Começou quase em surdina. Não demorou, porém, para que
a classe advocatícia, através da OAB, não fosse bater no Supremo para reclamar
da nova norma para o encarceramento dos condenados.
Quem lesse os seus reclamos, pensaria
que o STF tomara decisão danosa para a Justiça.
Nos Estados Unidos e em muitos
outros países, os réus, uma vez condenados, vão para a cadeia. Se quiserem
impetrar recurso, é seu direito, mas o
farão por trás das grades.
A decisão do Supremo é mais um passo
contra a impunidade. Termina com a prática de beneficiar o criminoso com o
ritual de que é inocente até que seja condenado em ultimíssima instância. Essa
prática é um desserviço para a Justiça, porque enseja aos réus
endinheirados ou com influência nas altas esferas, a valer-se de uma suposta inocência
que já foi negada por duas instâncias de justiça.
Os defensores desse excesso de justiça -
que, entre outras coisas, ensejava a assassinos confessos persistirem em
liberdade sob a ficção de uma inocência inexistente - permitiam que ele só pudesse
ser derrubado após longa caminhada através
de quatro instâncias.
Afinal - e antes tarde do que nunca - o
Supremo por sete votos a quatro derrubou essa postura abstrusa, que inexiste em
país algum. Na maioria deles, como na grande democracia americana, basta um
juiz singular, ao cabo de julgamento, aonde são asseguradas ao réu todas as
defesas, batalhar por sua suposta inocência. Uma vez, no entanto, determinada a
culpa - e tal se refere a qualquer tipo de cidadão, eis que acima do Rio Grande
todos os cidadãos são iguais, e inexiste aquela de cidadão comum que estaria
submetido a tudo, o que não é a sarcina dos cidadãos acima de qualquer
suspeita.
Sabemos bem como termina essa
estória, e pode-se dizer que os sete juízes do Supremo que votaram pela nova
regra ajudaram o Brasil a dar mais um passo no caminho da democracia.
Queira Deus que não haja mais a
vergonha de assassinos confessos, como Pimenta Bueno - que ficou onze anos em
liberdade antes de cumprir a pena - e criminosos nada comuns como Luiz
Estevão que, condenado a 31 anos de
cadeia (corrupção, estelionato e peculato) continua até hoje em liberdade ! Assim
como todos os réus do Mensalão e tantos outros que puderam valer-se do ritual
de que, embora condenados pela justiça comum e pela de segunda instância,
fruíam ainda da prerrogativa de serem julgados pelo Tribunal Superior de
Justiça, e pelo próprio Supremo, antes que formalmente pudessem cumprir pena,
este benefício, além de zombar da qualidade da justiça brasileira, ensejava que
os réus endinheirados ou com influência em altas esferas, pudessem valer-se de
uma liberdade que é um acinte à democracia, porque favorece aqueles no poder ou
no seu entorno, postergando por anos a fio o seu encontro com a Justiça.
Lamento que o Ministro Celso de
Mello, decano de nossa mais alta Corte, tenha pronunciado palavras candentes
contra essa nova jurisprudência do Supremo. Respeito a sua opinião no caso -
como também naquele dos embargos infringentes - porque não tenho qualquer
dúvida de que Sua Excelência as embasou em profundas convicções de caráter
ético.
No entanto, Vossa Excelência poderia
ter presente que o ótimo pode ser inimigo do bom. Em um país como o nosso, faz
bem à democracia que tanto o pobre quanto o rico tenham a mesma confiança na Justiça.
Nesse contexto, pergunto-me se a regra anterior - a de esgotar todos os
recursos e todas as instâncias - terá servido para trazer a lume algum caso de
lamentável erro judiciário?
( Fontes: Elio Gáspari em O Globo; revista VEJA.)
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