Na
Copa do Mundo, não existe a categoria dos vencedores morais. No entanto, na
partida jogada nesta tarde no Beira-Rio, a Argélia esteve muito perto dessa
condição, pelo que ela significa.
Para a equipe da Rede Globo, seria
apenas uma formalidade, seguida pela esmagadora vitória da Alemanha, dada a
manifesta superioridade da equipe teutônica diante da seleção argelina.
Em qualquer tipo de jogo, há um erro
que não se pode cometer - menosprezar o adversário, e julgá-lo batido de
antemão.
Ao vermos a esquadra alemã pisar no gramado, sentia-se que o escrete da RFA estava ali para
cumprir a programação. Com a sua fama de rolo compressor, tudo transcorreria
conforme previa o retrospecto, e os gols logo viriam como consequência
inevitável da disparidade nas duas equipes.
Essa arrogância se descobria no campo
do Beira Rio e se transmutava nos olhares condencendentes dos jogadores alemães,
nas apreciações jocosas dos representantes da Rede Globo, e na geral suposição
de que se assistiria a match pro-forma (a despeito de ser uma oitava de final),
que culminaria com uma goleada do time
do técnico Lowe.
Ninguém se perguntou como a Argélia
conseguira chegar às oitavas de final, eliminando ao fim a Rússia.
As avaliações de Júnior e os gracejos
de Alex Escobar – que pretende com isso assinalar-se por um novo estilo, ao
contrário das usuais imitações de Galvão Bueno – sem dizê-lo expressamente, nos
apresentavam a equipe do Magreb como um quase rústico time de roça, que não
teria qualquer condição de enfrentar o rolo compressor alemão.
Nesses casos, a realidade sói
bater forte. O time tosco que a bola costuma atrapalhar, apareceu como uma
equipe valerosa, cujos contra-ataques principiaram a criar confusão no ordenado
esquadrão teutônico. Por várias vezes, os jogadores, com rápidos passes e
velozes investidas, lançaram em confusão os craques germânicos. As ações se
repetiam, em evidente desrespeito às avaliações da equipe da Globo, e pior do
que isso, criavam pandemônio nas linhas de Schweinsteiger, Muller e do próprio
goal-keeper que no desespero tinha de transformar-se em beque para controlar as
penetrações dos atacantes da Argélia.
A arbitragem da peleja foi entregue
a um árbitro e a bandeirinhas brasileiros. Talvez a decantada importância
da esquadra germânica os tenha impressionado demasiado. De qualquer forma,
diante do esforço e da habilidade dos jogadores argelinos, e da manifesta
confusão que os acometeu – ao se darem conta que a outra equipe não tinha
qualquer respeito pelos seus campeonatos mundiais, pelo seu renome e capacidade
de destroçar as defesas contrárias, como o fizera com Portugal - a seleção alemã passou a mostrar na
fisionomia e no gestual não só a própria confusão, senão a exasperante suspeita
de que um quadro de segunda ordem pudesse desmantelar todo o entrosamento, além
de causar-lhe danos ainda maiores.
Ao final, rasgou a considerada
fraca equipe argelina, com um aglomerado de jogadores que juntos devem valer
menos do que um Müller e outros craques alemães, a soberba do conjunto da RFA.
Cercados pelos deferentes cumprimentos de nossos locutores, os futebolistas
germânicos não conseguiram vencer no tempo regulamentar os argelinos. Além
disso, passaram inúmeros sustos com os seus velozes contra-ataques e a sua
generosa disposição. Os modestos argelinos desrespeitaram os craques
germânicos, além de colher da torcida a admiração e o aplauso, que são
expressões genuínas que pouco têm a ver com as mesuras dos comentaristas
televisivos.
Para esses jogadores, terá sido ao cabo uma
derrota que para eles é mais do que um lenitivo. Forçar o rolo compressor
alemão, e a empáfia de suas coortes, a atabalhoadas correrias e àqueles olhares
perdidos, marca momentos que tem grande valia e podem motivar no futuro a
transformar a habilidade e a desenvoltura em grandes esquadras, capazes de em
novos torneios completar aquilo que hoje começaram, arrastando os craques
germânicos aos incômodos e incertezas de uma prorrogação.
Ao fim de tudo, pode ser que os alemães
tenham apreendido uma lição: devem respeitar o adversário e nunca subestimá-lo.
É um ato tanto de inteligência, quanto de caráter, que pode poupar-lhes muitos
dissabores.
( Fonte: Rede Globo )
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