Que os leitores me relevem esse retorno a questões que revejo nos jornais que me aguardavam
na volta das brevíssimas férias de
Natal.
Como os menos moços leitores da coluna
terão bem presente, o terror do Superhomem
dos quadrinhos estava sobretudo nos malfeitores que sabiam de sua fraqueza
diante da terrível criptonita, a qual
o despojava, ainda que temporalmente, de seus super-poderes.
Se me permitem a liberdade do
comentarista, esse fenômeno dos quadrinhos de certa forma se transporta à
triste realidade da América Latina, em que a corrupção é uma praga capaz de
rivalizar com os bandidos adversários do campeão da justiça, no mundo binário e
juvenil das antigas revistinhas.
Já se escreveu - e muito bem - sobre
essas veias que constituem autêntica praga de Latino América. Nesse contexto nauseabundo, diga-se de passagem,
que o meu emprego do termo castelhano não se insere no contexto de eventual
tentativa de buscarmos reivindicar um magnífico isolamento ético na matéria.
Primo, porque a realidade o contradiz.
Secondo, porque seria vizinho
do ridículo fazê-lo, tantos são os exemplos na realidade hodierna na América
Latina que mostram quão presente está esse gérmen insidioso em todo o
Continente americano. Se os Estados Unidos, sacudidos pelo incôngruo triunfo de
candidato que é inferior a sua rival em tantos aspectos, cuidam de pôr ordem na
casa através da designação do Conselheiro especial Robert Mueller III no que tange às eventuais irregularidades na
eleição de Donald John Trump, vemos por sua vez em nosso continente quão
largas são as teias de mãe-corrupção.
Há por um lado a firma brasileira que
reponta em muitas obras e construções do subcontinente. Não é só nos hirtos
esqueletos de abandonado concreto-armado que existem na hoje miserável
Venezuela e que apontam para a extensão de suas teias, na sucessão de obras
inacabadas da visão fantasmagórica, como se a brusca mudança de condições
desvendasse o que Eduardo Galeano já indica no seu livro pressago, sobre as
veias de América Latina.
Tampouco, não é só o corrupto Nicolás Maduro que está
envolvido nos turvos negócios com a empresa tão favorecida pelo regime petista
de Lula e Dilma Rousseff, aquele já
objeto do intenso e oportuno trabalho desse grande juiz que é Sérgio Moro.
Na verdade, vê-se quão largo é o
campo lavrado pela Odebrecht. E se ela longe está de ser um cordeiro entre
lobos, o que a realidade demonstra na sua exposição pelos tribunais, é que
ninguém é santo nesse turvo jogo, em que se fez aposta temerária de impunidade
que uma série de fatores, entre os quais a imprensa, a mídia e a sociedade enfim
contribuiriam para arrancar-lhe o pluri-decenal véu de suposta mítica virtude.
Se vemos a corrupção por tantas
partes - inclusive até no futebol nacional e, nesse contexto, me pergunto por que
o Brasil deva fingir que não é com ele, em termos de corrupção nas entidades de
classe, subdelegando ao FBI a prisão dos ladravazes, como no caso do paredro
Marin, e deixando que outros continuem à frente de seus postos, como se nada
fora - pode-se verificar quão largo é o amplexo da corrupção em Latino América.
Por ora, o gélido abraço da
corrupção envolve boa parte do continente americano - norte, meso e sul - e
tão triste narrativa há de repontar na Argentina e alhures.
Essa estória continuará - e
esperemos que de forma a ensinar às gerações presentes e futuras do proveito de
trilhar o bom caminho - eis que, além das virtudes e benefícios inerentes às
retas vias, os atalhos presentes tendem a acabar mal para os seus eventuais
protagonistas.
(Fontes: O Globo, Veias
abertas da América Latina, de Eduardo Galeano)
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