A notícia é da visita de Barack Obama à Índia. Em meio às manifestações recebidas, o Presidente fez saber que os Estados Unidos apoia a candidatura daquele país a membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Essa informação é importante. Quando ocorrer o processo de modificação da Carta, que viabilize o alargamento do Conselho de Segurança, com mais membros permanentes e não-permanentes, um país como os Estados Unidos tem importância maior do que outra nação-membro das Nações Unidas, como, v.g. Irã ou Venezuela.
Atualmente, existem cinco membros permanentes do Conselho de Segurança: Estados Unidos, República Popular da China, Reino Unido, França e Federação Russa.
No processo de reforma das Nações Unidas, haverá duas votações separadas, a do Conselho de Segurança e a da Assembleia Geral das Nações Unidas. Para tornar-se membro permanente um país, como, v.g. o Brasil, precisa da maioria no Conselho de Segurança (com o apoio de todos os membros permanentes) e também na Assembleia Geral. Verifica-se, portanto, que países membros permanentes, como os Estados Unidos, votarão duas vezes no processo de reforma. Depreende-se, por conseguinte, que o seu eventual apoio para a pretensão de país determinado terá maior peso do que o de uma outra nação sem as qualificações da superpotência.
Existe outro aspecto interessante com relação à iniciativa da Admistração Obama. Como todo gesto dessa natureza, deve ter respondido a uma gestão específica do governo indiano. A Índia, que é potência nuclear, mantém estreitos laços com os Estados Unidos. Não é de resto uma realidade desconexa. A própria Administração Bush júnior já mostrara a prioridade que os EUA atribuem às relações com Nova Delhi, quando admitira exceções no âmbito nuclear que favoreciam à Índia. Em termos geopolíticos tampouco é difícil compreender tal aproximação, dentro de um quadro mais amplo, que leve em consideração a potência emergente da República Popular da China.
Também a revelação da promessa de voto da superpotência para distinguir a Índia tem outra conotação que não escapa ao observador de política internacional.
Reporto-me à candidatura do Brasil a membro permanente. Não é segredo para ninguém que a diplomacia da presidência Lula consagrou uma enorme ênfase a tal postulação. Supostamente para reforçar a nossa posição na Assembleia Geral, o Itamaraty abriu inúmeras missões diplomáticas junto a países com os quais, por seu tamanho e relevância, não temos contatos amiudados, nem correntes apreciáveis de comércio. Em geral são embaixadas nas quais o embaixador é um ilustre solitário, sem maior apoio de outros funcionários diplomáticos. Em geral – e já é muito – terá a colaboração de um funcionário administrativo brasileiro, além de reduzido pessoal local. Esse é o panorama com que se defronta o chefe de missão em obscuras capitais, cujos nomes são ignorados até por muitos de seus colegas.
Essa estratégia envolve uma outra face, que é a da arregimentação dos votos dos membros permanentes. Nesse âmbito, Brasília, malgrado os seus esforços, não dispõe ainda de compromissos de voto de todos os membros permanentes. Dispomos de alguns, mas ainda nos faltam apoios importantes.
Quanto aos Estados Unidos, semelha interessante assinalar, de início, que no processo de criação das Nações Unidas, o Brasil tinha praticamente assegurada a indicação para membro permanente pela Administração de Franklin Delano Roosevelt. Se FDR não tivesse falecido antes da ultimação da Carta das Nações Unidas, o Brasil, pela simpatia estadunidense e a sua cooperação na Segunda Guerra Mundial teria o lugar assegurado. Infelizmente, com a vinda de Harry Truman a nossa cadeira desapareceu, sendo substituída pela da França gaullista.
Atualmente, como sopram os ventos em termos de sinalização em nosso favor pela Administração Obama ? Para os observadores, o relacionamento do Presidente Lula com Obama se iniciou de forma quase espetacular. Lula, a exemplo do que conseguira com Bush, mantinha de início ótima relação com o novel presidente, que chegou a extravasar a própria admiração ao designá-lo como ‘o cara’.
Lula, talvez afetado pelos festejos e o trânsito nunca dantes concedido a um presidente brasileiro, não terá cuidado nos meses subsequentes de manter viva a chama do relacionamento com o presidente estadunidense.
Tampouco terão ajudado as visitas intercambiadas com o amigo Ahmadinejad, que chegaram ao auge na elaboração do acordo nuclear tripartite, em que a inanidade do instrumento era composta pela inconveniência diplomática. Andando em tal companhia não há de surpreender que não mais haja sido detectado relacionamento equivalente aos primeiros meses da administração Obama.
Perguntado, na viagem a Moçambique sobre as implicações do gesto do presidente americano, Lula adotou uma linguagem sinuosa:
“ Os Estados Unidos são apenas uma voz dentro de um conselho de cinco.”
Negou, igualmente, qualquer decepção com a preferência americana: “Não, pelo contrário. O Brasil defende a participação da Índia. (...) Só espero que o presidente Obama faça agora deste compromisso que teve com a Índia uma profissão de fé e consiga, efetivamente, abrir o Conselho de Segurança para que outros possam participar.”
Os ambages de Lula não disfarçam o preço que a sua diplomacia tem de pagar por sua cercania com regimes como o iraniano. A conta pode ser mais alta de o que previa a desenvoltura do futuro ex-presidente. Afinal, que cargos internacionais estão à disposição do Nosso Guia ?
( Fonte: O Globo )
terça-feira, 9 de novembro de 2010
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