A aparente implosão do mandato de
reeleição de Dilma Rousseff não é apenas decorrência da reviravolta na sua
avaliação pela maioria dos votantes no Brasil. Pode-se mesmo dizer que a
revolta da população em sentir-se enganada por uma propaganda tão agressiva
quanto mentirosa não é suficiente para determinar-lhe processo de perda de
mandato.
Pode, se
tanto, criar condições políticas desfavoráveis, mas não necessariamente
deslanchar um processo de impeachment.
A impopularidade pode ser o caldo em que o eventual alvo dessa medida extrema
na democracia venha a ser preparada para arrostar tal mecanismo.
No entanto, a
incompetência política não se afigura por si só causa bastante para ativar este
recurso do Legislativo.
Para que se forme
um quadro em que o impeachment possa
vir a ser o fator político adequado para superar funda crise
institucional, impõe-se a existência de
uma situação política danosa para o Brasil, situação essa que recomenda a
remoção de um governo basicamente pela ameaça à ordem jurídica democrática.
O governo
Fernando Collor disso constituíu exemplo lapidar, pelas suas práticas e
recursos no que tange à democracia no Brasil.
O fato de
Collor ser um aventureiro político, sem base parlamentar sólida, se terá
facilitado a determinação do impeachment,
não prejudica de forma alguma as motivações e as razões jurídicas que
condicionaram o recurso a esse mecanismo de emergência na preservação da ordem
democrática.
Há dois fatos
graves nesse processo que pode ou não conduzir o segundo governo de Dilma
Rousseff a ser julgado por esse mecanismo excepcional de defesa democrática.
Por um lado, a
consciência de larga parte do eleitorado brasileiro que pelo menos Dilma
Rousseff – que foi por longos anos presidente do Conselho de Administração da
Petróleo Brasileiro S.A – além de seu patrono e mentor não desconheciam a
existência de um procedimento criminoso de pagamento regular pelas empreiteiras
de propinas como forma de adjudicação de contratos, o que constituiria o
chamado Petrolão. Deve-se à ação do
Ministério Público e da Polícia Federal a realização da Operação Lava-Jato,
operação essa que acolhida pelo Poder Judiciário ora procede ao indiciamento
pelos eventuais réus, que incluem políticos, empreiteiros, diretores da
Petrobrás, além de doleiros e operadores partidários.
Retidas, por
circunstâncias várias, do conhecimento público as graves implicações para o
governo do Partido dos Trabalhadores, essa ignorância do Povo Soberano não mais
existe, o que causou vertiginosa perda de popularidade – e o que é mais relevante
– a quebra da confiança na isenção e na autoridade para atender aos interesses
da comunidade nacional e não a conveniências de partido. Mais uma vez o
tesoureiro do PT vai para a prisão.
Não é que o
governo de Dilma II tenha perdido força. Por motivo da mudança na avaliação da
sociedade brasileira – de que muitos dos partidos são, mal ou bem, a caixa de
ressonância – de repente as condições que presidiram aos dois turnos da eleição
presidencial mudaram radicalmente.
Além da rejeição
de parte de larga maioria da sociedade brasileira – que a convocação de
passeatas de entidades chapas-branca e próximas do poder petista, pela sua fraqueza numérica não podem
dissimular – registrou-se na presidência Dilma um processo acelerado de
descontrole e sobretudo de omissão no exercício de o que se espera do Poder
Executivo.
Pelo seu
retraimento e mesmo pelo vácuo consequente, o Planalto vem regando assiduamente
o jardim do assemblearismo, com o inelutável avanço do Legislativo,
personificado nas lideranças de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, em Câmara e
Senado.
O PMDB,
formal aliado do PT – o vice da chapa vencedora Michel Temer é o líder do antigo partido de Ulysses Guimarães – vem sédula
e competentemente ocupando os vácuos deixados pela Presidenta que não deixa de
mostrar, na provação extrema de uma crise, o quanto é importante a longa e
provada militância política, que Lula da Silva, por critérios próprios,
preferiu ignorar ao indicar a Mulher do
Lula para sucedê-lo em 2010.
Se o
primeiro dílmico mandato foi desastroso econômica e financeiramente – estão aí a
inflação trazida de volta, junto com os déficits nas contas públicas et al. – o
segundo, que está nos seus vagidos, expõe a incapacidade política daquela que o
torneiro mecânico proclamara como a grande gestora.
E como a
natureza abomina o vácuo, outros, como Eduardo Cunha, na Câmara, e Renan, no
Senado, surgem para reivindicar a direção e o encaminhamento das questões de
estado. Além da Pec da bengala - que me parece, de resto, recomendável
- o poder legislativo parece ávido de
assenhorear-se de outras competências, como a da indicação de juízes para o
Supremo, terreno que incrivelmente Dilma deixou sáfaro por larguíssimos meses,
a ponto de merecer puxão de orelhas do Decano do Supremo, Ministro Celso de
Mello.
Como se
sabe, a norma de que o poder abomina o
vácuo continua muito válida, e é outra explicação da aparente acédia[1] da
Presidente Dilma Rousseff em exercer as faculdades que incumbem ao Poder
Executivo.
(Fontes: O
Globo, Folha de S. Paulo)
(
a continuar )
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