivia, sem
sabê-lo ou então já o suspeitando, entrevistos os sinais de uma crise no
superaquecimento da economia, e em manter existência que principiava a configurar-se como acima das potencialidades
reais das respectivas condições materiais
da própria situação econômica-financeira.
Por
atrás da aparente opulência, e dos preços dos alugueres residenciais, a
Grécia de então vivia no sobreaquecimento da economia, mantido pelo recurso desmedido ao crédito, que
transmitia aos observadores duas impressões distintas: a par da grande
disponibilidade de bens de consumo, muitos dos participantes tinham atuação
econômica que mais se baseava no crédito do que em recursos próprios. E não era
só o consumi-dor helênico que se valia de tal expediente.
Grandes e pequenos empresários recorriam ao crédito, valendo-se da então
liberalidade bancária. O artificialismo era patente, e qualquer um com algum
conhecimento no ramo poderia sentir que o momento inelutável da quebra, ou das dificuldades,
não poderia tardar demasiado. As grandes
crises na economia... começam nas finanças. Desde o século XVIII, na regência
dos Orléans na França, se nos depara o fenômeno do endividamento excessivo,
acicatado pela velha esperança do enriquecimento fácil, em que a banca costuma
ser devorada por sanhudas inversões, grandes expectativas e pequenos lucros, ao
invés das prelibadas riquezas.
Então, sem o saber por inteiro,
se vivía nas incertezas de um prelúdio, cuja artificialidade crescia à volta do
mercado, sem que a maior parte dos agentes sentisse ou sequer suspeitasse da
condição do chão em que pisavam, mais ocupados, ao parecer, em dedicar-se à volúpia de atividade que
semelhava o decifrado enigma da prosperidade, que já imaginavam muito cerca,
dentro daquele cruel jogo de uma estranha roleta que parece apenas somar, nunca reduzir, e que dizer então
da louca euforia que a tais fenômenos acompanha e que prenuncia o que irá
ocorrer a todos aqueles a que consome a insana ambição, sem que sequer se dêem
conta das ominosas letras na parede da festa de Baltasar.
Quando parti, o festim mal
começara, embora já se entrevissem os primeiros sinais de uma ilusão que os
muitos só percebem quando os dados já foram lançados.
Então o exercício é demasiado fácil, pois o descobríamos a cada esquina,
diante das lojas e negócios fechados, e das longas fisionomias dos
comerciantes de antes, muita vez com moscas
como seus únicos fregueses.
Uma coisa é enfronhar-se nas páginas do noticiário estrangeiro das
falências de um país que conhecemos de perto; bem outra, é revisitar as faces
tristonhas de comerciantes antes efusivos, e só poder esboçar um meio-sorriso para as vendedoras com a expressão vincada
pela quase certeza da dispensa no fim do mês.
Tais desgraças sóem ser produto da hubris
de uns poucos, mas como dizem os locais, serão oi polloi (os muitos) que costumam pagar o preço.
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