terça-feira, 21 de setembro de 2010

Dilma é a reeleição chavista de Lula

Parece complicado mas não é. Havia dúvidas sobre a natureza política de Lula. A crescente exposição das semelhanças de Lula com o coronel Chávez vem mostrando de forma irrefutável que ambos são neopopulistas, e que a sua índole autoritária comum tem traços oportunistas.
Uma vez no poder, Lula de início se adequou às contingências políticas e econômicas que recomendavam prudência. Blindado no partido por mentes intelectualmente mais preparadas, começou a desvelar-se com o escândalo do mensalão. Na grande crise de sua presidência, poupado pelos oposicionistas, tratou de criar condições futuras para que tal transe não mais se repetisse.
Depois do governo de José Dirceu, ao transferir o mando administrativo a Dilma Rousseff, cuidou que, na chefia do Estado, guardasse o poder na sua essência. Não tendo vocação, nem formação para as intrincâncias da administração, tratou de controlá-la, à maneira de um presidente em república gaullista, ladeado por primeiro ministro politicamente subordinado.
Como Chávez, Lula pode ter-se servido da imprensa e dos meios de comunicação nos tempos da planície. Ao assumir o poder, como uma margarida, ele foi desfolhando aos poucos a própria visceral contradição com a crítica e a independência da mídia.
Assim, depois de sessão inicial, sempre se recusou a realizar conferências de imprensa (i.e., entrevistas coletivas em que estaria exposto ao escrutínio de questões não sabidas de antemão), em um tiroteio de fogo amigo.
Uma das componentes da sua formação é o anti-intelectualismo, em que se realimenta na volta aos condicionamentos de classe. Se uma primeira tentativa de louvação indiscriminada teve de ser abandonada, por imposição de seu entorno, este foi recuo tático, que não o fez abjurar do propósito.
Ao garantir o segundo mandato, adotou, talvez inconscientemente, o maquiavelismo político. Sob a ideologia do oportunismo, e valendo-se da máquina estatal, o seu projeto foi o da construção da perenização do PT no poder. Através de um esquema de apoio sustentável das classes C, D, e E, procurou criar a base sólida de classe que habilitasse o seu partido (e os eventuais associados) a manter uma maioria eleitoral blindada contra as reviravoltas de opinião.
Como Chávez, Lula já dispõe de mecanismos estatais para o próprio reaparelhamento sócio-político-burocrático. Com isso montou uma base ampla a ele ligada, seja pela dependência social, seja pelo interesse empregatício e não-acessível a eventuais mudanças de posição política. Dessarte, seja pelo autismo da pobreza, seja pelo medo do desemprego, logrou blindar o suporte político-eleitoral da sua figura ou de quem for por ele indicado (V. o fenômeno do voto na ‘mulher do Lula’).
Como Chávez, tem igreja e pontífice onde vai buscar a bênção. A sua prática não será tão amiudada quanto a chavista, mas o fervor do credo igualmente existe, como se verificou no lamentável episódio do menosprezo a um dissidente in articulo mortis (Orlando Zapata) e a outros ainda vivos, comparados a delinquentes comuns.
Ao contrário de Chávez, Lula e o petismo militante se defrontam com uma Constituição democrática. Saída do autoritarismo burocrático-militar, a sociedade brasileira estabeleceu as primeiras bases para a democracia. Se o regime não tem a solidez de outros, com fundamentos mais bem plantados, tampouco está desarmado e demasiado vulnerável às forças da reação neopopulista.
Se Lula não tem embasamento intelectual para que se lhe possa atribuir opções mais sofisticadas, quiçá esteja ora pensando em qualquer coisa que nos baús da história um rato de livraria vá assemelhar ao maximato de Plutarco Elias Calles, no México dos anos trinta.
É aí que entra Dilma no quadro. Sem qualquer base política que lhe permitisse a grande aventura, por obra e graça do criador, essa criatura se deverá metamorfosear em presidente. Traduzido em miúdos, Lula julga que estará promovendo a sua reeleição, por interposta pessoa. Acredita, a despeito dos mouros na costa (José Dirceu), que poderá continuar a empolgar o poder máximo, como última instância.
Não sei se combinou com os russos (no caso, a filha de búlgaro Dilma Rousseff), e se ela se prestará ao papel. Plutarco guardou o poder no México por muitos anos, porque reteve os principais instrumentos (PRI). Não parece ser o caso de Lula.
Entrementes, nos comícios e nas reuniões privadas, ele continuará a exibir a sua verdadeira natureza (nós somos a opinião pública) e a sua empedernida, entranhada oposição à tudo o que for elite.

Nenhum comentário: