No contexto da controversa concessão
de auxílio-moradia a juízes, o Ministro
Luiz Fux negou seguimento a uma ação
popular movida contra decisão que autorizou o pagamento de R$ 4,3 mil em
auxílio moradia a magistrados, promotores e conselheiros de Tribunais de
Contas.
A ação em tela foi movida pelo
Sindicato dos Servidores da Justiça da 2ª Instância do Estado de Minas, para
que sejam declarados inconstitucionais os valores conferidos a magistrados que
tenham resi- dência ou domicílio na mesma comarca em que trabalham.
De acordo com a entidade, o
pagamento do benefício, em modalidade indenizatória - que implica ressarcimento
do servidor por gastos decorrentes das suas próprias funções -, vem sendo, na
prática, uma forma de aumentar a remuneração dos juízes.
"Afinal, o que está sendo
indenizado? A moradia? Desde quando o agente público que trabalha e reside ou
tem domicílio no local de sua lotação tem direito a ter a moradia custeada pela administração, na
verdade, por todos os cidadãos brasileiros?", questionou a entidade.
De acordo com a estimativa da
ONG Contas Abertas, desde setembro de 2014,
quando o próprio Fux acolheu ação movida por um conjunto de magistrados,
com apoio da Associação Nacional dos Juízes Federais, e proferiu decisão
favorável aos pagamentos dos benefícios, o benefício já custou R$ 4,7 bilhões
aos cofres públicos. O presidente da
entidade, Gil Castelo Branco, disse que a margem de erro do cálculo é mínima,
uma vez que são raros os magistrados que recusam receber a indenização. "Em
um dos Estados, seis juízes não aceitaram. No Espírito Santo, apenas um se recusou a
receber", afirmou.
De acordo com a Contas
Abertas, atualmente há 17 mil magistrados e 13 mil procuradores do Ministério
Público Federal com potencial para
receber o auxílio-moradia. Dados comparados da ONG dão conta de que o
auxílio-moradia corresponde ao dobro do piso salarial dos professores, no valor
de R$ 2,9 mil.
Ação
popular. Em sua manifestação, Fux não entrou no
mérito da questão e levou em consideração decisões anteriores da Corte que
sustentam o entendimento de que não cabe mover ações populares contra decisões
judiciais - atos jurisdicionais.
Ao negar o seguimento da ação,
na semana passada, Fux evocou decisão da
Segunda Turma da Corte, de março de 2015, em que ficou estabelecido que "o
Supremo Tribunal Federal - por ausência de previsão constitucional - não dispõe
de competência originária para processar e julgar ação popular promovida contra
qualquer outro órgão ou autoridade da República". "No âmbito da doutrina especializada do
processo civil coletivo, o entendimento também é pacífico", destacou o
ministro na sua decisão. Procurado, o gabinete do ministro não se manifestou
sobre a decisão.
Barroso. Em outra ação que julga validade da concessão do auxilio-moradia
a todos os juízes, o ministro relator Luís Roberto Barroso encaminhou o caso
para o plenário do Supremo Tribunal Federal. O processo ainda não foi pautado
pela presidente da Corte, Cármen Lúcia.
Análise do
Coordenador da Especialização em Direito Administrativo da Faculdade de Direito do IDP - SP Amauri
Saad
A decisão proferida pelo ministro Luiz Fux é equivocada. A razão
principal para a negativa da liminar foi a suposta inadequação da ação popular
para questionar atos jurisdicionais. Tal
posicionamento merece ser revisto pelo Supremo Tribunal Federal.
Em primeiro lugar, porque a ação popular é o instrumento previsto
no artigo 37 da Constituição. Em segundo lugar, porque no caso concreto, o que
a referida ação requer é a declaração de invalidade da Resolução nº 199/2014 do
CNJ. Tal ato, ao contrário do que sustenta o ministro, não tem natureza
jurisdicional.
A resolução 199/2014, em verdade, é duplamente ilegal:
primeiramente por conceder adicional de mais de R$ 4,3 mil aos já robustos
salários dos magistrados; de igual modo, por caracterizar tal adicional
remuneratório como "indenização", o que possibilitou a burla ao teto
constitucional - R$ 33,7mil.
Em tempos de vacas
magras (em que o corte de gastos é imprescindível), é no minimo imoral que a
classe dos magistrados continue a receber tal privilégio, ainda mais quando
considerado que o Congresso discute a reforma da Previdência, afetando inúmeros
brasileiros.
( Transcrito do Estado de S. Paulo, pag. 08 )
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