Há uma projeção de déficit para 2010 no balanço de contas correntes de US$ 49 bilhões. Este resultado negativo é o dobro daquele do ano passado (US$ 24,3 bilhões), e será o maior na série histórica de 63 anos.
A causa principal desse desequilíbrio se deve à apreciação do real perante o dólar estadunidense. Já conhecemos bem os efeitos imediatos deste fortalecimento de nossa divisa: encarecimento de nossas exportações, com o respectivo decréscimo na sua competitividade; barateamento das importações, com o incremento relativo das vantagens do produto externo sobre o nacional. No setor de invisíveis, o desequilíbrio no turismo. Enquanto as vindas para o Brasil se tornam mais caras, as viagens para o exterior ficam mais baratas. Tais desenvolvimentos se explicam porque nessas transações, os detentores de reais terão vantagem comparativa em relação ao dólar. Necessariamente, portanto, os produtos cotados em real ficarão mais dispendiosos em dólar e, por conseguinte, com menores vantagens comparativas em relação a produtos concorrentes.
Historicamente, os eventuais saldos positivos de nossos balanços de contas correntes dependem de vultosos superavits na balança comercial. Com a tendência superavitária das exportações sobre as importações de bens o Brasil contrabalançava os déficits tradicionais nas viagens internacionais (turismo), remessas de lucros e dividendos e no pagamento de juros.
Ora, há um progressivo e preocupante encolhimento no superavit da balança comercial. Assim, do superavit de 2009 (US$ 25,290 bilhões) passaremos para um de US$ 15 bilhões, em 2010 (projeção) e outro ainda menor em 2011 (US$ 11 bilhões).
Antes de considerarmos como aquele déficit de balanço de pagamentos (os US$ 49 bilhões acima estimados) será pago, parece relevante assinalar que a atual política monetária de um real apreciado – calcula-se que o valor mais apropriado do real estaria na paridade de R$ 2,5 por US$ 1.00 – é a inversa da politica financeira do governo chinês. Através da constante manipulação cambial e valendo-se de instrumentos não empregados no Ocidente, Beijing mantém o renminbi artificialmente depreciado em relação ao seu principal parceiro (e devedor), os Estados Unidos da América. Malgrado protestos crescentes do Congresso americano, e em especial do Senado – os parlamentares sentem talvez mais de perto a pressão da opinião pública estadunidense, eis que essa vantagem comparativa (e os enormes superavits da China) também implica em empregos perdidos pelos EUA em relação àquele país -, até o presente o Tesouro americano tem sido bastante soft na utilização de pressões para trazer o renminbi a valores mais consentâneos com a realidade econômico-financeira[1].
Os enormes saldos chineses em seu comércio exterior são decorrência de vários fatores. Um dos mais relevantes está nas vantagens competitivas do produto made in China, que não surgem por um passe de mágica. Elas derivam da baixa cotação do renminbi – o que torna mais barato o produto chinês, Nos custos de produção, está igualmente embutido o preço da mão de obra chinesa, que o governo tem logrado manter em níveis bastante inferiores à remuneração em outros países altamente industrializados. Entende-se, portanto, que essa vantagem comparativa – decorrente da mais valia usufruída pelo capital – é a de presumível menor possibilidade de manutenção, atendida a compreensível agitação operária naquele país dito comunista, em que o trabalhador não recebe pelo seu aporte ao bem produzido a parcela que lhe seria comparativamente mais justa.
Verifica-se, dessarte, que os enormes superavits recolhidos pela RPC na sua balança comercial – e que são a base da pujança da posição financeira de Beijing, com a sua confortável posição de credor nas transações mundiais – provêm, entre outras causas, da depreciação artificial do renminbi.
Por sua vez, o Brasil – e suas autoridades financeiras – por sua política que desemboca em um real supostamente forte cria as condições para o presente quadro.
Dependemos de capitais estrangeiros – em IEDs[2] e de caráter especulativo – para equilibrar o nosso balanço de pagamentos. A previsão para 2010 é de um total de US$ 38 bilhões, sendo de US$ 30 bilhões no setor produtivo (em IEDs),e US$ 8 bilhões de capital financeiro especulativo.
Atuam em favor de nossa posição financeira o fato de possuirmos reservas internacionais elevadas – cerca de US$ 270 bilhões. Também é detentor do chamado investment grade (boa avaliação de risco). Assinala-se que neste campo, atualmente com atração positiva, o fato de o real ser apreciado em relação ao dólar, o que o tem tornado uma das divisas de maior appeal internacional.
Em outras palavras, as previsões a curto prazo são favoráveis. O que não se pode dizer daquelas a médio prazo.
( Fonte: O Globo )
[1] Tal se explicaria parcialmente pelo suposto temor das autoridades do Tesouro (e do Fed) com eventuais represálias de Beijing, eis que são os maiores detentores dos títulos da dívida americana.
[2] Investimento estrangeiro direto
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
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