sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Quem chora por ti, Venezuela ?

                    

        Faz tempo já, mas o presidente Nicolás Maduro perdeu grande oportunidade ao recusar-se, na prática, a ser afastado pelo procedimento constitucional do recall - que recordarei, por enésima vez, se submetera o seu protetor Hugo Chávez, e que, para sua honra, vencera.
        Tudo indica que Maduro torna ainda mais longo e penoso esse processo, decerto exacerbado pela própria incompetência, e a gatunice do regime.
         Para quem acompanhe a involução na economia e na política da Venezuela, será acaso difícil determinar quais são as causas determinantes dessa magna crise naquela infeliz nação?
         A inflação não era tão alta nos tempos de Chávez, nem a crise na população atingira os atuais níveis, mas desde o tempo do fundador do regime, ela já se agravava.  Colaboraram para tal o desperdício e as ambições hegemônicas do regime.  Chávez fazia política internacional com o sobrepreço então do petróleo, que constitui o principal esteio da economia venezuelana.
           Os lucros da monocultura venezuelana - derivados do petróleo - ao invés de financiarem inversões na própria indústria - se destinavam à subvenção da economia cubana (o petróleo lhe era repassado a cotações menores daquelas vigentes na época), assim como do processo revolucionário das esquerdas na América Latina (Nicarágua e até Argentina), custeio de uma organização chavista, uma espécie de OEA das esquerdas), e sem dúvida outras inversões com a mesma tônica ideológica. Compreende-se, por conseguinte, que, na prática, o coronel Chávez bancava o futuro das próprias aspirações de liderança da esquerda continental, sem atentar, no entanto, que o montante dos seus recursos não eram determinados por ele, mas pelas flutuações do mercado petrolífero, dominado por gigantes que cuidam naturalmente dos respectivos interesses e não dos da 'revolução chavista'. Mutatis mutandis, se o comandante Chávez tivesse lido [i]Esopo e [ii]La Fontaine, talvez houvesse chegado a soluções mais próximas da realidade latino-americana, assim como das possibilidades da própria economia.
           Nicolás Maduro, como tantos outros herdeiros de líderes carismáticos na história universal, é o fautor principal da triste situação de que padece o próprio povo, no caso o venezuelano. É uma curva que, pela própria natureza,tende a cair sempre mais, para a infelicidade de um povo que acreditou em Chávez mas já deixou há muito de ter alguma confiança no seu sucessor.
           No velho sistema de Latino América   - de que o Brasil tampouco se diferenciou no passado - Maduro tratou de cooptar Las Fuerzas Armadas para sustentar-lhe o regime, visto que já não bastavam os instrumentos policiais para garantir-lhe a permanência em Miraflores.
          Com o píres estendido, logrou o apoio econômico, de gospodin Vladimir Putin, o atual czar de todas as Rússias, hipotecando o solicitante Maduro na prática as rendas que lhe advêm da monocultura de sua economia.
           Mas a situação da economia venezuelana é pavorosa, e nem mais pernil de porco, como noticiam os jornais,  ela tem condição de importar do nosso Portugal...
            Não se carece de grandes poderes divinatórios para prever que a situação econômica venezuelana ora funciona como o motor para a aceleração da queda desse regime nefasto, em que a corrupção, o compadrio e a crueldade se dão as garras.
             Para que se tenha idéia do caos prevalente no 'mandato' de Nicolás Maduro - hoje despojado de qualquer base de legitimidade - que vem sendo infligido ao infeliz Povo venezuelano - eis os dados fornecidos pelo Observatório  Venezuelano da Violência, no passado ano:  26.616  pessoas assassinadas (89 vítimas a cada cem mil habitantes). Dessas mortes, 16.046 são homicídios, 5.535 assassínios por resistência à autoridade (!) e 5.035 mortes ainda sob investigação.

( Fonte:  O  Estado de S. Paulo )



[i] Esopo, fabulista grego, sec.VII/VI A/C.
[ii] La Fontaine, fabulista francês (1621-1695)

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