Desde algum tempo as bolsas mundiais seguem o mercado
chinês com certa inquietação. Habituadas com a tendência da China a pautar o
crescimento da economia mundial, não é sem preocupação que forças contrárias
têm sido observadas na segunda economia do planeta.
Esse relativo encolhimento se tem
sinalizado sob muitos aspectos, em fenômeno dissonante a que os observadores do
mercado mundial não estavam habituados.
Vista como a locomotiva da economia planetária, com grande influência nas
correntes comerciais, quando a condição do mercado chinês já não aparece com o
elã de antes, principiam a piscar as lâmpadas indicativas de um problema novo,
a que o mercado mundial não está decerto acostumado.
A
gravidade do problema, se intuída, não está ainda definida. Será um processo in fieri, produto de multiplicidade de
fatores, que somente no médio prazo poderá ser compreendido na respectiva
extensão, inclusive quanto à medida de fatores externos, como o novo governo de
Xi Jinping, que pode ser objeto de
suspicácias quanto à excessiva intromissão ou mesmo tentativa de manipulação de
seu comportamento.
Exemplo disso - e por certo um
primeiro indicador - se terá evidenciado na Bolsa de Xangai, que por força de
nervosismo haverá sofrido a ação de fatores que tentariam mascarar a
normalidade do próprio funcionamento. Tais intervenções, uma vez manifestas,
tendem a desestabilizar a ação do mercado, e a criar muita vez condições que
podem trabalhar no sentido inverso das alegadas boas intenções de seus
fautores.
É fato que o ritmo de desenvolvimento
da economia chinesa tem sido muito grande e assaz sustentado. Da cadência da
indústria de construção, com as suas inúmeras frentes de trabalho, se regalava
a exportação de matérias primas, e, por conseguinte, os principais países que,
como o Brasil, dela participam (minério de ferro, v.g.).
Será aquela velha estória de que um
resfriado na indústria de construção chinesa provoca males mais graves em seus
fornecedores. O Brasil que, através de sua história, continua a repontar como
grande exportador de produtos básicos (aqueles de menor valor unitário, e que,
portanto, exigem quantidade para
suprir qualidade nos ganhos
respectivos) pode sentir, por conseguinte, males respiratórios mais sérios.
Em termos econômicos, enquanto se fale
do micro (por exemplo, a recessão
pontual na indústria de construção chinesa), não se deve esquecer que tais fenômenos singulares, podem gerar epifenômenos (diminuição dos operários
nela atuantes, por força da retração do setor), o que terá efeitos cumulativos
sobre o restante da economia do Império
do Meio, assim como daqueles exportadores que dependam desse mercado para
crescer economicamente.
Até há pouco tempo existia grande
confiança na capacidade da economia chinesa, a qual sustentada por mercado que
não tem paralelo no mundo, parecia ter o céu como limite. Essa confiança, retroalimentada, parecia ter
todas as condições de continuar estimulando o crescimento do mercado.
Será aí, em um ponto determinado,
que entra a velha âñé[1] helênica, que
os deuses infundem nos humanos para que,
possuídos por uma ultra-confiança na infalibilidade de certas situações, criem
as condições necessárias para a falência de um determinado sistema, antes
havido como infalível. Esse fenômeno é estudado faz muito, e o comportamento
dos partícipes na bolha se pauta na
confiança extrema de que o ganho será ilimitado. Já no Reino de França, na
regência de Filipe d'Orléans, surgira o sistema de Law, um inglês esperto que
arruinou muitos franceses. Mas essas
bolhas - de que tivemos no Brasil o famoso encilhamento,
a febre do enriquecimento nas ações em um país que não tinha tradição no setor
- podem ser, nos piores casos, como as CDOs (collaterized debt obligation)[2] a
montagem legal de um embuste, eis que as dívidas hipotecárias, ainda que
classificadas AAA pelas nossas mui
conhecidas Agências de definição de risco, estavam muito próximas de uma
fraude, como a falência do Banco de investimento Lehman Brothers, em 2008, tornaria patente.
A Bolsa chinesa de Shangai tem dado
sinais de certo nervosismo, como se verificou recentemente, através de
inusitadas tentativas de correção do mecanismo, que, em fim de contas, poderiam
indicar certo amadorismo.
Por outro lado, em fins de 2015, o
Fundo Monetário Internacional elevou o yuan
chinês à categoria de moeda de reserva internacional, no mesmo nível que o
dólar estadunidense, a libra esterlina, o yen japonês e o euro. A pergunta que não quer calar é se essa
decisão do FMI não terá sido algo precipitada. Como a economia chinesa é a
segunda do planeta, e há projeções que apontam a possibilidade da superpotência
ser ultrapassada por Beijing no final da década dos vinte, tudo pareceria
indicar que a decisão foi acertada. No entanto, como as moedas de reserva estão
sujeitas a maiores controles pela entidade financeira internacional, a pergunta
que não quer calar é se tal medida não poderia ter aguardado um pouco mais de
tempo.
( Fontes: The Big Short, de
Michael Lewis; The New York Times )
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