quinta-feira, 23 de julho de 2015

Agora Lula quer conversar

              

          A Folha de S.Paulo noticia em primeira página que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva acionou amigos comuns para contactar o antecessor Fernando Henrique Cardoso. Nesse contexto, semelha oportuno assinalar que Lula da Silva não manteve, nos seus oito anos na presidência, qualquer  contato com FHC.

          Assim, quando Dilma Rousseff, em seu primeiro mandato, convidou Fernando Henrique a Palácio, este ao agradecer-lhe a gentileza, não deixou de assinalar-lhe a diferença da atitude com a de seu predecessor na Presidência.

          Compreende-se,  por isso, tanto a circunstância de sentir-se obrigado pelo gesto da Presidente, quanto a estranheza no que tange à frieza do sucessor.

          A fortiori, a despeito da iniciativa de Lula da Silva, o Instituto Lula – a entidade que se ocupa dos múltiplos contatos e interesses do ex-presidente – apressou-se em afirmar que o petista ‘não tem interesse em falar com o tucano’.

          Esse aparente – e contraditório – recuo de Lula da Silva, expresso por instituto que representa através de seu diretor o senhor Paulo Tarciso Okamotto a vontade e os projetos do ex-presidente, poderia ser entendido como eventual irritação de Lula com o vazamento da notícia, que atribuiria à iniciativa do seu antecessor no Palácio do Planalto.

          Malgrado as mensagens que se contradizem, FHC fez saber que aceita conversar. Mas – o que se depreende por não ser ele a parte interessada – vai esperar a iniciativa  do sucessor: “ O Presidente Lula tem meus telefones.”

           Segundo explica a reportagem da Folha, publicada após a chamada em primeira página, no espaço interior (pag.4) do Tema ‘Poder’, o móvel da conversação seria a autorização de Lula a amigos em comum a procurar seu antecessor e propor uma conversa entre os dois sobre a crise política.  O objetivo imediato é conter as pressões pelo impeachment  da presidente Dilma Rousseff.

            Sabedor da iminente viagem de Fernando Henrique a Europa, Lula disse a aliados que a conversa poderia ser por telefone e antes de FHC viajar.

             O ex-presidente tucano preferiu evitar seja um contato telefônico, seja mesmo a definição do encontro, deixando a questão para ser discutida na sua volta ao Brasil, em agosto.

             Não é a primeira movimentação de Lula da Silva. Encontrou-se, em maio último, com o Senador José Serra na festa de um amigo comum e o chamou para conversa reservada.

             O tarimbado Lula tem a intenção, segundo indica a reportagem, de buscar um conciliador  na oposição, para tentar  dissipar, pelo menos dentro do PSDB, as forças que trabalham pelo impeachment da presidenta.

             Por e-mail, segundo revela a Folha,  Fernando Henrique assim se expressou:“ O presidente Lula tem meus telefones e não precisa de intermediários. Se desejar discutir objetivamente temas como a reforma política, sabe que estou disposto a contribuir democraticamente. Basta haver uma agenda clara e de conhecimento público.”

              O ex-presidente Lula vem debatendo com seus auxiliares durante meses a decisão de buscar reaproximação com os tucanos.  Os petistas sabem que a radicalização da campanha presidencial de 2014, em que Dilma atacou o Presidente Fernando Henrique Cardoso, tornou mais difícil  o diálogo com o PSDB.

              Por outro lado, decerto não surpreende que entre os tucanos há muitas dúvidas sobre a eventual conveniência de conversa que tenha como tema a governabilidade  de Dilma. Até mesmo tucanos moderados, que hoje ainda são contra o impeachment, temem, com fundadas razões se pode acrescentar, que um diálogo com o PT seja visto como conchavo e arranhe a imagem do Partido.

              Além disso, e nessa altura do campeonato, cabe perguntar a cui prodest[1] dar ouvidos ao canto de sereia de Lula da Silva. Será que os tucanos já se olvidaram de outra oportunidade perdida pelo PSDB – na época o candidato era Geraldo Alckmin – quando do estouro do escândalo do Mensalão, e a chorosa alocução de Lula na tv?

              Agora, na vigésima-quinta hora, Lula bate à porta pronto para conversar e não só salvar a pupila da enrascada em que está metida, mas também ele próprio das três Erínias[2] que buscam vingança pelos seus desatinos.  

              Mais parece conversa  para boi dormir. Assim, segundo terá feito divulgar “o ex-presidente debateu com seus auxiliares durante meses a decisão de buscar reaproximação com os tucanos”. E agora está arrependido da radicalização de Dilma, nos seus ataques na campanha presidencial contra FHC...

              Lula é muito esperto, talvez depois de Getúlio o mais hábil político nas rasteiras que aplica naqueles ou naquelas que se atravessam no seu caminho... Nesse contexto, o que se tentou fazer contra e o quê efetivamente se fez contra Marina Silva tanto nos meses anteriores, quanto na própria campanha diante dessa grande ameaça à candidata petista constitui na verdade um claro enigma que clama por ser desvendado...

              E diante disso tudo, será mesmo que ainda existe gente que pensa  poder sair com algumas castanhas depois de conversar com ele?

 

 

 

( Fontes: Folha de S.Paulo, O  Globo - apud Ricardo Noblat; Dicionário Mítico-Etimológico, Junito Brandão, vol. I, Ed. Vozes )




[1] A quem serve.
[2] Deusas violentas, que os romanos chamavam Fúrias.

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