sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Dom Paulo Evaristo Arns

                              
          Morreu nesta quarta-feira, catorze de dezembro, o Cardeal-emérito de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns. Era frade franciscano antes de ser criado cardeal pelo Papa PauloVI.
          Homem simples, mas corajoso e letrado.O então cardeal de S.Paulo,D Agnelo Rossi,o indicaria como um de seus bispos-auxiliares. Sendo D.Agnelo da ala conservadora, sua escolha  causaria espanto pelas diferentes orientações pastorais  do Cardeal e deste seu novo bispo-auxiliar.
          A diferença das visões respectivas logo se tornaria marcada. Iniciando visitas à prisão do Carandiru, por determinação do Cardeal foi visitar frades dominicanos detidos por motivos políticos, entre eles frei Betto.
          Após verificar que haviam sido torturados,  ao regressar,disso deu ciência ao Cardeal. Para sua surpresa, conforme dito na autobiografia, ouviu: "Outros me garantem que não há torturas nas nossas prisões." D. Paulo nunca criticaria publicamente dom Agnelo por essa declaração.
           Logo assumiria em S.Paulo a vanguarda da defesa dos presos políticos. Em 1970, foi designado por escolha pessoal do Papa Paulo VI, Arcebispo de S.Paulo, assumindo o lugar de D. Agnelo, que foi servir em Roma, à frente do dicastério de Propaganda Fidei.
            Assumiu, então, de forma concreta, a opção pelos pobres - que era também a de sua ordem, a de S. Francisco.  De início, vendeu o Palácio Episcopal e com o numerário,comprou terrenos em bairros pobres para missões religiosas modestas (D. Helder procederia da mesma forma).
            Transcorreram nessa época grandes embates seus com os generais. Nesse sentido, enfrentou comandantes militares na Paulicéia e até presidentes da República.  Assim, em encontro com o general Emílio Garrastazu Medici, a conversa terminou aos berros. Foi Médici quem decretou pouco depois a cassação de uma rádio da igreja católica paulistana.
              Do mesmo modo, enfrentou autoridades civis, de governadores a delegados, tentando assegurar direitos civis aos presos políticos.
                Com base no exemplo de Paulo VI, reproduziu na sua Arquidiocese a Comissão de Justiça e Paz, indicando o advogado Dalmo de Abreu Dallari em 1972 para ser seu primeiro presidente. Em 1973 foi criado Cardeal por Paulo VI.
                Como sempre, se valeria das novas insígnias para elevar o seu combate à repressão. Nesse sentido, apoiou o Procurador de Justiça Hélio Bicudo, em sua luta contra a quadrilha do Esquadrão da Morte, e tornou possível a publicação de livro sobre a matéria, livro esse que havia sido recusado  por timoratas editoras comerciais.
                No período, por sua coragem sofreu ameaças e calúnias. Até um acidente com automóvel - sofrido no Rio - se descobriu que havia sido um atentado. Em outros casos, personalidades de nomeada sofreriam acidentes suspeitos.
                Uma de suas mais notáveis iniciativas foi a publicação patrocinada de "Brasil:Nunca mais".
                 Com o advento do Papa polonês, de linha conservadora, João Paulo II, este chegou a fracionar a Arquidiocese de S. Paulo.  D. Paulo Evaristo deixaria claro em suas memórias que nada disso ocorre sem a conivência do Pontífice.
                 Também a estranha campanha contra a teologia da libertação, arquitetada pelo Cardeal Josef Ratzinger (depois BentoXVI) foi feita de modo similar, sendo afastados inúmeros teólogos de nomeada pelo mundo afora, entre os quais Hans Kung e o brasileiro Leonardo Boff.
                   Pouco antes de deixar a Arquidiocese, enfrentou o Papa polonês em difícil entrevista, quando este último admitiu que era com efeito o responsável final pelas decisões polêmicas de favorecer a campanha contra a teologia da Libertação, e o fracionamento da Arquidiocese.
                   Outra postura de igual teor foi a não elevação de D. Helder Câmara ao Cardinalato. A bondade e a humildade de D. Helder, que suportou cristãmente o tratamento recebido pelo sucessor em Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, elevaria o grande bispo-auxiliar do Rio de Janeiro e notável Arcebispo de Olinda e Recife a santo de Sagrada Igreja romana, destino que o necessário transcurso tradicional do tempo caberá decerto igualmente a Dom Paulo Evaristo Arns.


( Fontes:  Necrológio da Folha,  Anuario Pontifício 1985 )    

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