sexta-feira, 27 de março de 2015

Razões para Impeachment

                                       
 
          A aparente implosão do mandato de reeleição de Dilma Rousseff não é apenas decorrência da reviravolta na sua avaliação pela maioria dos votantes no Brasil. Pode-se mesmo dizer que a revolta da população em sentir-se enganada por uma propaganda tão agressiva quanto mentirosa não é suficiente para determinar-lhe processo de perda de mandato.

         Pode, se tanto, criar condições políticas desfavoráveis, mas não necessariamente deslanchar um processo de impeachment. A impopularidade pode ser o caldo em que o eventual alvo dessa medida extrema na democracia venha a ser preparada para arrostar tal mecanismo.

         No entanto, a incompetência política não se afigura por si só causa bastante para ativar este recurso do Legislativo.

         Para que se forme um quadro em que o impeachment possa vir a ser o fator político adequado para superar funda crise institucional,  impõe-se a existência de uma situação política danosa para o Brasil, situação essa que recomenda a remoção de um governo basicamente pela ameaça à ordem jurídica democrática.

        O governo Fernando Collor disso constituíu exemplo lapidar, pelas suas práticas e recursos no que tange à democracia no Brasil.

        O fato de Collor ser um aventureiro político, sem base parlamentar sólida, se terá facilitado a determinação do impeachment, não prejudica de forma alguma as motivações e as razões jurídicas que condicionaram o recurso a esse mecanismo de emergência na preservação da ordem democrática.

        Há dois fatos graves nesse processo que pode ou não conduzir o segundo governo de Dilma Rousseff a ser julgado por esse mecanismo excepcional de defesa democrática.

        Por um lado, a consciência de larga parte do eleitorado brasileiro que pelo menos Dilma Rousseff – que foi por longos anos presidente do Conselho de Administração da Petróleo Brasileiro S.A – além de seu patrono e mentor não desconheciam a existência de um procedimento criminoso de pagamento regular pelas empreiteiras de propinas como forma de adjudicação de contratos, o que constituiria o chamado Petrolão.  Deve-se à ação do Ministério Público e da Polícia Federal a realização da Operação Lava-Jato, operação essa que acolhida pelo Poder Judiciário ora procede ao indiciamento pelos eventuais réus, que incluem políticos, empreiteiros, diretores da Petrobrás, além de doleiros e operadores partidários.

       Retidas, por circunstâncias várias, do conhecimento público as graves implicações para o governo do Partido dos Trabalhadores, essa ignorância do Povo Soberano não mais existe, o que causou vertiginosa perda de popularidade – e o que é mais relevante – a quebra da confiança na isenção e na autoridade para atender aos interesses da comunidade nacional e não a conveniências de partido. Mais uma vez o tesoureiro do PT vai para a prisão.

        Não é que o governo de Dilma II tenha perdido força. Por motivo da mudança na avaliação da sociedade brasileira – de que muitos dos partidos são, mal ou bem, a caixa de ressonância – de repente as condições que presidiram aos dois turnos da eleição presidencial mudaram radicalmente.

        Além da rejeição de parte de larga maioria da sociedade brasileira – que a convocação de passeatas de entidades chapas-branca e próximas do poder petista,  pela sua fraqueza numérica não podem dissimular – registrou-se na presidência Dilma um processo acelerado de descontrole e sobretudo de omissão no exercício de o que se espera do Poder Executivo.

        Pelo seu retraimento e mesmo pelo vácuo consequente, o Planalto vem regando assiduamente o jardim do assemblearismo, com o inelutável avanço do Legislativo, personificado nas lideranças de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, em Câmara e Senado.

         O PMDB, formal aliado do PT – o vice da chapa vencedora Michel Temer é o líder  do antigo partido de Ulysses Guimarães – vem sédula e competentemente ocupando os vácuos deixados pela Presidenta que não deixa de mostrar, na provação extrema de uma crise, o quanto é importante a longa e provada militância política, que Lula da Silva, por critérios próprios, preferiu ignorar ao indicar a Mulher do Lula para sucedê-lo em 2010.

          Se o primeiro dílmico mandato foi desastroso econômica e financeiramente – estão aí a inflação trazida de volta, junto com os déficits nas contas públicas et al. – o segundo, que está nos seus vagidos, expõe a incapacidade política daquela que o torneiro mecânico proclamara como a grande gestora.

          E como a natureza abomina o vácuo, outros, como Eduardo Cunha, na Câmara, e Renan, no Senado, surgem para reivindicar a direção e o encaminhamento das questões de estado.  Além da Pec da bengala  - que me parece, de resto, recomendável -  o poder legislativo parece ávido de assenhorear-se de outras competências, como a da indicação de juízes para o Supremo, terreno que incrivelmente Dilma deixou sáfaro por larguíssimos meses, a ponto de merecer puxão de orelhas do Decano do Supremo, Ministro Celso de Mello.

          Como se sabe, a norma de que  o poder abomina o vácuo continua muito válida, e é outra explicação da aparente acédia[1] da Presidente Dilma Rousseff em exercer as faculdades que incumbem ao Poder Executivo.

(Fontes:  O  Globo, Folha de S. Paulo)

                                                                                      ( a continuar )

         



[1] Enfraquecimento da vontade, inércia, tibieza (Houaiss).

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