Não sei se Dilma Rousseff, pelos seus antecedentes no setor, se qualifica como
mediadora do conflito no Essequibo.
De toda
maneira, a questão de saída não me parece bem equacionada. A Presidente do Brasil foi convidada pelo
Presidente da Guiana, David Granger,
para que mediasse uma solução pacífica
para a disputa territorial entre a Guiana ex-britânica e a Venezuela.
Em reunião
entre a Presidente do Brasil e o presidente da Guiana, que precedeu à reunião
de cúpula do Mercosul, Dilma Rousseff terá aceito o convite. Data venia, não deveria te-lo feito,
antes de que a Venezuela se pronunciasse sobre a questão. A isenção do mediador é conditio sine qua non[1], e por isso a autoridade mediadora só
pode assumir o encargo com a concordância das duas partes.
Por outro
lado, Nicolas Maduro, ao saber que
Dilma estava recebendo Granger, tentou participar da conversa. Dilma teve de
barrar-lhe a entrada, no que estava certa. Maduro parece não ter aprendido nada
com o seu protetor Hugo Chávez, de quem foi ministro do exterior.
Aí Maduro
subiu nas tamancas, e resolveu sair mais cedo da reunião de cúpula no
Itamaraty.
Talvez
habituado a resolver as coisas como no seu quintal, de forma truculenta, o
presidente venezuelano abandonou a cúpula antes do tempo. Tampouco ele e a
delegação venezuelana participaram do almoço oferecido por Dilma, como é de
praxe, no Itamaraty.
Também na
reunião a Presidente do Brasil, assessorada por Marco Aurélio Garcia,
declarou: “Somos uma região que sofreu muito com as ditaduras. Somos uma região
onde a democracia floresce e amadurece. No
ano passado, houve eleições gerais no Uruguai e no Brasil. Este ano, é a vez da
Argentina e da Venezuela. A realização periódica e regular desses pleitos dá
capacidade de lidar com as diferenças políticas. Temos de persistir nesse
caminho, evitando que as disputas incitem a violência. Não há espaço para
aventuras antidemocráticas na América do Sul.”
A intervenção
de Dilma é um recado, ainda que atrasado, para Caracas. A despeito de todas as
confusões na terra portenha, não há quaisquer dúvidas sobre a realização aí dos
comícios. O que se reclamou antes –a própria oposição venezuelana se expressou
a respeito – foi o silêncio do Brasíl
da Presidente Dilma no que tange às tropelias antidemocráticas do atual regime
e da prisão, a la Miguelão, de
próceres da oposição. Tampouco mereceu
sequer palavra a maneira com que foi tratada a recente Missão do Senado brasileiro.
É de todo
interesse que as vindouras eleições na Venezuela sejam tranquilas, limpas, sem
violência, e que não haja planos de subverter-lhe o resultado por força de
intimidação ou de gigantesco gerrymandering (manipulação de
distritos eleitorais para favorecer uma das partes na liça), que no caso seria o Partido Chavista, dada a administração ruinosa de Nicolás
Maduro, a decorrente situação de violência, pauperismo, inflação galopante,
geral desabastecimento e a consequente (oh, surpresa!) impopularidade do regime chavista). Até o
presente, o Brasil não tem seguido a sua
habitual diplomacia de estado.
Confiados os interesses no trato da questão aos assessores de partido (no caso,
o Dr
Henry Kissinger do PT, Marco Aurélio Garcia), e não ao Ministério das Relações Exteriores, o conhecido e
experiente Itamaraty, as reações dos opositores na Venezuela tem sido de
desconforto e desânimo. É de esperar-se
que a atitude do governo do Brasil mude, voltando aos antigos e provados
padrões, de diplomacia não entre partidos, mas sim entre Estados, dada a
importância do caráter permanente de tais laços, que nada têm a ver com a
natural mobilidade e transitoriedade das relações político-partidárias.
( Fonte: O
Globo )
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