terça-feira, 27 de outubro de 2015

Estados Unidos: Acordo sobre o Orçamento


  

         Surpreende que no Congresso Americano - Câmara e Senado - Republicanos e Democratas cheguem a acordo sobre pontos antes contenciosos, e que pareça nele prevalecer um espírito bipartidário, reminiscente de velhos tempos? Muitos dados semelham reforçar essa hipótese.  Não é que na prática desaparece o temível teto da dívida, várias vezes utilizado sobretudo pela Câmara para tentar extorquir concessões do Presidente Barack Obama ? O mesmo teto a que  chegaram em duas oportunidades distintas ao extremo de fechar o governo federal ? Desta feita as lideranças congressuais optaram por um teto móvel, na prática inexistente, o que evitará problemas para o Tesouro americano. Este poderá agora continuar a endividar-se sem a ameaça de  desastroso fechamento, que em oportunidade recente, no primeiro mandato de Obama, levara Agência de Avaliação de Risco ao extremo de baixar de um ponto a cotação do Tesouro estadunidense... Por quanto tempo deixará de ser  questão política e permanecerá na  condição burocrática, como era antigamente quando reinava o espírito do bipartidismo ?

           Como se sabe, o problema surgira a partir do pleito de 2010, em que, por causa da famosa tunda (shellacking) a Administração Obama perdeu a maioria na Casa de Representantes. Toda a legislação importante de Barack Obama - notadamente, a Lei da Assistência Médica Custeável (ACA), a importante Lei de subsídios para atividades afetadas pela grande crise financeira de 2008, e a Lei sobre bancos e ações - seria aprovada neste biênio de 2009/10.  O resultado negativo de 2010, decorrente em boa parte da inexperiência de Obama, teria pesadas consequências sobre a ação do Congresso, que a hostilidade do Partido Republicano a qualquer cooperação com os democratas condenaria a lamentável estagnação.

          Com o GOP conquistando a Casa de Representantes, instalou-se em Washington uma virtual paralisia legislativa. Assim, apesar de os democratas reterem a maioria no Senado até o começo deste ano de 2015, com a Câmara baixa nas mãos do GOP, desde 2011 e da facção do Tea Party, iniciou-se virtual bloqueio legislativo. Até a lei da reforma da imigração, que fora aprovada pelo Senado, com a participação de boa parte dos senadores republicanos, empacou na Câmara. Apesar de haver diminuído a facção do Tea Party, prevaleceu o facciosismo que veio a forçar agora a renúncia do Speaker John A. Boehner, republicano de Ohio. Note-se, a propósito, o que já foi mencionado várias vezes neste blog. terem os Estados de maioria republicana em 2010 realizado um extenso guerrymandering (redesenho dos distritos eleitorais, de modo a maximizar as maiorias republicanas, com a concentração em grandes distritos dos eleitores democratas).  O escândalo desse redesenho prevalece desde 2012 (as eleições para deputado são bianuais), a ponto de que em certos estados, como Ohio, Obama os conquistaria, enquanto o número de deputados, escolhidos em distritos redesenhados, de maioria republicana, não batem com os totais gerais estaduais... Essa situação nacional só poderá ser resolvida quando do  próximo recenseamento, que sói ser decenal...

          Voltando então à questão do início, semelha óbvio que a volta da boa vontade republicana se deve à preocupação de transmitir ao eleitorado que o GOP não é irresponsável (como foi a Câmara forçando em um desses choques anteriores a suspensão dos serviços estatais, com grande transtorno da população). Em nova maquiagem,  o GOP se apresenta mais ajuizado, e por isso disposto a ter flexibilidade nas negociações com a minoria democrata (tanto na Câmara, que costuma ser mais radical, quanto no Senado).  Assim, o Congresso republicano não deseja aparecer como atrapalhando a ação do Presidente Obama, em assuntos de óbvio interesse geral. Dessarte, em concessão republicana a proposta elaborada por Boehner e a ser já batida pelo martelo do novo Speaker Paul D. Ryan, de Wisconsin, que foi candidato a vice-presidente na chapa do GOP, encabeçada por Mitt Romney e derrotada por Obama em 2012, prevê as seguintes principais disposições: as despesas aumentarão em cerca de US$ 80 bilhões, o que não inclui um fundo de guerra de emergência no montante de US$ 32 bilhões. Tais incrementos seriam compensados por cortes nas despesas em Medicare e na Seguridade Social, bem como a poupança ou renda de uma série de outros programas, inclusive venda de petróleo das reservas estratégicas.

              Obama, como chefe do poder executivo, negociou as referidas disposições, inclusive a retirada de cortes havidos como prejudiciais, chamados de 'sequestration' que entorpecem a atividade econômica e afetam a segurança nacional.

               Assinala-se que o incremento de oitenta bilhões de dólares  corresponde a pouco mais de 1%  do  orçamento anual (cerca de US$ 4 trilhões).  Se implementado conforme esperado, o acordo congressual representa importante avanço depois de anos da paralisia acima mencionada.

                O bolo da  partida do Speaker John Boehner teve uma 'cereja' de inegável sentido  com a reautorização de funcionamento do Eximbank (Export-Import Bank) fundado há 81 anos atrás, cuja carta bancária de renovação estava sendo retida pelo hostil republicano presidente do Comitê Bancário da Camara, o republicano Jeb Hensarling, do Texas.

                 Para que a manobra do Speaker Boehner tivesse êxito, foi determinante o voto da bancada minoritária democrata, para retirar do Comitê hostil a reautorização do Eximbank (que caducara desde junho último). Desse modo, uma minoria de republicanos junto com a totalidade da bancada democrata somaram 246 votos e bastaram para derrotar os 177 republicanos restantes.

                  Os republicanos lograram aumentar as despesas com as forças armadas, e equilibrar as despesas com programas sociais. Também os democratas afirmam ter logrado os respectivos fins, retirando os caps (tampas) em determinadas despesas, assim como lograr que os dispêndios com as forças armadas e os programas não-militares tenham incrementos iguais.  

                    Nada como uma eleição relativamente próxima para dar mais juízo ao Partido Republicano, que ainda se recorda da má publicidade junto ao povo americano com o irresponsável fechamento de serviços públicos essenciais durante um dos últimos embates entre o GOP e o governo democrata de Obama.

 

( Fonte: The New York Times )

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