Provocou
alguma consternação o anúncio de Ângela Merkel de que abandonará o governo
alemão na próxima década?
Não sei se terá sido oportuna tal
declaração. A qualidade da Chanceler germânica não está decerto em dúvida, mas,
pensando nas matreirices mineiras, não estou seguro de que dar prazo antecipado
ao respectivo exercício do poder não seja maneira de referir um acontecimento,
cujo processo inercial, sem o querer, a autoridade em causa já estaria pondo à
baila.
Mas quem sou eu para duvidar do
acerto de tais assertivas, que terão sido longamente meditadas ?
De toda forma, nesse deserto
relativo de líderes da pós-modernidade, é de deplorar-se que personalidade da
estatura da Merkel já esteja meditando sobre a data de sua partida da vida
política.
As grandes personalidades deixam
vácuos, quando anunciam tais propósitos. Como as nossas bancas (sem falar de
lojas dedicadas a publicações estrangeiras, que de repente se tornaram quase
inexistentes) têm digamos um cosmopolitismo moderado - e nem sempre a internet nos proporciona a resposta - muita
vez ficamos restritos às dúvidas que sóem acompanhar afirmações que andem na
dúbia companhia de uma falta de detalhes pertinentes.
Quando me reporto à partida de
líderes alemães, há dois que me repontam na memória: o desenho famoso do Punch sobre a pouco sábia destituição do
Chanceler von Bismarck, que desce a
escada do portaló de navio de guerra, sob o olhar algo ausente do soberano, o
jovem Guilherme II. É famosa, e a um tempo premonitória, a charge britânica. Sem o saber, o desenhista intui o que o Reich
alemão - e o mundo - vão perder.
Por outro lado, Ângela Merkel
faz parte de outro quadro. Originária da Alemanha Oriental - a DDR - a sua terra natal não lhe impediu
a ascensão. Para tanto, teve a proteção do Chanceler Helmut Kohl - que lhe reconheceu
as grandes qualidades e capacidade de liderança. Por isso, ela o sucederia na
Chancelaria germânica.
Através dos anos
subsequentes, a sua trajetória, se terá deparado os inelutáveis e inevitáveis
óbices, sempre lhe mostrou a qualidade de somar, de ouvir, e, por conseguinte,
liderar. Em termos de refugiados, a própria heróica decisão de acolher os
infelizes da Síria marcou a um tempo a sua grande coragem como líder, e o
quanto uma figura de tais parâmetros éticos reponta no quadro mundial, com presença
que se compreenda deva constranger a certas provadas mediocridades atuais, que
devem, coitados, sentir-se diminuídos na sua presença, tudo isso apesar da
habilidade natural da Merkel em pôr os próprios interlocutores a suo aggio. [i]
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