terça-feira, 14 de setembro de 2010

A Crise se transfere para o Palácio do Planalto

As revelações da Revista Veja atingem a Ministra Erenice Guerra que, como se sabe, era a auxiliar direta da Ministra Dilma Rousseff, quando esta última chefiou a Casa Civil da Presidência.
Erenice Guerra é objeto de suspeita de tráfico de influência, por causa da ação do filho Israel Guerra, na intermediação de contratos com o governo. A Ministra da Casa Civil teria sido sócia de duas empresas, enquanto ocupava cargos no governo Lula, a partir de 2003.
Na primeira dessas empresas, de representação comercial, Erenice Guerra terá participado de 1994, quando deixou a Eletronorte, até março de 2007, quando já era assessora de Dilma Rousseff na Casa Civil.
Uma terceira empresa, de segurança e investigações (“arapongagem”), foi aberta em 1997 em nome do filho Israel Guerra e de um “laranja”.
O escândalo já tinha aflorado no debate do último domingo entre os presidenciáveis. Questionada a respeito, a candidata Dilma Rousseff procurou deixar claro que sendo pessoa de sua confiança, e deixada por ela no cargo, Erenice não tem nada a ver com a ex-chefe e agora candidata do PT à Presidência. Inclusive porque, como afiançou Dilma, “isso é um problema de governo”.
Então, como assinala a colunista Dora Kramer de O Estado, ‘a referência ao “governo de Lula e Dilma” na propaganda eleitoral, fica combinado, é só força de expressão.’
Diante da crise, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu-se na noite de domingo com a Ministra Erenice Guerra, de quem cobrou explicações rápidas. Por enquanto, todavia, Lula decidiu mantê-la no cargo. A reação governamental derrubou um assessor de confiança de Erenice, que seria sócio oculto do filho Israel, o qual também se acha sob suspeita. Trata-se de Vinicius de Oliveira Castro, assessor da Casa Civil. A motivação do pedido de exoneração se deve ao fato de o seu nome aparecer nas denúncias de tráfico de influência envolvendo Israel Guerra, filho de Erenice. Israel e Vinicius são amigos e trabalharam na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) na mesma época.
Segundo decidiu igualmente o Presidente, a conduta da Ministra Erenice Guerra será analisada pela Comissão de Ética Pública. Conforme comentário da imprensa, o Presidente Lula teria avaliado que o afastamento de Erenice poderia reforçar os argumentos da oposição e acarretar prejuízos para a campanha presidencial de Dilma.
A propósito do despacho de Lula cometendo o assunto à análise da citada Comissão de Ética Pública, a colunista Dora Kramer fez as seguintes considerações que semelham oportunas e esclarecedoras : “A Comissão de Ética Pública se pauta pelas melhores das intenções. Na prática é uma das maiores inutilidades da República.(...) O último caso remetido para lá foi o do então secretário de Justiça Romeu Tuma Júnior, aquele que cuidava de reprimir a pirataria e era amigo íntimo do rei da pirataria em São Paulo. Ninguém mais ouviu falar do caso. Anteriormente também a comissão cuidou de examinar a conduta do assessor especial Marco Aurélio Garcia. (...) Depois disso (ou foi antes ?) a comissão cuidou do conflito de interesses na dupla jornada de Carlos Lupi na presidência do PDT e no posto de ministro do Trabalho e foi devidamente desmoralizada por ele em público. Por essas e algumas outras já se sabe que o envio (de) qualquer caso para a Comissão de Ética Pública não quer dizer nada. Ou melhor, significa que o governo pretende dar o assunto por encerrado” (meu o grifo).
Quanto ao contrato renovado pela Anac, a despeito do relatório técnico que citava risco de inadimplência e descontinuidade dos serviços de transporte aéreo de carga da Master Top Airlines (MTA), a surpreendente aprovação dessa companhia pela agência reguladora se deveria aos serviços de lobista do filho de Erenice, Israel Guerra.
Dentre as ‘dificuldades’ vencidas pelo lobista, no que tange à MTA, estão a não-comprovação de pagamento da dívida com o INSS, não apresentação de relação dos sócios e da composição societária.
O parecer técnico da Anac indicava, outrossim, alto endividamento da empresa, além de outros dados que podiam apontar para problemas de gestão de custo na empresa.
Não obstante tais advertências, a diretoria da Anac renovou o contrato da companhia, ampliando o prazo de três para dez anos.
Nesse capítulo, existem outras transações que despertam espécie, como a concessão atribuída à RCM Serviços Auxiliares de Transporte Aéreo Ltda. em licitação junto a Infraero.
Malgrado o ceticismo manifestado pela colunista de O Estado de S.Paulo, afigura-se prematuro, no momento, garantir que a manobra do Presidente Lula – explicações de Erenice, demissão de assessor da Casa Civil, e remessa da questão para a Comissão de Ética Pública – alcance o escopo de neutralizar plenamente a potencial desestabilização da campanha de Dilma Rousseff.
Nos casos anteriores citados – Tuma Jr., Marco Aurélio, Lupi – inexistiam outros interesses maiores que pressionassem pela manutenção à baila da questão envolvida.
Louvando-se, dessarte, na própria argumentação da ex-Ministra Dilma, estamos diante de “um problema de governo”, que dá a impressão aos observadores de ir bastante além, em suas implicações gerais, dos assuntos de índole pessoal de Erenice Guerra e sua família.

(Fontes: O Globo e Estado de S.Paulo)

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