No
entanto, se essa tarda escolha para o papel principal de ator em pleno Sunset Boulevard[2] é
feita porque o fracasso está como sua sombra, o personagem do diretor Brandon [3]
sabe que sua missão principal é a de convencer Riggan derrotar o seu pior
inimigo, que é ele próprio.
O cast
que é a existência mesma de Riggan
não pode ser senão um espelho que se compraz através da filha Sam (Emma Stone) a
extroverter o amor e quase-ódio que o relacionamento com o pai disfuncional
terá criado.
Se Michael
Keaton continua a ser o grande ator de Beetlejuice e da série Batman, na sua face deparamos as marcas do
tempo, e foi esta infeliz coincidência dos mortais que melhor integrou-lhe a
dramática presença no personagem. E será esta sombra que mostra ao expectador
os contrastes que Riggan tem de vencer para separar-se desse a um tempo
ridículo e trágico doppelgänger que é
o símbolo Birdman com toda a sua mensagem do kitsch, que lhe garantiu a um
tempo, um grande sucesso de público, e o correspondente menosprezo da crítica
bem-pensante.
Birdman tem cenas hilariantes, como aquela que, em trajes menores, o
personagem se vê constrangido a fazer longo détour
pela zona da Broadway para poder
reentrar no teatro e assim continuar o ensaio-prova (com público pagante). Será
reconhecido por populares como Birdman
e é um sucesso (porque todos pensam que o trajeto não passa de um stunt publicitário, e por isso o curtem,
enquanto ele tem de pensar em reentrar no teatro e aproveitar estar de cuecas
para dar toque especial à cena ensaiada).
Por
isso, mais tarde, a colunista do New York
Times, que já via o projeto de peça com ceticismo, lhe diz sem rodeios que na sua próxima
crítica (que sai no prelo na noite mesmo pós-estréia) vai destruí-lo como ator
e personagem. Promete que ninguém se lembrará dele depois do seu comentário.
Birdman tenta dialogar com ela, convencê-la que não é mais Birdman com as suas
façanhas para classes C e D, mas a jornalista é peçonha pura.
Os
personagens não são poucos, e parecem muitos, com os problemas de Sam, a filha,
a mulher de que lamenta o naufrágio do casamento (Amy Ryan no papel de Sylvia,
a esposa), o ator coadjuvante Edward Norton interpreta Mike Shiner que pretende ser a nêmesis do
protagonista. O alter-ego será sempre o
alado Birdman, com que Riggan faz um vôo por Manhattan, em um bela integração
de um realismo mágico (e onírico).
O
desfecho reservará uma surpresa que se insere nas recaídas autodestrutivas do
personagem. Ver este filme é uma bela experiência, não só porque a direção do
mexicano Alejandro González Iñarritu é magistral, o roteiro de Nicolás
Giacobone e Armando Bo, e a
cinematografia de Emmanuel Lubezki não deixam dúvida que fazem por merecer a
estatueta. Entretanto, pela
interpretação, Michael Keaton completaria o quadro, pela atuação soberba, e por
fazer do filme uma obra a não ser esquecida.
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