Os grandes inovadores da Igreja de
Cristo não costumam ter a vida fácil e monótona reservada às mediocridades e
àqueles que confundem a aparente vontade da Cúria romana ao sentir da
maioria.
Para ficarmos nos tempos modernos,
bastaria, talvez, referir-nos a Angelo Giuseppe
Roncalli, João XXIII, o Papa Buono, que trouxe o Concílio para uma Igreja
demasiado afastada da modernidade e de seus desafios, e à mais recente dádiva para a Religião
católica e apostólica romana, Jorge Mario Bergoglio, quem traria de
novo a originalidade criadora na fé para a Igreja de Pedro, ao assumir o nome
de um grande santo das gentes, Francisco, até então ignorado pelos seus
antecessores, desde a Idade Média.
Para que melhor entendamos o Papa do
Concílio e o seu exemplo de bondade, abertura à modernidade, semelha importante
traçar breve retrato desse grande inovador da Igreja de Cristo. Não são poucos
os respectivos traços similares aos do atual Pontífice. Escolhido pela sua
idade, como Papa de transição - depois do longo e formalista parêntese do papado de
Papa Eugenio Pacelli, Pio XII - Papa
Giovanni traria realmente a transição
para a Igreja. Mas não terá sido aquela em que muitos de seus eleitores
pensaram - vendo a transição como a
acomodação ou preparação para o advento de seu eventual sucessor, por conta da própria
idade avançada (77 anos ao ser escolhido). Sem embargo, desde a sua resposta ao
diácono quanto ao nome que escolheria como Papa - João - mostrou ao dizer Johanem que tinha outras ideias quanto à
transição que pretendia promover. Ao tomar como nome o do apóstolo das gentes,
João XXIII adumbrava que tinha em vista outra transição bem diversa daquela que
proporcionaria um pontífice setuagenário, dobrado pelos achaques de velhice. Tampouco
Papa Giovanni recuou diante desse nome que servira no passado longínquo a um
anti-Papa, i.e. um pontífice cuja legitimidade fora invalidada pela Igreja.
Não é, decerto, meu propósito
estender-me sobre o pontificado desse grande Papa. Outrossim, não terá sido por acaso que a sua
bem-aventurança e santidade tanto tardaria a ser ratificada por seus
sucessores, muitos deles da linha conservadora, que não mostraram pressa alguma
na confirmação da própria beatitude e posterior canonização. Se o passar dos
anos não apagara a memória do Papa do Concílio, o grande culto que lhe é votado
se manifesta bem cedo muito forte, e é a tal pujança que o seu antigo
Secretário particular, D. Loris Capovilla dedicou série de opúsculos, para mostrar o legado do 'Papa bom' que desmontaria as barreiras
das facções conservadoras do alto-clero. Tanto a beatificação, quanto a
canonização são conquistas da áurea de santidade de um grande Papa, cuja imensa
popularidade junto ao Povo de Deus, venceria todas as barreiras colocadas pela
ala triunfalista do alto clero conservador.
Hoje, os desafios que enfrenta o ânimo
e a coragem desse novo Papa, que a Argentina doou ao mundo, têm muito a ver com a batalha que terá levado,
no passado, ao chamado Papa do sorriso, João Paulo I, que julgou possível
juntar no próprio nome a João XXIII e ao respectivo sucessor, Paulo VI, que
culminaria a obra do Concilio Vaticano II, embora em certos pontos recuasse
como na sua Encíclica Humanae Vitae
fizesse pesadas concessões ao pensamento conservador.
A luta desenvolvida pelo novo Papa Francisco deve continuar. Os grandes
pontífices, seja no passado, seja no presente próximo, podem ter tido surdos
embates com prelados dessa Cúria, em que por vezes se aninham as feições menos confessáveis
dessa legião de anônimos que amiúde constituem a chamada vanguarda do atraso.
Os seus eventuais êxitos são marcados pela transitoriedade. Quem se há de
lembrar acaso daqueles supostos prelados que terão acaso brindado, no infausto
três de junho de 1963 a morte desse grande Papa do século XX, cercado este
último pelo elogio de seu sucessor imediato, que se chamaria Paulo VI, pela
silenciosa multidão na Praça São Pedro, pelos seus colaboradores diretos, dobrados pela aura de santidade, daquele que o porvir mostraria como o maior
Pontífice do século passado.
O preconceito, a inveja, são reações
mesquinhas, que costumam abrigar-se na sombra e nos encontros furtivos.
A bondade, o ânimo reto e justo, a
clarividência sóem dispensar os rebuços da gente pequena, que nas sombras se
encontra, e para elas semelham confluir, porque o suposto segredo que as
envolve, e de que tanto carecem, lhes pouparia
do incômodo de deparar no espelho
refletidas as marcas inconfessáveis da própria maldade.
Continue Papa Francisco a sua
luta, porque nela encontrarás mais do que a própria realização, senão a certeza
de que enfrentas o bom combate, e que assim agindo segues o exemplo de outros
grandes Pontífices, que tanto agregaram ao rebanho do Senhor.
Fontes: Pope John XXIII, de Peter Hebblethwaite; Annuario Pontificio 1988; Veja - artigo de Adriana Dias Lopes sobre Papa Francisco - De Costas para a Cúria.
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