domingo, 17 de janeiro de 2010

Colcha de Retalhos XXXIV

Ervas Daninhas

Alain Resnais, apesar de seus oitenta e sete anos, continua dirigindo bons filmes. Seu companheiro da Nouvelle Vague, Eric Rohmer, acaba de deixar-nos, mas Resnais não passa de uma criança perto de Manoel de Oliveira, que continua ativo, a despeito de sua centena de anos.
Herbes folles é o título de sua nova película, a que se traduziu por Ervas daninhas. Pode ser que signifiquem o mesmo, porém herbes folles (ervas loucas) semelha um comentário mais adequado para os principais personagens de Resnais.
Esse tipo de vegetação pode nascer em qualquer parte, e há tomadas de tufos de ervas que surgem de gretas entre lajes do chão. Dependem, portanto, do acaso (fortuna), por isso se espremem e crescem nos lugares mais inesperados.
O roteiro do filme é também uma digressão sobre o fortuito, e o que a sorte (boa para uns, adversa para outros) pode desencadear. O próprio termo desencadear com o seu imaginário de eventos de súbito lançados constitui uma pista (ou uma linha) para a evolução de um conjunto de situações que vai formar a estória.
São quadros aleatórios – porque não estão sob o controle dos personagens. Tudo começa com a imagem no ar da bolsa de Marguerite Muir (Sabine Azéma), que acaba de adquirir mais um par de sapatos de marca. Presumivelmente sob uma arcada, a protagonista é vítima de um scippo (roubo de rua, de origem italiana, em que violência e surpresa se unem para arrancar um pertence de alguém).
Sob o impacto do fait divers (ocorrência policial desimportante), Marguerite decide apenas regressar para a loja. Forçada pelo imprevisto, ela desfaz a sua compra, permutando o par de sapatos pelo dinheiro gasto. Retorna, em seguida, para casa, onde decide deixar para o dia seguinte as providências administrativas relativas à perda dos cartões de crédito e dos documentos.
No entanto, a roda da fortuna já foi acionada. George Palet (André Dussolier)encontra junto de pneu de seu carro a carteira de que o descuidista se livrou, depois de ficar com o dinheiro em espécie. Após uma torturada análise de como deva proceder – Palet tem imprecisos antecedentes de violência sexual – acaba por resolver-se em levar a carteira para uma delegacia. Ali encontra um policial típico – Mathieu Amalric – não sem antes cometer um pequeno deslize (irritado por não haver ninguém no balcão, tenta abrir porta de onde vem ruidos de festinha, a despeito de ter o cartaz Proibido). Por isso, o polícia o censura. Segue-se diálogo típico em que a incerteza é a regra. Palet até suspeita que o agente o haja reconhecido (de quê, por quê não se esclarece), e no fim acha melhor que a polícia providencie a entrega da carteira, sem que exija qualquer recompensa.
A estória avança como se fora aos arrancos. Palet não quer dinheiro – pela sua casa é pessoa de classe média alta – mas não suporta que Marguerite não queira ter com ele nenhum contato.
Debalde telefona diversas vezes para ela. Como esta deixa sempre o aparelho na secretária eletrônica, a exasperação dele cresce. Configurando ainda mais o acosso, escreva mensagem dramática para ela, e vai colocá-la na sua caixa de correspondência, na portaria do prédio residencial de Marguerite. Tão logo a inseriu através da fresta se arrepende de o que escreveu, e principia a tentar abrir à força o escaninho. Eis que surge a concierge (porteira), outra figura paradigmática do imaginário francês. Ela o censura pelo que intenta fazer. Palet consegue enfim convencê-la a ajudá-lo (dizer para Marguerite que queime a carta, mas esta se recusa).
A negativa de qualquer contato enfurece Palet que volta até o endereço de Marguerite, para rasgar os quatro pneus de seu carro. A violência da reação a faz procurar o agente policial. Apesar das dúvidas do policial, que vê a gravidade da ação de Palet, ela prefere não entrar com queixa formal, pedindo-lhe, ao invés, que ele visite o agressor e o dissuada de continuar a forçar a barra.
Acompanhado de um colega, ambos uniformizados, o polícia o procura em casa. A seriedade dos rostos – os espectadores veem a cena através das vistas de Palet – dos policiais o convencem de que não deve reincidir. A terrível ameaça não precisa ser dita: basta a presença da autoridade para explicitá-la.
A partir desse instante, a roda da fortuna passa a girar em reverso.
Mudam os papeis e a origem da iniciativa. Mudar ? Talvez não, porque a essência da natureza das herbes folles é a própria imprevisibilidade. Se surgem em toda parte, tampouco são supostas aparecerem (ou agirem) sempre da mesma forma...
Para nosso gáudio, Resnais e outros diretores europeus nos mostram que o talento não é necessariamente um derivado de excesso de dinheiro.

China: ataques cibernéticos & censura

O State Department deverá manifestar no início da próxima semana a sua preocupação (concern) pelo incidente e solicitar informações das autoridades chinesas quanto a uma explicação de como isto aconteceu e o que tencionam fazer a respeito.
Com efeito, a gestão diplomática, apesar da seriedade da questão, se vê obrigada a avançar com cautela, porque, como soi acontecer com ataques desse gênero, tal categoria de ação é muito difícil de ser apanhada com provas incontestes.
Quando os técnicos do Google começaram a suspeitar que hackers chineses tinham logrado penetrar em contas particulares do gmail, montaram uma contra-investida que conseguiu chegar a um computador em Taiwan, que se tornou o suspeito de ser a origem das incursões cibernéticas. Por meio do acesso a esse computador, os técnicos obtiveram provas do resultado dessas incursões, não apenas no Google, mas em pelo menos 33 outras companhias americanas, entre as quais Adobe Systems e Juniper Networks.
Realizando plenamente a amplitude do problema, cuidou-se de alertar as autoridades estadunidenses de informação (intelligence) e de repressão legal. Através da cooperação com esses setores, se pôde determinar que a direção de tais incursões não provinha de Taiwan, mas sim da China Continental.
Entretanto, se os indícios colhidos, e em especial a sofisticação dos ataques cibernéticos, apontavam para o envolvimento, seja diretamente, por agências estatais, seja por operadores sob seu controle, os técnicos tanto da Google, quanto dos órgãos oficiais americanos não puderam reunir provas conclusivas da responsabilidade de Beijing.
Como a pesquisa não alcançou a sinalização inequívoca da origem da incursão, a reação da Administração Obama não pôde ser proporcional à seriedade dos ataques feitos ao centro tecnológico do Google. Embora exista a quase certeza de que os ataques foram programados e executados, seja diretamente, seja sob a supervisão das autoridades de Beijing, a gestão diplomática sobre o incidente que motivou a reação de Google terá de ser realizada com os cuidados de quem não desconhece não dispor de provas conclusivas acerca da eventual responsabilidade chinesa.
Infelizmente, uma das características do ataque cibernético está na quase impossibilidade de determinar quem é o responsável e verificar de onde partiu o ataque.
(Fonte: International Herald Tribune)

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