Não há negar a
amplitude do desafio apresentado para a intervenção militar no Rio. Tampouco teria
havido, segundo o Comandante do Exército, algum engajamento da população
carioca que fosse comparável à dedicação dos militares ao problema da criminalidade na
cidade do Rio de Janeiro.
Na verdade, porém, o povo do Rio -
refiro-me, sobretudo, àquele que vive nos seus bairros residenciais - tanto a
Zona Norte, quanto a Zona Sul, e que terá aguardado com confiante esperança dos
efeitos pacificadores da vinda do exército para cá, por que não terá reagido
diante de tal repto, e dado a esse
comando uma resposta mais interativa, e mais integrada à missão de confrontar
esse desafio, que é o crescimento da criminalidade em níveis que ultrapassam
qualquer expectativa?
De uma parte, se compreende, na
verdade, a insatisfação do general Eduardo Villas Bôas, pela falta de
integração de outros setores da administração pública e da sociedade civil no
combate à criminalidade no Rio.
De outra, porém, não se pode dizer
que o carioca não ansiasse pela vinda da força militar, com o número e o
armamento necessários, para arrostar o desafio do crime na antiga Cidade Maravilhosa. Quero crer que a falta de entrosagem entre o
governo do estado do Rio de Janeiro, as Forças Armadas e a população carioca veio
a existir pela falta de liderança não só do poder civil, mas também do segmento
castrense.
Além da morna resistência da
governança do estado, tampouco surgiu no estamento civil uma associação e até
mesmo uma liderança que verbalizasse o quanto o estado do Rio de Janeiro
carecia da presença militar, para que a oportunidade da intervenção pudesse
sair do espaço burocrático e refletir-se como devera na realidade desta Cidade
que já passou por muitos desafios - a começar pelo ataque francês no seu
próprio nascimento - e durante a Colônia, após receber a governança da Bahia,
atravessar esses séculos, por vezes sacudida por visitas indesejáveis de
corsários e piratas, para afinal afirmar-se como sede da Corte de dois
imperadores, até desembocar no evento, para alguns melancólico, de presidir ao
desaparecimento da única república - leia-se democracia - como pranteou o
quinze de novembro um estadista argentino - e,
não obstante seguindo através de metade do século XX ainda como capital
do Brasil.
A chamada decadência do Rio de
Janeiro não é atribuível ao grande presidente Juscelino Kubitschek - pois não
eram apenas frades os que clamavam pela interiorização do poder no Brasil - mas
ela constitui um fator inegável, que nem uma Olimpíada será suscetível de
mascarar.
A crise do Rio de Janeiro, ela
não se reflete apenas nesta cidade - e tal fato não é tão paradoxal quanto
parece. O problema social no Brasil tem crescido bastante, e a Folha de S. Paulo tratou ultimamente da
questão da criminalidade, e o quanto ela tem inchado no tempo recente. Para
minha geração, que hoje se encaminha para outros campos, é difícil entender o
veio da criminalidade e da consequente insegurança com que se torna, por vezes,
uma componente intratável da sociedade. Nos dias que correm, a segurança e a tranquilidade
social não mais constituem fator permanente do dia-a-dia do cidadão. Estão aí
os problemas surgidos no Rio Grande do Norte, no Amazonas, e em outras paragens
desses vastos Brasis, para que se tenha de abandonar, ainda que com pesar, a
antiga visão idílica dos passeios públicos.
Mas me releve o Senhor
Comandante cuja vontade de realizar plenamente a missão que lhe foi confiada
pelo Senhor Presidente é clara e irrefutável.
O Rio de Janeiro, o antigo município da Corte, talvez tenha oferecido no
passado uma visão idílica, quase ingênua, que vemos até hoje na marchinha de
André Filho. Hoje, este sonho na realidade se transforma numa espécie de
pesadelo, aumentado pelo crescimento sem controle, e também por uma infeliz
governança de quem tinha muito para ter êxito, mas terá esquecido do pai as
lições do trabalho sério e da honradez.
O seu lugar-tenente, que
tampouco logrou dominar a contento o desafio da mala-vita, não terá compreendido o alcance de sua missão, General
Villas-Bôas. Da intervenção no Rio de
Janeiro e das suas dificuldades, surge por último a incrível e irresponsável
votação pela Assembleia Legislativa de mais vantagens para uma categoria, que,
sobretudo dadas as suas consequências legais, devem ser de pronto desfeitas,
pela sua manifesta ilegalidade e desrespeito tanto com o Povo do Rio de
Janeiro, quanto com o grupamento militar que nos honra com sua presença.
Nenhum combate está
perdido se o seu Comandante tem presente o próprio desafio, e a necessidade
imperiosa de levá-lo a termo com o apoio de uma população que,não por acaso, já
foi alcunhada de mui leal e heróica.
(
Fonte: O Estado de S. Paulo )
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