Quando cairá a ficha da
eliminação de Boris Nemtsov? A sua
oposição ao Presidente Vladimir Putin
era inegável e muitos vêem na sua denúncia da guerra da Ucrânia como uma
agravante no que concerne ao Kremlin.
A
comparação do dia está na liquidação da jornalista Anna Politovskaya, e a
sua cobertura crítica da guerra na Tchetchênia. No Ocidente, muitos colocaram o
cui prodest? [1] na
soleira de Vladimir Vladimirovich.
No entanto, a questão mereceu mais de um
julgamento. Os possíveis responsáveis estão no campo anônimo dos executores.
No caso da
grande jornalista, estava igualmente presente o assassínio por encomenda (contract killing). A diferença é que a
Politovskaya a abateram sozinha no modesto saguão de seu prédio residencial,
enquanto Nemtsov foi alvejado em procedimento análogo, mas não estava só, pois
o acompanhava a namorada ucraniana Anna Duritskaya.
O local, no
entanto, não podia ser mais público, dada a proximidade do Kremlin e da basílica de São Basílio, conquanto tráfico e
público estivessem condicionados pelas altas horas da madrugada.
O temor da mãe – e a sua
atribuição a Putin – foram transmitidos por entrevista aqui referida de
Nemtsov, que preferiu pautar-se pelo nobre ceticismo das vítimas.
A violência desse Oeste sofisticado
costuma trajar as capas cinzentas dos assassinos profissionais. É rastro mais
difícil, que torna mais complicadas as buscas e mais obscuras as pistas.
No entanto,
a suspicácia é incômoda e difícil de ignorar. A incrível observação de Viktor
Zolotov (então chefe da guarda pessoal de Putin, e hoje Ministro do Interior para
Yevgeniy Murov (chefe do Serviço Secreto Russo) de que há gente demais para ser
morta ([2])
já sublinha, contudo, as intricâncias da questão e a dificuldade de determinar
responsabilidades.
Infelizmente, a perda da oposição é grande. Posto que Nemtsov, na
contestação ao presidente, não tivesse ultimamente o relevo de Aleksei
Navalnyi, o seu curriculum e
a direção que vinha imprimindo às críticas (a guerra de Putin contra a
Ucrânia), além de incomodar o poder, prometia trazer mais elementos para
determinar a responsabilidade do Kremlin
quanto à continuação do conflito, mesmo depois da anexação da Criméia.
O
burburinho da marcha, os sessenta mil manifestantes que a polícia, mais
preocupada com a contenção das reações, preferiu estimar em menos de vinte mil
(e assim autorizá-la, pois estaria dentro da quota oficial dos cinquenta mil),
não teve outra novidade que a detenção de deputado ucraniano por causa da
camisa que dizia ‘Os heróis não
morrem’...
Por
enquanto semelha difícil prognosticar uma crise mais prolongada. Na Rússia dos
últimos tempos, este magnicídio é mais uma pedra tumular no caminho de gospodin Putin. Se terá outras
consequências, além de manifestações no Ocidente e eventuais sanções, é ainda
cedo para prognosticar.
Em Roma
como no mundo helênico, os harúspices e adivinhos pediam mais tempo ou então se
escondiam em ambíguos versos da Ilíada.
( Fontes: O
Globo, Karen Dawisha )
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