Ora
direis, as urnas falaram, e é necessário dar um tempo ao novo Presidente. O
problema é que Sua Excelência nos desvenda um programa que não é apenas
direitista, eis que semelha ansioso de negar a tônica da diplomacia brasileira,
pensando trazê-la para outros campos que os herdeiros do Barão do Rio Branco -
e não me refiro decerto àquela paralela conduzida por assessores petistas nos
tempos de Dilma Rousseff e até mesmo Lula - mas sim à presença de grandes nomes - e tampouco
me reporto decerto a nomes da dita carrière
que estariam ávidos de sentar-se na cadeira de Rio Branco, carregados apenas
pela ambição e eventuais menções da mídia.
O
problema é que Sua Excelência parece ter esquecido que cá houve um presidente
de nome Jânio Quadros, que quebrou as paredes de vidro da diplomacia do alinhamento
automático, e que trouxe um sopro de independência para a respeitada Casa de
Rio Branco.
E não se vá dizer que mestre Vasco Leitão da Cunha fosse alguém que
desconhecesse a tradição da Casa...
O Itamaraty, no entanto, não é o dos yes
men, e sim uma instituição que merece respeito, enquanto a uma posição que
não considere a nossa tradição diplomática como falta de imaginação. Carece evitar os erros sobretudo aqueles
advindos da crassa ignorância do governo de Dilma Rousseff, que chegou a tentar
rasgar a tradição de Rio Branco de respeito ao traço das fronteiras, como ao
mandar votar a favor do rape da
Crimeia, em um misto de militante ignorância e de sanhuda vontade de agradar a gospodin Vladimir V. Putin - a ponto de
que professores da Fundação Getúlio Vargas manisfestassem nas páginas de O Globo
a devida preocupação diante dessa leviandade.
As posições do Itamaraty não são decorrência de caprichos extemporâneos,
nem da sede de ocupar posições para nelas melhor comprazer aos poderosos do
dia.
Tampouco devemos estimular, tangidos pelo açodamento burocrático-ministerial, que como bem-comportados muares principiemos a aplaudir mudanças
insensatas como o apoio a Jerusalém como capital de Israel. Depois de levantar
a flâmula da independência na diplomacia - mas decerto com o tempero do saber e
da prudência - não nos deixemos, por ignorância, tentar instrumentalizar, como
se fosse algo descartável, as chamadas mudanças repentinas - sobretudo aquelas
que vão contra uma longa tradição de liderança fundada em tratados e na
diplomacia, e, em consequência, nunca consentir a sermos levados
por ideias cozidas pela metade, que podem aproveitar a país que é um verdadeiro
pária internacional, mas que decerto não casam com a diplomacia de Alexandre de
Gusmão e do próprio Barão do Rio Branco. Não foi
decerto por acaso que tanto a de quem desenhou o Tratado de Madrid (a ponto de
que o texto de suas instruções
despertasse no negociador do Rei de Espanha a admiração que se deve ao
saber não de oportunidade, mas fundado no trabalho e na leitura dos velhos
mapas) tenha deixado aos pósteros esse grande, descomunal marco, que chegaria a
desconhecer a tentativa posterior de desconhecê- lo. Eis que a sua obra foi
tamanha que, a despeito das mudanças dinásticas, ela se firmaria nos séculos,
como as raízes do carvalho que ignora as eventuais tempestades.
E eis aí, senhor presidente-eleito, está o que singulariza a diplomacia nacional,
que nasce com Alexandre de Guzmão, moço de escrivaninha de Dom João V, Rei de
Portugal. Por isso, Excelência, a diplomacia brasileira não está a reboque de
ninguém, e daí o seu peso e a respectiva influência, que pouco ou nada tem a
ver com os poderosos do dia. Ao invés, ela se abebera nos Tratados e se guia
pela coerência, e jamais pela improvisação. Rio Branco não se tornaria o
benemérito da Pátria e não venceria tantas decisões territoriais e diplomáticas,
que riscaram com o traço firme da legalidade e da chancela internacional as
nossas longas, longuíssimas fronteiras, se fosse um sigisbeu e oportunista de
plantão. O Barão do Rio Branco é o nosso
guia, não pelas mesuras e eventuais
agrados aos poderosos, mas pela dedicação ao estudo e pela própria competência, refletida em tantas decisões internacionais.
E tais características, senhor presidente-eleito, elas não se ganham
através de mesuras e salamaleques, mas sim pelo estudo, e mais estudo, a que se
associa a sua companheira experiência.
A
diplomacia ela se forma e se estabelece pelas raízes deste estudo e pela
decorrente experiência, que se funda e reflete no exame acurado dos precedentes e dos Tratados.
A improvisação é uma
planta que não cresce nos gabinetes de ideias fáceis, demasiado ansiosas para
agradar aos poderosos do dia. O brasileiro Alexandre de Guzmão e o próprio
Barão nos ensinam que não há soluções mágicas em diplomacia. Por isso, esses grandes, colossais nomes, não
os encontraremos naqueles que privilegiam a ação sobre a ponderação e o consequente
estudo.
A posição do Brasil e
do Itamaraty não é uma de oportunismo, mas de estudo (dos tratados e dos
precedentes). A pressa pouco tem a ver
com a diplomacia. Sobretudo, a precipitação pode ser nociva, como, se me permite
dizê-lo, a aparente disposição de Vossa
Excelência em acreditar num catecismo à la Donald
Trump. Não vejo nada de perene nas estrondosas e supostas
modificações desse Senhor, que acaba de amargar a perda de maioria na Câmara dos Representantes.
Nesses termos, proclamar Jerusalém como
capital de Israel é um erro, em que os prógonos da independência israelense
(Ben Gourion, Golda Meir) jamais ousariam incorrer.
Tais disposições açodadas nos lembram o
destino de grandes poemas escritos à beira do mar...
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