Na eleição anterior para a Assembleia Legislativa, a oposição se retirara do pleito, alegando irregularidades no sistema de apuração de sufrágios. Tal decisão foi um erro histórico, com graves consequências para o processo democrático venezuelano. Permitiu a Hugo Chávez e a seu partido socialista unificado (PSUV) ter bancada de 137 representantes (em 167), e assim dispor de maioria de dois terços. Com essa esmagadora maioria, logrou Chávez fazer aprovar diversas reformas que haviam sido derrotadas pelo povo venezuelano, em referendos anteriores.
Na eleição do domingo, 26 de setembro, favorecida pelo desgoverno do coronel Chávez, com a inflação mais alta da América Latina, apagões e racionamento energético, problemas sérios de abastecimento, e alto nível de corrupção, a coalizão opositora, o MUD, prevaleceu no voto popular (52%). A despeito dessa vantagem, por força do sistema eleitoral venezuelano, em que áreas rurais de menor densidade demográfica são super-representadas no Parlamento, a oposição conseguiu arrebatar 59 cadeiras, contra 90 atribuídas ao PSUV.
Malgrado a deformação em favor da situação do esquema eleitoral, o avanço da frente opositora impossibilitou que o bloco chavista atingisse os dois terços da representação, o que inviabiliza as programadas reformas constitucionais.
Ainda resta por decidir o resultado quanto a sete cadeiras, em que o órgão apurador por ora não logrou determinar os respectivos vencedores. Houve outrossim uma suspeita demora de cerca de oito horas na divulgação do andamento da apuração, retardo esse que segundo o MUD não é consentâneo com os meios disponíveis de aferição dos votos. A propósito, a responsável alegou diferenças muito exíguas em inúmeras disputas para explicar a falta de comunicação sobre a evolução da apuração. Sabe-se bem o que, em geral, significam tais supostos ‘atrasos’ na publicação dos primeiros totais.
Assinale-se que a participação na votação foi uma das maiores na história da Venezuela. A presença de 66,45% traduz o interesse motivado pelos comícios, levando-se em conta, inclusive, a circunstância de que o sufrágio não é obrigatório.
Ao contrário de ocasiões pregressas, e em marcado contraste com a sua constante presença durante todo o processo, o presidente coronel Hugo Chávez Frias não apareceu diante da multidão dos simpatizantes, ao ensejo da divulgação dos resultados, nem se dignou saudar a jornada através da televisão.
Houve consternação nos chavistas quanto a não ter doravante o PSUV bancada com maioria de dois terços, o que lhe asseguraria a manutenção da presente situação, em que domina integralmente o Legislativo. Já provoca estranheza que maioria popular de 52% dos votos não se reflita em posição equivalente na Assembleia. Se, no entanto, perdendo no voto popular, mesmo assim o chavismo alcançaria os dois terços dos assentos, tal condição os equipararia aos sistemas de outras democracias adjetivadas, em que somente existe espaço para as maiorias oficialistas, dóceis às determinações do tirano de turno.
Compreende-se, haja vista a própria desenvoltura dos últimos anos, que o pleito legislativo não tenha sido do agrado do caudilho, que por isso não assomou à sacada presidencial. Somente através da discrição do twitter registrou Chávez o seu grito de vitória.
Essa ‘vitória’, que tem o amargo ressaibo de derrota, há de quiçá parecer mais inquietante ao presidente, eis que prenuncia situação política semelhante à de 2002, no tempo em que a oposição detinha força suficiente para impedir um desequilíbrio excessivo, prejudicial ao regime democrático.
Tampouco a circunstância de haver ficado minoritário no cômputo geral dos votos, não obstante todos os instrumentos manipulados em prol do partido situacionista, não augura resultado promissor na vindoura eleição presidencial. Afinal de contas, nesse cômputo não valerão os artifícios que diminuem a representação dos grandes centros, privilegiando as áreas rurais mais manipuláveis.
Dos comícios para presidente, vencerá o que obtiver simplesmente o maior número de votos. Com o seu acúmulo de erros e tropelias, diante do estado geral da Venezuela, dependente da monocultura do petróleo, e exangue pela dispersão dos próprios recursos e do custoso ‘apoio’ dado por países clientes dos petrodólares, o caminho do coronel para outra reeleição tenderá a ser íngreme e cheio das surpresas desagradáveis reservadas aos maus governantes.
( Fontes: CNN e Portal Terra )
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário