domingo, 1 de março de 2015

Colcha de Retalhos C 8


                                        

As Contas do Levy

 

          As contas ruins do governo Dilma II são anunciadas pela imprensa. O viés é tão negativo, no entanto, que sequer dá maior importância ao superávit primário  de janeiro. Reporta-se a essa economia de R$ 10,4 bilhões para o pagamento dos juros da dívida público, e chega a compará-lo com o ‘superavit’ do ano passado, que teria montado a R$ 13 bilhões.

           Será que acaso esqueceram que o superávit de janeiro de 2014 correspondeu a  ‘mágica’ de Guido Mantega, com a manipulação de dados e de restos a pagar – como se verificaria mais tarde – e que na verdade o tal superávit de treze bilhões não passava de malabarismo fiscal, bem à maneira da Fazenda no Dilma I

           Para o ajuste fiscal – que é indispensável – faltam os Silas e Caribdes do Congresso. Se por demagogia, suas excelências resolverem deturpar o ajuste, estarão contribuindo para tornar mais difícil o trabalho do Ministro da Fazenda – e por conseguinte a limpeza nas cavalariças de Áugeas.

           A Presidenta parece resignada e mesmo conformada com o tratamento de choque. Depois da farra fiscal do quadriênio passado, não há outro jeito. É de esperar-se que no frigir dos ovos, PT e congêneres joguem menos para a arquibancada e tomem umas pastilhas de juizol.

           

Simplificação de procedimentos

        

         Acabar com atávica burrice da burocracia nas exigências para formação e fechamento de empresas é outra medida de grande importância, e que deveria dar início a uma onda geral nesse sentido.

         A burocracia costuma ser tarda, indolente e burra. Não há símbolo melhor dela que o casaco do servidor (ausente) devidamente pendurado no espaldar da cadeira, como se pedaço de vestimenta fosse confirmação de presença.

          É um truque cediço e tão velho quanto a Sé de Braga, a que deveríamos pôr fim, junto com a vergonha e o deboche da burocracia para com o público.

          As medidas anunciadas mostram que a velha herança portuguesa não é um destino imutável e maldito, não suscetível de reforma e atualização.

          Tornar rápida e simples a formação de empresa, assim como o seu fechamento é outra ótima notícia, que nos livra do desconforto de ter de conviver com a agressiva e custosa burrice de dona burocracia.
 

Os emissários submarinos

 
              Desde os tempos de criança ouço falar nos chamados emissários submarinos, cuja construção tem parecido aos prefeitos do Rio de Janeiro desde o tempo em que aqui estava a capital da República como a solução moderna e indispensável para o problema dos esgotos nesta mui leal e heroica Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

              Como já se passaram muitos lustros desde que deixei os brinquedos da infância, os estudos e folguedos da juventude, e adentrei uma profissão de estado – após atravessar as forcas caudinas de um longo vestibular – e depois de mais de cinquenta anos de serviço público na diplomacia fui aposentado por atravessar o marco dos catorze lustros, enquanto se sentava na cadeira de Rio Branco ministro que cuidou de baixar os requisitos de ingresso no Itamaraty para servir menos à instituição e mais a quem o designara – devo confessar que principiei a achar deveras estranho que a rústica tecnologia do emissário submarino – não descerei a detalhes em respeito ao leitor –continue a imperar, como se para os senhores prefeitos a tecnologia dos esgotos e como deles ver-se livre continuasse a mesma.

              E não é que aumenta o meu espanto em que o Senhor Prefeito Eduardo Paes – que espero já tenha retornado de sua missão a Paris (as autoridades das megalópoles não viajam, mas sim aceitam missões) –venha a público falar de um enésimo emissário submarino, como se fora obra de grande complexidade e relevância.

              Mas afinal o que é um emissário submarino, senão uma enorme tubulação que se propõe jogar nos domínios do deus Poseidon (ou de Netuno, se o preferir) todas essas excrescências humanas e animais, para que as autoridades não mais encontram espaço e serventia?  O que me espanta, Senhor Prefeito, é que depois de tantos decênios a tecnologia da utilização do esgoto continue a imitar o movimento de um selvagem que livra-se do lixo jogando-o fora, ao invés de incinerá-lo em fogueiras longe de suas tabas.

              Ouço falar no Oriente em usinas de processamento desses resíduos, capazes de transformar em águas límpidas e potáveis a malcheirosa carga dos esgotos. Será que essa tecnologia ainda aqui não chegou? Como Vossa Excelência costuma seguir o exemplo de seu padrinho, o senhor Sérgio Cabral, é difícil acreditar que nos grandes roteiros não lhe tenham falado das maravilhas da tecnologia pós-moderna.

              Embora ele não seja deste tempo, não duvido que o deus Poseidon agradeceria que não se emporcalhasse ainda mais os seus vastos domínios, a que hoje ataca a fementida poluição, seja em dejetos daqueles maravilhosos e mastodônticos navios-cruzeiro, seja no lixo das grandes megalópoles, de que Don DeLillo nos escreve em seu maçudo romance Submundo (Underworld). Sendo jovem ainda, não creio que deseje ver a sua recepção da Olimpíada vir a ser manchada por resíduos a que a pós-modernidade já encontrou maneiras mais ecológicas de processar.

 

Adeus,  Mujica !

               A 1º de março,  o presidente José ‘Pepe’ Mujica, de 79 anos, passa o governo do Uruguai ao aliado e ex-presidente Tabaré Vázquez.

                A simplicidade é a marca registrada de Mujica. Embora a facilidade do acesso seja uma característica da antiga Banda Oriental, Mujica a encarnou de modo mais forte. O povo sentia que não havia demagogia em enjeitar a residência oficial, viver numa granja na campanha, e dirigir um velho Fusca azul.  Mujica deixa o governo com aprovação elevada, em torno de 65%, mas se assinala que na sua primeira administração Tabaré a concluiu com aprovação ainda mais alta.

                Segundo refere a diretora da consultoria Cifra, Mariana Pomies, que faz pesquisa de opinião as virtudes de Mujica são incomparáveis, como a franqueza e o modo simples de dizer as coisas. Esse tipo de temperamento se coaduna com a simplicidade típica das autoridades uruguaias. Nesse sentido, jovem diplomata, em minha primeira missão ao exterior, foi recebido pelo presidente Haedo, com cortesia e simplicidade, em Palácio Presidencial que a despeito do nome não se caracterizava pelo grandioso e a suntuosidade a caracterizarem tais  sedes, como se verifica na maioria dos países.

                 Mujica passa uma imagem pouco comum nos dias que correm. A honestidade: “a idéia da decência política, de alguém que sai do poder com as mesmas posses que tinha quando entrou, é de uma simbologia muito forte num continente marcado por escândalos de corrupção”, declarou à Folha Steven Levitsky, professor de Harvard. Cidadania. O ex-guerrilheiro tupamaro ficou quase 15 anos preso. Ao deixar o governo, recebe elogios não só por pregar, mas encarnar na sua maneira singela os valores republicanos. Legislação democrática.  No seu período de governo, entraram em vigor leis de direito civil, como a legislação do casamento gay e do aborto, e está em processo de regulamentação a que transfere ao Estado a produção e a distribuição da maconha. Em declarações a jornal argentino, Mujica sublinhou: “não é uma lei hippie, não sou a favor da marijuana. Queremos tirar o negócio das mãos do narcotráfico.”

                  Nem tudo, porém, são flores. A criminalidade aumentou nos últimos anos, a ponto de que a segurança se transformasse no tópico principal da última campanha. Outra alegada fraqueza da administração Mujica foi a educação.  O Uruguai obteve o pior resultado no PISA (programa internacional de avaliação de estudantes), caindo de 47º ao 64° lugar. 

   

( Fontes:  O  Globo, Folha de S. Paulo )

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