quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

O último Estado da União de Obama


                                  

          O Estado da União costuma ser a principal intervenção do Presidente durante o ano.  Aproximando-se o final do seu segundo mandato, Barack H. Obama  procurou fazer discurso que fosse menos indicação de objetivos a serem atingidos, do que a elaboração de retrato dos Estados Unidos, a caminho da meta final da própria Administração.

          Discursou perante as duas Casas do Congresso, com a economia em pleno crescimento e melhor posição no mundo, a despeito dos conhecidos estraga-festa, que são a desigualdade em seu interior, e o espectro do terrorismo no exterior.

         No entanto, Obama não hesitou em aceitar  responsabilidade por haver ficado tão longe de seu projeto inicial, tendo a coragem de reconhecer que a sua proposta de campanha de esperança e mudança não se realizara, e tampouco a meta ao assumir de transformar Washington e a própria política.

        "É uma das poucas insatisfações na minha presidência, que o rancor e a suspicácia entre os partidos tenham ficados piores ao invés de melhorarem." Nesse sentido, o 44º Presidente dos Estados Unidos mostrou alguma modéstia ao não hesitar em declarar que 'um presidente com os dons de Lincoln ou Roosevelt talvez houvesse sabido melhor lidar com essa divisão.'

        Não trepidou também em reconhecer que muitos americanos estão assustados e se sentem excluídos por sistema político e econômico que eles vêem como aparelhado contra os seus interesses. Nesse contexto,  ele lançou  censura implícita a Republicanos que estão manipulando tais inseguranças na corrida para a sua sucessão.

        Neste quadro, o Presidente sublinhou que dentro do crescimento da frustração, haverá vozes empenhadas em que nos tribalizemos, de passar a culpa para concidadãos  como se fossem estranhos, tentando responsabilizá-los pelo fato de não parecerem como os americanos em geral, ou pela circunstância de não rezarem como nós, ou votarem como nós, ou partilharem dos mesmos antecedentes. Nâo podemos permitir-nos adentrar por esse caminho.

         O Presidente tentou contrastar as visões sombrias dos  republicanos acerca do Estado da União, com a sua avaliação otimista.  Ao chamar a versão do GOP uma ficção, e defender as próprias posições, ele singularizou de forma implícita a atitude do político republicano líder nas pesquisas. Dentro desse contexto, disse que os Americanos deveriam resistir aos chamados para estigmatizar todos os muçulmanos, em um momento de ameaças do Estado Islâmico.

         Obama também singularizou - sem contudo citá-lo  nominalmente - o Senador Ted Cruz, outro pré-candidato do GOP, que, ao criticar a política externa de Obama, propôs colocar o Estado Islâmico debaixo de um tapete de bombas (carpet bomb).

         O presidente tampouco desdenhou do simbolismo para enfatizar alguns pontos de sua agenda, ao deixar, v.g., uma cadeira vazia nos assentos reservados à Primeira Dama para simbolizar as vítimas da violência das armas.

         Obama disse que a América deveria continuar a empregar a inovação e não ser por ela intimidada. Nesse contexto, entre os convidados ao discurso, incluíu um refugiado sírio. Em alusão reminiscente do voto do Presidente Kennedy de fazer os americanos chegarem à  lua, ele reportou-se à tentativa similar no esforço para a cura do câncer, que deveria ser guiada pelo Vice-Presidente Joseph R. Biden, Jr. que perdeu seu filho por causa da doença em 2015.

            Quanto às quatro questões que segundo seus assistentes encimavam o debate sobre o futuro da América, elas incluíam como assegurar oportunidades para todos, como aparelhar a mudança tecnológica, como manter o país seguro, e como dar um jeito nas fraturas políticas da nação.

            Pediu então pelo fim do gerrymandering (a instrumentalização dos distritos políticos para assegurar vantagens para um partido), pela redução da influência de contribuições de campanha secretas, e tornar o voto mais fácil. Talvez seja esta uma das mais importantes iniciativas do discurso ao Povo Americano, dada a influência negativa e deformatória desta perniciosa invenção política do século dezenove.Ao lançar tais objetivos principais, Obama sem dizê-lo condenava o partido que atualmente mais se prevalece de tais políticas. Para tornar tais fins mais realizáveis, Obama fez um apelo aos americanos para que se envolvessem mais em política, ironicamente o tema de sua primeira campanha e de sua presidência.

              Atendidas as limitações do Presidente, eis que é limitado o tempo que lhe resta na Casa Branca, poder-se-ía dizer, tecnicamente falando,  que Barack Obama já é, sob certos aspectos, um lame duck[1]. Nesse sentido, o Presidente encareceu solução de transigência com o GOP para a revisão do sistema de justiça criminal, a aprovação de amplo acordo de livre comércio abrangendo a área do Oceano Pacífico, novas iniciativas com respeito à pobreza, e a crise dos entorpecentes nos EUA.

              O Presidente surpreendeu o público no seu esforço de encontrar terreno comum com o novel Speaker Paul D. Ryan, de Wisconsin. Aludiu ao apoio dado pelo republicano Ryan à ampliação de crédito de imposto de renda para trabalhadores de renda média e baixa. Como já se entenderam no passado, quem sabe não vamos surpreender os cínicos uma vez mais? disse o Presidente.

             Obama também mencionou antigas tentativas no plano interno, que falharam (por causa da oposição republicana): aumentar o salário mínimo, revisão da lei imigratória, e mais estritos controles na compra e no uso de armas.

             O seu discurso incluíu os êxitos do breve período em que os democratas tiveram a maioria na Câmara de Deputados, assim como a longa maioria no Senado, que caíu no início de seu último biênio.  

             Para Obama, os principais desafios não vem da força dos adversários, mas da sua fraqueza. Com isso, ele contradita a tese republicana de que é incapaz diante das crescentes ameaças.

             Nesse ensejo, realçou  o acordo nuclear com o Irã, a abertura de novas relações com Cuba, o acordo global em Paris no combate ao desafio da mudança no clima, assimo os esforços para conter a disseminação do Ebola.

( Fonte:  The New York Times )



[1] O termo com que se designa um político que esteja em fim de mandato.

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