Todos os dias
aparecem nos jornais
notícias já em
canto de página.
Nesses tempos
difíceis, descorçoados,
em que anomia,
cinismo e injustiça
erguem as
horrendas, desgrenhadas,
repulsivas
cabeçorras,
recai até sobre
estúpidas, subitâneas
mortes o ignóbil
tratamento
de uma
banalizada rotina.
Abatida a estudante,
o jovem, a
criança e o operário,
rumo à escola ou
trabalho,
seja na rua,
esperando condução,
seja em ônibus,
van e carro,
seja ainda
dormindo,
no que antes
seria o sossego
do próprio
anônimo quarto.
Dizem que
ninguém está livre
de sorte tão
triste e madrasta,
embora os riscos
sejam maiores
nas zonas
conflagradas
por pobreza,
anarquia e tráfico.
No país da ordem
e do progresso
a corrupção se pavoneia
triunfante
dos palácios dos
poderosos
aos fétidos
pátios de milagres.
São balas
perdidas
apregoam
imprensa, radio e tevê.
Frases cunhadas
em dias mais tranquilos
fulminam o
insondável capricho das Parcas
a ceifar
inocentes com gratuita crueldade.
Repetindo tais
expressões
acaso
transferimos para prosaica fatalidade
a autoria de
tantos crimes
supostamente sem
causa e sem agente?
Quem aperta o
gatilho de armas
tão ativas,
diversas e profusas,
nessas jornadas
tintas de angústia,
medo e incerteza
?
Para expor ao
exame das testemunhas,
sob as
ofuscantes luzes policiais,
que suspeitos
devemos alinhar?
Será acaso a
pobreza,
mãe da revolta e
do desespero ?
Será a loteria
do nascimento,
favorecendo a
uns poucos em dourados berços,
negligenciando muitos nos grotões do olvido,
e tantos
despejando na miséria das ruas ?
Mas quem, meu
Deus, engenha tal pobreza,
e quem se
compraz em fazer girar
a aleatória roda
da fortuna?
Serão porventura
anos, décadas de desgoverno,
a serviço de
dúbias ideologias,
de injunções
estrangeiras,
e de privadas,
inconfessáveis ambições ?
A máquina do
Estado, imensa, pesada burocracia
serve aos
quarenta ministros de Ali Baba e a si própria,
e não ao
interesse maior do Povo,
em nome de quem
são feitas as leis,
e se engordam os
bancos e o grupo dominante.
Na sombria,
espúria aliança
de
corporativismo, corrupção e incompetência
se manipula a
esperança do bom governo,
enquanto se
lança sobre os ombros da Nação
o jugo
insaciável e odioso do tributo
de que o cidadão
não colhe a equa contrapartida.
São promessas e
palavras vãs,
que ouvimos às
vésperas dos comícios,
cada vez menos
críveis,
cada vez mais
escarnecedoras
da realidade do
dia-a-dia.
Desse monstro
que devora inocentes,
desta estranha
entidade composta
por falsos,
iníquos compromissos
e solerte
desrespeito do bem público
surge o
indiciado maior,
ídolo ávido de
sangue e humano sacrifício.
Pois em verdade,
mentem os arautos modernos -
as balas não são
perdidas,
são balas
certeiras,
deflagradas por
muitas e nefandas mãos.
Ao malbaratar os
recursos gerados pela faina do Povo,
ao privilegiar o
interesse de poucos ao invés dos muitos,
ao engordar a
alta burguesia e seus cães de guarda,
ao sangrar operário anônimo pela opulenta Finança,
e na diuturna
orgia do superávit primário
menoscabar o
direito à educação, saúde e segurança,
entre miopia,
desídia, incompetência e corrupção,
se obra com
nefasta pertinácia,
para engrossar
as hostes do mal,
cevar as hordas
odientas e subalternas,
de sequazes,
parasitas e clientes,
enquanto a massa
amorfa dos que crêem na justiça
se debate na
incerteza, no pessimismo,
e na ignorância
da própria força.
São horas
difíceis, graves, dolorosas.
Será à toa o
sacrifício da maioria,
e infindas as
hipócritas promessas ?
Tudo se há de
resumir a baldados protestos,
inúteis,
patéticas, desarmadas passeatas
contra a
arrogância do poder,
e no execrável
endeusamento da malversão,
do privilégio e
da corrupção,
sob o sórdido
manto da impunidade acobertados ?
Por quanto tempo
ainda espoucarão
as balas
assassinas
sob o compasso
de ordem iníqua ?
Por quanto tempo
permanecerá
silente e resignada
a massa
laboriosa e sofredora
enquanto as
potestades que dizem representá-la
se aferram ao
atual descalabro,
a que erigem em
sistema de governança ?
Que não se
iludam os sôfregos, os cínicos e os tolos,
por que tem
limites a paciência e a pacífica índole
de uma grande,
espezinhada Nação.
Esboçado em Porto Alegre, a 5 de maio de 2007
e completado no Rio, a 26 de agosto de
2008.
Nenhum comentário:
Postar um comentário