A estratégia do governador Sérgio Cabral e de seu Secretário de Segurança, Mariano Beltrame, tem sido saudada pela grande imprensa como a pacificação do Rio de Janeiro.
A ocupação permanente de determinadas favelas, e a consequente expulsão do tráfico, marca decerto o início de longa marcha pela integração dos morros e do asfalto, pondo fim ao que Zuenir Ventura chamara de cidade partida.
A presença do tráfico no meio dessas comunidades não representou fenômeno acidental. Diante do vácuo do poder estatal nas favelas, a implantação em tais áreas de núcleos de banditismo, alimentados sobretudo pelo aumento na cidade do consumo da droga, acelerou o processo de virtual feudalização dos morros, com a cruel submissão da maior parte da população das chamadas comunidades ao arbítrio dos senhores do tráfico.
Com a entrada permanente da PM no morro de Santa Marta, o governo Sérgio Cabral iniciou nova fase no combate em prol da segurança. Experimento piloto de uma estratégia gradualista, o Santa Marta representa inegável êxito, e vem sendo empregado como uma espécie de cartão de visita na guerra decenal - até então malograda - do Estado contra o poder alternativo do tráfico.
Seguiram-se, em vagas sucessivas, outros avanços desse paradigma de retomada dos morros e dos espaços dominados pelo tráfico. Na Zona Sul, depois do ingresso nas favelas do Leme (Chapéu Mangueira e Babilônia), foram investidas as do Pavão-Pavãozinho e do Cantagalo, a que, em operação complementar, o Bope agregaria as comunidades da Ladeira dos Tabajaras e do Morro dos Cabritos.
Em função dessa retomada de áreas há muito abandonadas, cresce na mídia o quadro de uma Zona Sul liberta do poder do tráfico. Dessarte, a manchete de O Globo de hoje – o réveillon da pacificação – transmite ao leitor a visão de morro e asfalto irmanados, como indicaria a imagem de turistas contemplando das alturas do Pavão-Pavãozinho a vista privilegiada do espetáculo pirotécnico diante das areias da praia de Copacabana.
Apesar de que na Zona Sul as favelas da Rocinha e do Vidigal não tenham sido por ora chamadas a participar do quadro pós-tráfico, é importante evitar que se experimente, por causa dessas recentes conquistas da legalidade, a síndrome da ‘antecipação de resultados’, que constitui um vezo contumaz da mídia.
Até o presente o que se assiste é um processo de expulsão de traficantes de um certo número bastante limitado de núcleos. Afastados dessas bases, tais traficantes demandam outros morros, onde presumivelmente reconstituem os seus esquemas.
Por outro lado, mesmo no que concerne àquelas favelas libertas do arbítrio do tráfico, há ocorrências que podem apontar para indícios da permanência de marginais nas aludidas comunidades. Assim, depois da expulsão dos traficantes do morro da Babilônia, no Leme, houve aumento da criminalidade no bairro, com assaltos a restaurantes. Além disso, o criminoso que golpeou Lady Francisco na saída de seu teatro no Posto Seis, a forçou a dar-lhe ‘carona’ até as comunidades do Leme, onde continuaria a residir. Quanto ao Pavão-Pavãozinho, houve muitas indisturbadas incursões de retaliação do tráfico, com incêndio de ônibus e supermercados.
Por conseguinte, convém evitar a atmosfera de oba-oba, com que a mídia pode desvirtuar as realizações da política de segurança da administração Sérgio Cabral. Roma não se fez num dia, tráfico e traficantes não se evaporam em passes de mágica.
Saudemos com confiança a anunciada pacificação. Mas não nos apressemos em confundir a luta que será comprida com milagres súbitos e necessariamente ainda frágeis.
sexta-feira, 1 de janeiro de 2010
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