De novo, a frase famosa de Bill Clinton, que lembrava
o eleitor, na sua campanha contra o Presidente George Walker Bush (o velho), de
o que realmente interessava cuidar.
Se a apóstrofe já é antiga, ela não
perdeu o significado, seja no âmbito global, seja no que concerne a Pindorama.
O prêmio Nobel Paul Krugman na sua coluna no New
York Times de hoje recorda a pertinência da frase que não valeu apenas para
1992 - motivando a vitória de Clinton contra George Bush - mas também para os
tempos que correm.
E vejam só como se resume a coisa para
Krugman: "De novo temos uma quantidade substancial de dívidas complicadas,
desta vez não hipotecas residenciais, mas empréstimos para companhias de
energia, atingidas fundo pelo despencar das cotações do petróleo. Entrementes, economias emergentes anteriormente na moda como o Brasil de repente
estão indo muito mal, e a China
tropeça. E, enquanto a economia
americana se está dando melhor que quase todos os demais, não estamos decerto
imunes ao contágio."
Só o grifo é meu, mas toda avaliação pertence
a Krugman, e como sempre tudo o que interessa está nela.
Todos os atores da atual crise - pelo
menos, os que mais interessam - estão nesse parágrafo. As dívidas complicadas,
a causa imediata (não mais a jogada dos CDOs[1]
sobre as hipotecas podres, mas a baixa alucinante nas cotações do petróleo, e
as consequentes dívidas das companhias de energia), o tropeço da China - que
assinalei no blog de ontem - e o
problema no Brasil - que esperamos esteja no cast secundário e não no principal.
Como se verifica, o Brasil tem dupla participação nessa crise. Posto que
o problema da Petrobrás não tenha prima
facie nada a ver com as dificuldades
das demais companhias, que são agravadas pela política da maior produtora, a
Arábia Saudita, que é, na prática, a de tirar do mercado os produtores de
sucedâneos ao forçar a violenta baixa nas cotações do barril de petróleo. Grita
aos céus, no entanto, que essa queda não lhe facilita a respectiva posição, já
afetada seriamente pela política de aparelhamento de nossa maior empresa pelo
governo do PT.
A corrupção, como auxiliar sistêmico
na política, já se tinha visto no Mensalão,
a famosa ação penal 470, que o Brasil deve em grande parte ao Ministro Joaquim
Barbosa, relator do processo, e presidente do Supremo Tribunal Federal. A
opinião pública que costuma ver mais longe, assim como jurisconsultos, souberam
avaliar da qualidade e seriedade do trabalho do Ministro Barbosa. Este último,
baseando-se em teoria jurídica nova, a do domínio do fato, logrou vencer o
desafio. Havia ministros no Supremo ligados ao PT que se empenharam em atrasar
o processo, e a colocar as ocasionais pedras no caminho. O Presidente Barbosa
levou, no entanto, o trabalho até o final, e se nem todas as suas posições
prevaleceram, o conjunto da obra reflete a qualidade, a integridade e o empenho
do relator.
É lamentável que um valor do peso e
da qualidade do Ministro Joaquim Barbosa haja preferido interromper a sua
presença na mais alta Corte, uma vez findo o seu hercúleo esforço. Dados, no
entanto, o apreço e se pode mesmo dizer a popularidade que lhe valeram a
coragem, a capacidade de trabalho, e a qualidade jurídica de sua obra, é
possível que outros lauréis, compatíveis com a sua obra, ainda lhe possam ser
estendidos pelo Povo Soberano.
O julgamento do Mensalão - a hoje
famosa Ação Penal 470 marcaria época. No país da impunidade, muitos políticos importantes
foram condenados a longas penas de prisão. 25 réus condenados, dentre os quais
José Dirceu, Chefe da Casa Civil de Lula da Silva; José Genoíno, ex-presidente
do PT; Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT; ex-deputado João Paulo Cunha (PT),
ex-Presidente da Câmara dos Deputados; ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ),
o delator do mensalão, e Marcos Valério, publicitário mineiro.
Na política interna, com plantel legislativo e
político bastante avantajado, o PT mostrou ao que vinha, em termos de tentativa
de manipulação do Congresso, através de compra não de votos, mas de bancadas
políticas.
Diante, porém, do affaire Petrolão, o governo do PT -
posto que tais operações tenham sido mais ou menos simultâneas - mostrou
ambições ainda mais largas e por certo muito maiores no seu escopo.
Nunca como neste caso a aplicação da
chamada lei de lord Acton terá sido tão pronta e sôfrega. De partido
hiper-zeloso e correto ao extremo, não houve o que se poderia denominar
kafkianamente de processo. A coisa foi na bruta, mesmo, levantando suspicácias
de que não houve a chamada corrupção strictu
sensu. Com todas as suas pretensões e as veleidades de um Savonarola, o
Partido dos Trabalhadores, e a sua liderança, pela maneira com que abraçou a
corrupção como meio não deixa dúvidas quanto a sua opção pelo processo da
ilicitude como meio de ação e de que aguardava apenas a oportunidade de empolgar o poder para
dele valer-se de forma ilimitada.
Quando as suas lideranças assumiram o
poder executivo, não tardaram em buscar meio e modos para igualmente dominar o
Legislativo, através de 'acordos políticos' que sancionavam o controle de
bancadas de outros partidos, como o chamado delator do Mensalão, o Deputado
Roberto Jefferson (PT-RJ) acabou levando ao conhecimento público a compra
sistemática de votos causando a queda de José Dirceu da Casa Civil, e o início
do longo processo que culminaria anos mais tarde no julgamento pelo Supremo
Tribunal Federal da chamada Ação Penal 470, com os seus 25 réus condenados.
Se o chamado Mensalão é processo
acabado, no sentido de cousa julgada, continua, no entanto, a produzir
resultados, como a recente extradição da Itália, obtida pela justiça brasileira
de um foragido do Mensalão, Henrique Pizzolato, que com documentos falsos
(inclusive valendo-se da identidade do irmão já falecido) se refugiara na
Itália. Uma vez preso pela polícia italiana, toda a batalha jurídica girou em
torno da condição dos estabelecimentos penais no Brasil em fornecer cárceres
dignos para os condenados da justiça cumprirem pena. Depois de longa luta
jurídica - em que Pizzolato chegou a recorrer à alta Corte Europeia de Direitos
Humanos em Estrasburgo, tentando conseguir cumprir o restante da pena em
cárcere italiano - o prófugo foi recambiado à Penitenciária da Papuda, nas
vizinhanças de Brasília, aonde atualmente o ex-funcionário do Banco do Brasil
cumpre o restante da pena a que fora condenado in absentia pelo STF. (a continuar)
( Fontes: The New York Times;
O Globo; Folha de S. Paul; The Oxford Dictionary of Quotations; Michael Lewis - The Big Short )
[1] Obrigações de Dívidas
Colaterizadas (CDOs) - na prática juntada de obrigações com hipotecas, em geral
contraídas por pessoas pobres, e que a despeito disso obtiveram através dos
bancos a classificação AAA, das Agências de Avaliação de Risco, nos Estados
Unidos.
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