A notícia da demissão de François Fillon não enganou aos mais bem informados quanto às eventuais possibilidades reais de um afastamento do Primeiro Ministro.
Em termos políticos, não fazia sentido. Para alguém como Nicolas Sarkozy com a aprovação patinando nos 32%, não seria decerto aconselhável desvencilhar-se de um chefe de governo, que até hoje lhe tem sido fiel, e com popularidade de 47%.
Fillon, que já tinha três anos no Palais Matignon[1], passa imagem para a opinião pública francesa de discrição, firmeza e confiabilidade. Reconfirmado nas suas funções, terá como missão principal virar a página da longa crise da votação da reforma previdenciária e, sobretudo, criar condições para que a UMP – a mais recente denominação do partido gaullista – possa tornar possível a reeleição de Sarkozy em 2012. A menos que, como intentara em 1995 o Primeiro Ministro Edouard Balladur (1993-1995), concorrer em 1995 contra o Presidente Jacques Chirac, do mesmo partido gaullista... Chirac lograria vencer o desafio para o que seria o último setenato da presidência na França.[2]
Por vezes, tal reeleição presidencial pode ser decorrência não de acertos da direita, mas de erros da esquerda. Jacques Chirac foi reeleito, concorrendo no segundo turno de 2002 contra Jean-Marie Le Pen, o chefe da extrema direita francesa. Que Le Pen tenha logrado ir ao turno decisivo, ele o deveu à tola estratégia de Lionel Jospin, primeiro ministro e lider do Partido Socialista, que incentivara a chamada ‘esquerda plural’ no primeiro turno.
Diante disso, o eleitorado de esquerda e centro-esquerda acreditou no convite de Jospin. Com a fragmentação da sua base de apoio – que não imaginara a possibilidade de ser Le Pen e não Jospin o adversário de Chirac no segundo turno – ocorreu justamente o impossível. Tendo como rival nos comícios o extremista da Frente Nacional, que não tinha qualquer possibilidade de ameaçá-lo, Chirac não poderia senão agradecer ao gesto do compenetrado Lionel Jospin, que lhe ensejou a sua continuação no Palácio do Eliseu por mais cinco anos.
Desse tipo de ‘gentileza’ o eventual opositor de Sarkozy não se fará ilusões. A reforma ministerial, com o segundo ministério Fillon, se caracteriza pela ênfase em governo da UMP. Para tanto, é reconduzido ao gabinete o ex-Primeiro Ministro Alan Juppé, que vai para a Pasta da Defesa. Sucede no posto a Hervé Morin, líder do Novo Centro.
Por sua vez, os serviços no Quai d’Orsay de Bernard Kouchner, socialista, não são mais necessários. Na pasta dos Negócios Estrangeiros vai substituí-lo a Ministra da Justiça, Michèle Alliot-Marie. Por sua vez, a mudança de gabinete é utilizada igualmente para desvencilhar-se de ministro que, pelo seu envolvimento no escândalo das contribuições de Lilliane Betancourt, dona da l’Oréal, se transformara em incômodo fardo. Eric Woerth, ministro do Trabalho e ex-tesoureiro da campanha presidencial, se havia desgastado de forma irremediável.
Assinale-se que o novo gabinete François Fillon conserva ministros importantes, como Christine Lagarde, da Economia, e François Baroin, do Orçamento. Por outro lado, Jean Louis Borloo, ministro da Ecologia – e cujo nome, nas 24 horas do gabinete demissionário, fora objeto de rumores quanto a uma possível indicação para o Palácio Matignon – acabou sem qualquer posto.
De qualquer forma, a nova equipe ministerial do Presidente Sarkozy tem pela frente um caminho bastante íngreme. Com o número de desempregados aumentando (para quase quatro milhões), com o crescimento de 1,6% em 2010, e déficit de 7,7% (contra 2,7 % ao assumir), os indicadores sócio-econômicos não serão grandes cabos eleitorais de Nicolas Sarkozy, se daqui a dezoito meses, ao ensejo dos novos comícios, a situação não apresentar melhoras sensíveis.
( Fonte: O Globo )
[1] O Palais Matignon é a sede do Primeiro Ministro, enquanto o Palais de l’Elysée o é do Presidente da República Francesa.
[2] Por emenda constitucional, os mandatos subsequentes seriam reduzidos para o quinqüenio.
terça-feira, 16 de novembro de 2010
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