Faz
dias procuro na imprensa registro sobre a reação extrema do Reitor da
Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz
Carlos Cancellier de Olivo, aproximando-se a data de dois de outubro, que
marca o gesto sem volta de lançar-se naquela data do sétimo andar de um shopping de Florianópolis.
A Folha de S. Paulo não me falha na expectativa. Aí deparo entrevista de Acioli Antônio de Olivo a
Walter Nunes. Pesquisador aposentado do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais),
ele deixa sua casa em São José dos Campos para passar uns dias com o irmão em
Florianópolis.
Na verdade, não são dias quaisquer. Luiz Carlos Cancellier apresenta sinais
de depressão, e tal se verifica desde a prisão por um dia na Ouvidos Moucos. Nesta operação, a
Polícia Federal diz desmantelar esquema milionário de desvios de verbas de
educação.
Embora não o soubesse, Acioli seria a companhia do irmão nos seus últimos dias.
Pois, a dois de outubro, em desespero, Cancellier se joga para a morte. Leva no
bolso a mensagem derra-deira, em que
culpa a operação policial.
A propósito, assim se manifesta o irmão Acioli Antonio: "Minha
opinião de leigo é que quem matou meu irmão foi a falsa acusação de ter desviado R$ 80 milhões. O resto tudo ele poderia
suportar." E completa: "Se ele fosse inocentado juridicamente, nunca
seria inocentado de uma mácula que jogaram
contra ele."
Na quarta-feira, dia quinze, Acioli encontrou Raul Jungmann, Ministro
da Segurança Pública, e narrou sua versão do episódio e como a investigação
atingira sua família.
Assinale-se que o relatório final da Polícia Federal, segundo consta no
artigo de Walter Nunes, não apresenta
provas de que Cancellier ter-se-ia beneficiado de um suposto esquema milionário
de desvio de verbas da universidade.
Também nesse sentido, o irmão do ex-reitor faz críticas aos dois
inquéritos da Polícia Federal que chamaram professores a dar explicações após manifestações sobre a operação policial
e a morte de Cancellier.
O Reitor da UFSC, Ubaldo Balthazar, e o chefe de gabinete da reitoria,
Aureo Mafra de Moraes, acabaram denunciados à Justiça pelo Ministério Público
Federal sob a acusação de ofenderem a "honra funcional" da delegada
da P.F. responsável pela Ouvidos Moucos e de terem sido omissos
diante de protestos na instituição contra a ação policial.
A propósito, o articulista assinala: "O ministro Gilmar Mendes
falou algo muito claro recentemente. Que eles (policiais federais) não têm nenhum cuidado com a honra alheia e
são tão cuidadosos quando criticamos os seus."
A Polícia Federal disse, em nota, que os inquéritos foram instaurados "após
representação encaminhada por servidores
públicos federais que se sentiram vítimas de possíveis crimes contra a honra diante da exposição de
faixas com dizeres tidos como ofensivos nas dependências da UFSC".
Perguntado como surgira a
conversa com o Ministro Raul Jungmann, o pesquisador Acioli Antonio de Olivo
disse que participara de um evento sobre fake
news em que estava também o ministro
Gilmar Mendes, do STF. O ministro falou que estava muito descontente com os
rumos, não só do caso do meu irmão, mas também com as questões das operações da
PF. Disse que seria interessante o Ministro Jungmann se manifestar sobre o caso da UFSC. Depois,
ligou e disse que tinha falado com Jungmann e que era para que entrasse em
contato com ele.
Indagado acerca de como tinha sido a
conversa, o irmão de Cancellier disse que a conversa com Jungmann foi muito boa
no aspecto que ele se solidarizou com a dor da família. Ele até disse que não
tinha se inteirado completamente. Fiz um relato de como eu vi a questão da
prisão, de como a imprensa e autoridades têm descrito esta questão.
Acioli de Olivo
reconhece não ter nenhum conhecimento jurídico, tendo feita carreira na área
tecnológica. Portanto, ele reconhece não ter condições de avaliar juridicamente
se o operação que prendeu seu irmão tem erros ou não."O que tenho certeza
muito grande é que meu irmão morreu por não poder suportar uma acusação caluniosa
de ele ser líder de uma organização criminosa que desviou R$ 80 milhões.
Perguntado pelo
repórter sobre o que dissera a respeito o Ministro Jungmann, Olivo respondeu que o ministro disse que gostaria de se inteirar mais sobre tudo
aquilo que falei e me pediu que eu encaminhasse um documento sobre todos os
temas que tinha apresentado.
Indagado pelo
repórter acerca do fato de haver privado
da companhia do irmão nos dias anteriores ao suicídio, Olivo afirmou que apesar de não ser próximo
do irmão - "ele morava em Santa Catarina e eu moro em São Paulo - quis o
destino que eu fosse a companhia dele nos últimos sete dias de vida. Eu estava
em São José dos Campos e meu irmão caçula falou: "O Cau (apelido de
Cancellier) não está bem. Você pode vir e fazer companhia a ele?" Eu
estava aposentado e fui para lá e fiquei na casa dele, conversei muito com
ele."
"Senti que
ele estava num processo que - obviamente que não identifiquei que era tão
grave - de tristeza muito grande no sentido de toda a vida acadêmica que ele
construíu tinha ido pelo ralo. Tudo que ele fez ao longo da vida, desde aluno,
professor, chefe de departamento, diretor da faculdade de direito e reitor
tinha sido jogado no lixo por uma acusação falsa."
Perguntado como se
manifestava essa depressão, respondeu Olivo: "Quando cheguei lá, conversei
um pouco com ele e a partir do dia seguinte fui acompanhá-lo em várias coisas.
Ele precisava de documentos, ir ao médico - tinha feito uma cirurgia cardíaca
seis meses antes.
"No primeiro dia, quando fomos pegar um
táxi, senti que ao sair do apartamento ele olhava para todos os lados para ver
se não era reconhecido. Então alugamos um carro para ter maior privacidade. E
cada vez que eu saía com ele, ele saía do carro e olhava para a frente e para trás.
Conversamos a respeito disso. Ele sabia que isso não tinha retorno. Se ele
fosse inocentado juridicamente, nunca seria inocentado de uma mácula que
jogaram contra ele."
O
jornal insere nesse contexto a seguinte observação: "A PF incriminou seu
irmão por manter ou nomear professores que fariam parte de uma quadrilha."
Olivo responde a respeito: "Não sei como funciona a burocracia da
universidade, então contestar seria leviano de minha parte. O que eu sei e é
claro no inquérito inicial é que, aos olhos de um leigo, não existe nexo causal
entre as provas e evidências coletadas e as acusações. No entanto, eu devo ser
muito ignorante, tendo em vista que uma juíza - qualificada que deve ser, todo
juiz deve ser qualificado - acatou as acusações. Por isso eu me atenho a algo
que eu entendo, que é a dor. E a dor me diz que meu irmão foi morto porque a
dor dele por uma falsa acusação era maior do que tudo. O resto eu deixo para a
Justiça, para os juristas, para os professores da universidade.
O repórter
Walter Nunes então pondera:" Houve uma sindicância sobre a conduta da
delegada Erika Marena, responsável pela prisão de seu irmão, e ela foi
absolvida." Responde então o irmão Acioli
A. de Olivo: "Não sei se houve uma sindicância. Para ter uma sindicância
deve haver uma série de formalidades. Eles se autoinvestigaram.O fato é que me
pareceu que eles fizeram algo muito apressa-do, porque eles precisavam
rapidamente eximir a delegada, tendo em vista que ela era nomeada para a
Superintendência da PF em Sergipe."
Informado
de que "o caso agora está com a Procuradoria", ele perguntou ao irmão do Reitor "o que o sr. espera?" "O que eu espero é que isso sirva para
que as pessoas possam andar livremente, que não tenham medo de serem presos sem
direito ao contraditório. O que eu quero é que o autoritarismo e as manifestações que às vezes podem ser caracterizadas como perseguição da PF aos
gestores da universidade e a outras autoridades e outras pessoas acabem.
"Eu
lembro o seguinte: e os outros professores que foram presos com o Cau? Eles
estão impedidos de entrar na universidade, continuam execrados pela opinião
pública. Eu espero que a universidade apóie essas pessoas no seu retorno e que
toda a comunidade universitária e a sociedade tenham certeza de que foi uma
injustiça que fizeram com meu irmão e com todos eles. Legalmente, eu não sei o
que esperar. Eu não sou ingênuo de acreditar que o estado reconheça que eles
(investigadores) erraram, mas eu espero que em vida eu possa ver os outros
professores volta-rem para a universidade."
Fonte:
transcrição da entrevista de Acioli A.
de Olivo, dada ao reporter Walter
Nunes, da Folha, referente ao
irmão do Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier de
Olivo, que se suicidou.
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